quinta-feira, 24 de julho de 2014
Dilma se reúne amanhã com 12 clubes para tratar da reforma no futebol brasileiro - 24.7.2014
Folha de S.Paulo
Dilma se reúne amanhã com 12 clubes para tratar da reforma no futebol brasileiro. http://uol.com/bndNH9
Foto: Reuters
terça-feira, 22 de julho de 2014
DERSU UZALA NA COPA
José Ribamar Bessa Freire
22/06/2014 - Diário do Amazonas
No futebol “a bola é um reles, um ridículo detalhe” – escreve Nelson Rodrigues, para quem o que interessa é “o ser humano por trás da bola”. O que está em jogo no gramado, portanto,“não é a diversão lúdica, mas a complexidade da existência”. Se for assim, se Nelson tem razão como quer o cronista Joaquim Ferreira dos Santos, então o campeão mundial da Copa já é o Japão, que deu um show de vida lá na Arena Pernambuco contra a Costa do Marfim e, depois, na Arena das Dunas, em Natal, contra a Grécia.
Esse gesto civilizatório foi o legado mais eloquente da Copa. Com o exemplo, o japonês ensina ao mundo como tratar comrespeito e civilidade o espaço público, como se relacionar com o meio ambiente e com os outros habitantes do planeta. A coleta do lixo, feita em sacos com a imagem impressa do sol nascente, foi uma lição de ética e de cidadania. Lembrei cena antológica de rara beleza do filme Dersu Uzala dirigidopelo cineasta japonês Akira Kurosawa, em 1975, baseado no diário de um capitão russo. Na torcida nipônica – diria Nelson Rodrigues – todos eram Dersu Uzala.
O chibé repartido
O filme conta a história de uma expedição científica do exército tzarista pela bacia do rio Usurri, entre 1902 e 1907, comandada pelo capitão Vladimir Arsenyev, com a finalidade de classificar as espécies existentes nas estepes da Sibéria e realizar trabalhos de topografia. O capitão faz amizade com um caçador nativo, Dersu Uzala, um velho sábio que trata o sol, as estrelas, a água, o fogo, o vento, a neve, as árvores e os animais como pessoas. Tal qual umtcheramoiguarani, ele ouve todas essas “pessoas” que vivem na taiga siberiana – a maior floresta fria do mundo - e conversa com elas.
- Dersu, isso é um desperdício. É inútil deixar mantimentos aqui, nós nunca mais voltaremos a esse lugar.
Quase todo semestre passo esse filme em sala de aula e todas as vezes me comove a cena, quando o caçador, então, explica que não é para eles dois, mas para uma pessoa qualquer, um eventual viajante, desconhecido, que chegue ali cansado e com frio, em busca de abrigo, de calor e de alimento. Compartilhar o pão não necessariamente para retribuir o que eles tinham encontrado, mas pelo prazer da partilha.
O capitão russo, um homem de ciência, civilizado, com escolaridade, fica no meio do tiroteio, perplexo e dividido entre, de um lado, o princípio da “farinha pouca meu pirão primeiro” que ele traz do mundo urbano e, de outro, o preceito do pirão compartilhado, que é único sinal humano de vida, como canta o poeta Aníbal Beça num haicai: “Apenas num gesto / o homem é capaz de vida - / chibé repartido”.
Não vai haver lixo
A ética da solidariedade, do desprendimento, do pensar no outro está presente tanto no comportamento do velho caçador desescolarizado, que vive no mundo da oralidade e que detém os conhecimentos da vida, quanto na coleta silenciosa do lixo realizada pelos torcedores nipônicos.
O cineasta japonês Akira Kurosawa rodou as cenas de Dersu Uzala em 1974, em condições adversas, depois de haver tentado o suicídio três anos antes, cortando a própria garganta e os pulsos numa forte crise de depressão. Estava desencantado com o ser humano. Nesse contexto, o filme teve o efeito daquele poema de Allen Ginsberg: uma florzinha solitária desabrochando em cima de um monte de merda. É uma reconciliação com a vida, um canto de esperança, que desperta sentimento similar ao provocado pelas imagens dos japoneses coletando o lixo no estádio.
- Eu sou bra-si-lei-ro, com mui-to or-gu-lho, com mui-to a-moooor – grita a nossa torcida embalada para a guerra. Resta saber – isso não é explicitado - do que é que sentimos orgulho. Numa sociedade patriarcal como a brasileira, parasitária, tatuada por quatro séculos de escravidão, estamos acostumados a emporcalhar tudo, ordenando que garis limpem nossa sujeira. Nossas ruas com bueiros entupidos e os banheiros e salas de aula de nossas universidades públicas são testemunhas disso. Lá, o exército do “pessoal de limpeza” trava diariamente uma batalha perdida, registrando o rotundo fracasso da escola.
- Somos milhões em ação. Todos juntos, vamos pra frente, Brasil. Salve a seleção! De repente é aquela corrente pra frente, parece que todo o Brasil deu a mão!
