Câmara dos Deputados votou a favor das reformas para desregulamentar a economia argentina, deixando o programa nas mãos do Senado
"Este é um primeiro passo fundamental para tirar a Argentina do pântano que foi as últimas décadas", celebrou Milei no X | Foto: Juan Mamobrata / AFP / CP
O projeto ultraliberal do presidente Javier Milei deu um primeiro passo nesta terça-feira, 30, quando os deputados votaram a favor das suas reformas para desregulamentar a economia argentina, deixando o programa nas mãos do Senado após uma maratona que começou na véspera.
"Este é um primeiro passo fundamental para tirar a Argentina do pântano que foi as últimas décadas", celebrou Milei no X.
"Com este primeiro passo, estamos cada vez mais perto de nos encontrarmos em 25 de maio em La Docta, Córdoba [centro], para dar início a uma nova era de prosperidade para a Argentina", continuou.
O governo insta a aprovação dessas medidas antes de 25 de maio, dia em que Milei convocou todo o espectro político para assinar um "contrato social" de 10 pontos, incluindo a defesa "inviolável" da propriedade privada e o equilíbrio fiscal "inegociável".
Tanto a chamada Lei de Bases quanto o pacote fiscal foram aprovados em quatro votações distintas ao longo do dia após um debate que começou na segunda-feira ao meio-dia e se prolongou durante toda a noite.
Agora os dois projetos legislativos percorrerão um caminho tortuoso no Senado, onde o partido governista possui apenas sete dos 72 assentos.
A Lei de Bases contempla medidas como a declaração de emergência econômica e energética por um ano, a delegação de competências que permite Milei dissolver estatais e a possibilidade de privatizar empresas públicas.
Também inclui uma "modernização trabalhista" que entre outras coisas modifica o sistema de indenizações e aumenta os períodos de experiência dos empregados, algo que foi tachado pela deputada opositora de esquerda Myriam Bregman de "uma canalhice".
"O que está sendo aprovado aqui é facilitar a demissão de dezenas e dezenas de trabalhadores", declarou.
A lei prevê ainda um regime de incentivos tributários, aduaneiros e cambiais para grandes investimentos. Também foi aprovada a eliminação ao acesso universal à aposentadoria mínima.
"Vou fazer 72 anos e nunca vivi algo assim. Alguns poucos, outros dois ou três granitos, outros quatro, todos puseram um granito para arruinar esse grande país que tem tudo", declarou à AFP Guillermo Vidales, que foi protestar na porta do Congresso.
Assim como ele, dezenas de pessoas repudiaram o projeto em meio a concentrações convocadas por sindicatos e partidos de oposição.
Pacote fiscal
A votação desta terça representa o primeiro avanço legislativo de Milei desde que assumiu em dezembro.
A Lei de Bases contém cerca de 230 artigos, um terço dos incluídos em uma reforma ambiciosa que fracassou em fevereiro no Parlamento, onde o partido governista não controla nenhuma das duas Câmaras.
Para o analista político Gabriel Vommaro, a segunda versão do projeto de lei se deve ao fato de que Milei "está descobrindo como é difícil governar em geral e como é complicado governar a Argentina [...], e ele entende que precisa ser mais pragmático".
O pacote fiscal restaura um imposto sobre lucros eliminado pelo governo anterior e propõe regularizar ativos não declarados de até US$ 100 mil (R$ 517 mil, na cotação atual).
O deputado governista José Luis Espert o defendeu, dizendo que se trata do "primeiro tijolo de um sistema impositivo mais razoável que permitirá baixar os impostos para lutar contra a pobreza" que afeta a metade da população de 47 milhões de habitantes.
Na Câmara dos Deputados, o Liberdade Avança, partido de Milei, tem 38 deputados de 257 e foram necessárias negociações árduas com aliados e a chamada "oposição dialogante" para obter os votos.
Protestos
A popularidade de Milei está em torno de 50%, segundo diversas pesquisas. Os apoios "se mantêm porque a polarização política se mantém e portanto não há para onde ir fora dessa estrutura do espaço político, que ainda é binária", disse Vommaro.
As centrais sindicais convocaram uma mobilização no dia 1º de maio, Dia do Trabalhador, contra a reforma trabalhista e o reajuste aplicado pelo governo, que tem implicado em milhares de demissões no Estado em um contexto de inflação de quase 290% anual.
Também convocaram uma greve nacional para 9 de maio, a segunda desde que Milei assumiu o cargo, que será antecedida por uma greve de transporte aéreo, terrestre, portuário e marítimo em 6 de maio.
A Argentina está mergulhada em uma grave crise econômica e social há anos. Milei prometeu superá-la, mas à custa de grandes sacrifícios. Embora tenha alcançado um superavit fiscal, o país sofre agora com o colapso do consumo e da indústria.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) estimou uma queda de 2,8% na economia este ano e projetou uma inflação anual de 250%.
AFP e Correio do Povo