Sem patriotadas, o lema dos japoneses, talvez muito mais significativo do que “não vai haver copa”, foi o silencioso “não vai haver lixo”. A corrente nipônica pra frente nos deu uma lição, que já rendeu os primeiros frutos. Na Fifa Fun Fest segunda-feira, em Copacabana, no Rio, turistas alemães, espelhados no exemplo vindo do Oriente, não apenas recolheram o lixo da praia, mas incentivaram outros frequentadores a ajudá-los.
Esse gesto de extrema delicadeza e refinamento, embora solitário, mostra que civilização não é abrir estradas, construir usinas, erguer pontes e viadutos, fabricar aviões, automóveis e robôs, clonar seres vivos. É saber se relacionar com o outro: gente, planta, animal, meio ambiente. É a qualidade dos gestos que torna a condição humana possível. Enquanto houver alguém juntando o lixo e nos deixando envergonhados de nossa imundície, o mundo não está totalmente perdido. Uma florzinha brota no esterco.
Foi um ato singelo, mas que renova nossas esperanças na espécie humana e no futuro do planeta. A bola, efetivamente, é um reles detalhe. Torcida japonesa, por despertar o Dersu Uzala que existe dentro de cada um de nós, domô arigatô gozaimasu.
quarta-feira, 16 de julho de 2014
Por que o Brasil afundou? Percam 10 minutos e leiam esse maravilhoso artigo, um presente aos brasileiros
Caiu a máscara do gigante
O mito da seleção Canarinho nos fazia sonhar formosos sonhos. Mas no futebol, assim como na política, é mau viver sonhando e sempre preferível se ater à verdade, por mais dolorosa que seja.
Mario Vargas Llosa12 JUL 2014 (prêmio Nobel de Literatura)
Fiquei muito envergonhado com a cataclísmica derrota do Brasil frente à Alemanha na semifinal da Copa do Mundo, mas confesso que não me surpreendeu tanto. De um tempo para cá, a famosa seleção Canarinho se parecia cada vez menos com o que havia sido a mítica esquadra brasileira que deslumbrou a minha juventude, e essa impressão se confirmou para mim em suas primeiras apresentações neste campeonato mundial, onde a equipe brasileira ofereceu uma pobre figura, com esforços desesperados para não ser o que foi no passado, mas para jogar um futebol de fria eficiência, à maneira europeia.
Nada funcionava bem; havia algo forçado, artificial e antinatural nesse esforço, que se traduzia em um rendimento sem graça de toda a equipe, incluído o de sua estrela máxima, Neymar. Todos os jogadores pareciam sob rédeas. O velho estilo – o de um Pelé, Sócrates, Garrincha, Tostão, Zico – seduzia porque estimulava o brilho e a criatividade de cada um, e disso resultava que a equipe brasileira, além de fazer gols, brindava um espetáculo soberbo, no qual o futebol transcendia a si mesmo e se transformava em arte: coreografia, dança, circo, balé.
Os críticos esportivos despejaram impropérios contra Luiz Felipe Scolari, o treinador brasileiro, a quem responsabilizaram pela humilhante derrota, por ter imposto à seleção brasileira uma metodologia de jogo de conjunto que traía sua rica tradição e a privava do brilhantismo e iniciativa que antes eram inseparáveis de sua eficácia, transformando seus jogadores em meras peças de uma estratégia, quase em autômatos.
Não houve nenhum milagre nos anos de Lula, e sim uma miragem que agora começa a se dissipar
Contudo, eu acredito que a culpa de Scolari não é somente sua, mas, talvez, uma manifestação no âmbito esportivo de um fenômeno que, já há algum tempo, representa todo o Brasil: viver uma ficção que é brutalmente desmentida por uma realidade profunda.
Tudo nasce com o governo de Luis Inácio 'Lula' da Silva (2003-2010), que, segundo o mito universalmente aceito, deu o impulso decisivo para o desenvolvimento econômico do Brasil, despertando assim esse gigante adormecido e posicionando-o na direção das grandes potências. As formidáveis estatísticas que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística difundia eram aceitas por toda a parte: de 49 milhões os pobres passaram a ser somente 16 milhões nesse período, e a classe média aumentou de 66 para 113 milhões. Não é de se estranhar que, com essas credenciais, Dilma Rousseff, companheira e discípula de Lula, ganhasse as eleições com tanta facilidade. Agora que quer se reeleger e a verdade sobre a condição da economia brasileira parece assumir o lugar do mito, muitos a responsabilizam pelo declínio veloz e pedem uma volta ao lulismo, o governo que semeou, com suas políticas mercantilistas e corruptas, as sementes da catástrofe.
A verdade é que não houve nenhum milagre naqueles anos, e sim uma miragem que só agora começa a se esvair, como ocorreu com o futebol brasileiro. Uma política populista como a que Lula praticou durante seus governos pôde produzir a ilusão de um progresso social e econômico que nada mais era do que um fugaz fogo de artifício. O endividamento que financiava os custosos programas sociais era, com frequência, uma cortina de fumaça para tráficos delituosos que levaram muitos ministros e altos funcionários daqueles anos (e dos atuais) à prisão e ao banco dos réus.
As alianças mercantilistas entre Governo e empresas privadas enriqueceram um bom número de funcionários públicos e empresários, mas criaram um sistema tão endiabradamente burocrático que incentivava a corrupção e foi desestimulando o investimento. Por outro lado, o Estado embarcou muitas vezes em operações faraônicas e irresponsáveis, das quais os gastos empreendidos tendo como propósito a Copa do Mundo de futebol são um formidável exemplo.
O governo brasileiro disse que não havia dinheiro público nos 13 bilhões que investiria na Copa do Mundo. Era mentira. O BNDES (Banco Brasileiro de Desenvolvimento Econômico e Social) financiou quase todas as empresas que receberam os contratos para obras de infraestrutura e, todas elas, subsidiavam o Partido dos Trabalhadores, atualmente no poder. (Calcula-se que para cada dólar doado tenham obtido entre 15 e 30 em contratos).
As obras da Copa foram um caso flagrante de delírio e irresponsabilidade
As obras em si constituíam um caso flagrante de delírio messiânico e fantástica irresponsabilidade. Dos 12 estádios preparados, só oito seriam necessários, segundo alertou a própria FIFA, e o planejamento foi tão tosco que a metade das reformas da infraestrutura urbana e de transportes teve de ser cancelada ou só será concluída depois do campeonato. Não é de se estranhar que o protesto popular diante de semelhante esbanjamento, motivado por razões publicitárias e eleitoreiras, levasse milhares e milhares de brasileiros às ruas e mexesse com todo o Brasil.
As cifras que os órgãos internacionais, como o Banco Mundial, dão na atualidade sobre o futuro imediato do país são bastante alarmantes. Para este ano, calcula-se que a economia crescerá apenas 1,5%, uma queda de meio ponto em relação aos dois últimos anos, nos quais somente roçou os 2%. As perspectivas de investimento privado são muito escassas, pela desconfiança que surgiu ante o que se acreditava ser um modelo original e resultou ser nada mais do que uma perigosa aliança de populismo com mercantilismo, e pela teia burocrática e intervencionista que asfixia a atividade empresarial e propaga as práticas mafiosas.
Apesar de um horizonte tão preocupante, o Estado continua crescendo de maneira imoderada – já gasta 40% do produto bruto – e multiplica os impostos ao mesmo tempo que as “correções” do mercado, o que fez com que se espalhasse a insegurança entre empresários e investidores. Apesar disso, segundo as pesquisas, Dilma Rousseff ganhará as próximas eleições de outubro, e continuará governando inspirada nas realizações e logros de Lula.
Se assim é, não só o povo brasileiro estará lavrando a própria ruína, e mais cedo do que tarde descobrirá que o mito sobre o qual está fundado o modelo brasileiro é uma ficção tão pouco séria como a da equipe de futebol que a Alemanha aniquilou. E descobrirá também que é muito mais difícil reconstruir um país do que destruí-lo. E que, em todos esses anos, primeiro com Lula e depois com Dilma, viveu uma mentira que seus filhos e seus netos irão pagar, quando tiverem de começar a reedificar a partir das raízes uma sociedade que aquelas políticas afundaram ainda mais no subdesenvolvimento. É verdade que o Brasil tinha sido um gigante que começava a despertar nos anos em que governou Fernando Henrique Cardoso, que pôs suas finanças em ordem, deu firmeza à sua moeda e estabeleceu as bases de uma verdadeira democracia e uma genuína economia de mercado. Mas seus sucessores, em lugar de perseverar e aprofundar aquelas reformas, as foram desnaturalizando e fazendo o país retornar às velhas práticas daninhas.
Não só os brasileiros foram vítimas da miragem fabricada por Lula da Silva, também o restante dos latino-americanos. Por que a política externa do Brasil em todos esses anos tem sido de cumplicidade e apoio descarado à política venezuelana do comandante Chávez e de Nicolás Maduro, e de uma vergonhosa “neutralidade” perante Cuba, negando toda forma de apoio nos organismos internacionais aos corajosos dissidentes que em ambos os países lutam por recuperar a democracia e a liberdade. Ao mesmo tempo, os governos populistas de Evo Morales na Bolívia, do comandante Ortega na Nicarágua e de Correa no Equador – as mais imperfeitas formas de governos representativos em toda a América Latina – tiveram no Brasil seu mais ativo protetor.
Por isso, quanto mais cedo cair a máscara desse suposto gigante no qual Lula transformou o Brasil, melhor para os brasileiros. O mito da seleção Canarinho nos fazia sonhar belos sonhos. Mas no futebol, como na política, é ruim viver sonhando, e sempre é preferível – embora seja doloroso – ater-se à verdade.
terça-feira, 15 de julho de 2014
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