É o segundo mês consecutivo de perdas da moeda americana ante o real
O dólar caiu 3,81% em maio, a maior baixa mensal desde novembro do ano passado. É o segundo mês consecutivo de perdas da moeda americana ante o real, ajudado pela melhora observada na situação fiscal do Brasil com a atividade econômica mais forte que o esperado, os superávits na balança comercial e a alta de juros pelo Banco Central.
Tudo isso em um ambiente de dólar fraco no mercado internacional, em meio a indicadores mistos da economia americana e reforço do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) de que a inflação é transitória. Esse ambiente levou a um desmonte importante de posições contra o real no mercado futuro da B3. Só os estrangeiros reduziram suas apostas compradas em dólar, que ganham com a valorização da moeda americana, em US$ 7,4 bilhões este mês.
Nesta segunda-feira, dia de definição do referencial Ptax de maio, usado em contratos cambiais e balanços de empresas, o mercado operou volátil. No fechamento, terminou em alta de 0,25%, a R$ 5,2249. No mercado futuro, o dólar para julho, que passou a ser o contrato mais líquido a partir desta segunda, operava em leve queda às 17h40, a R$ 5,2350.
Pela manhã, a moeda americana caiu com a divulgação do superávit primário de R$ 24,2 bilhões em abril, acima do esperado e recorde para o mês da série histórica do Banco Central. Quando saiu o número, o dólar caiu para as mínimas do dia, a R$ 5,1995. "O resultado mostrou uma melhora significativa", comenta o economista-chefe do Goldman Sachs, Alberto Ramos, em relatório.
Após a definição do referencial, a pressão de alta se reduziu, mas o feriado nos Estados Unidos acabou limitando a liquidez nesta segunda-feira. "O dólar teve pequena queda no exterior, mas câmbio no Brasil teve alta à tarde, influenciada pela disputa anterior entre comprados e vendidos na formação da Ptax do mês", comenta o economista e gestor da JF Trust, Eduardo Velho.
Nos negócios do período da tarde, as mesas de câmbio monitoraram participação do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em eventos. O dirigente declarou que a atividade tem mostrado força e já há previsão de PIB crescendo acima de 4% este ano. Ele, contudo, enfatizou que a situação de endividamento do Brasil é "bastante frágil", por conta dos gastos com a pandemia, e reforçou a necessidade de o Brasil atrair mais investimento estrangeiro. "Estamos vendo recuperação extraordinária da economia."
"Contas públicas mostrando superávit e a propensão do governo de vacinação total até o final do ano certamente contribuem", afirma o economista da Amplla Assessoria em Câmbio, Alessandro Faganello. Ele observa que até há pouco tempo, as projeções indicavam que a dívida bruta em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) poderia bater em 100% este ano. Nesta segunda, o ministro da Economia, Paulo Guedes, falou da chance do indicador cair abaixo de 85% e bancos começaram a rever seus números.
Entre eles, o americano JPMorgan melhorou a previsão para as contas fiscais brasileiras, revertendo uma tendência de recentes pioras nas estimativas. A melhora da arrecadação e o crescimento mais forte que o esperado da economia devem levar a redução importante da dívida bruta em relação ao PIB este ano para 86,3%. A estimativa anterior do JP era de 91,3%. Para 2022, houve redução de 94,8% para 88,7%.
Juros
Sem o drive externo, que fez a liquidez se reduzir à metade nesta sessão, a segunda-feira foi de juros em alta. Por um lado, a subida do dólar ajudou na recomposição de prêmios, mas o foco maior foi a correção de excessos da semana passada, em que o combo fiscal e exterior desmontou muitas apostas, em especial no trecho mais longo da curva.
O mercado monitorou nesta segunda, ainda, falas de Roberto Campos Neto, Paulo Guedes e Bruno Funchal, e se prepara para o PIB do primeiro trimestre, a ser conhecido na terça-feira, e a produção industrial de abril, na quarta-feira, que abre a temporada de dados de atividade do IBGE relativos ao segundo trimestre. Na sessão estendida, contudo, houve alta adicional, à medida que o mercado assimila o noticiário envolvendo a reforma administrativa.
A taxa do Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2022 passou de 5,041% na sexta-feira a 5,06% nesta segunda-feira. O DI para janeiro de 2023 foi de 6,593% a 6,68%. O janeiro 2025 subiu de 7,795% a 7,88%, na máxima. E o janeiro 2027 avançou de 8,434% a 8,47%. O diferencial entre os vértices 2022 e 2027 foi de 341 pontos-base, pouco acima dos 339 pontos da sexta-feira, mas bem abaixo dos 375 pontos do fim de abril.
A despeito da agenda cheia no Brasil, a ausência do investidor americano, em folga devido ao feriado de Memorial Day, fez o mercado ter pouca tração. Pela manhã, o dado do setor público consolidado reforçou as apostas de uma melhora fiscal, precificada ao longo da semana passada. O governo lembra, contudo, que o quadro inspira cuidados. O secretário especial de Fazenda, Bruno Funchal, disse nesta segunda à tarde que o dever de casa é "manter as contas organizadas".
O secretário destacou que as projeções recentes do mercado apontam crescimento maior do Produto Interno Bruto em 2021, mas isso é "vinculado à nossa organização fiscal". Mais cedo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que "economia brasileira está de novo em uma rota surpreendente". Aliás, sobre o PIB, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, admitiu em um vídeo gravado para uma reunião da Frente Parlamentar da Economia Verde, que a autarquia também pode rever as suas previsões para o nível de 4%.
Na terça-feira, aliás, o mercado espera uma série de revisões, após a divulgação das contas nacionais trimestrais do período de janeiro a março. Pesquisa do Projeções Broadcast aponta apostas de alta de 0,70% na margem, com intervalo de -2% a 2,40%.
Apesar do otimismo verbalizado no mercado com o crescimento econômico, a situação fiscal e de atividade está longe de estar resolvida, e o cenário político também dá sua contribuição para incerteza. No período da tarde, o Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) apurou que Paulo Guedes confidenciou ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que o presidente Jair Bolsonaro não quer a aprovação do texto da reforma administrativa e não trabalhará por ela. A notícia reforçou o viés de alta da sessão regular e fez os juros baterem máximas na estendida.
Bolsa
Mesmo sem a referência de Nova York no feriado norte-americano pelos militares mortos em ação, e em dia majoritariamente negativo nas praças europeias, com feriado também em Londres, os investidores domésticos encontraram fôlego para levar o Ibovespa mais adiante, em renovação conjunta de recorde intradia e de fechamento pela segunda sessão consecutiva. Nesta segunda-feira, o índice da B3 encerrou exatamente na nova máxima histórica, em alta de 0,52%, aos 126.215,73 pontos, saindo de mínima a 125.539,68, com giro moderado, de R$ 25,2 bilhões nesta última sessão de maio.
No mês, o Ibovespa acumulou ganho de 6,16%, o terceiro avanço mensal seguido, vindo de alta de 1,94% em abril e de 6% em março - foi o maior avanço mensal desde dezembro passado (9,30%). No ano, o índice sobe agora 6,05%. Destaque nesta segunda-feira na B3 para mineração (Vale ON +2,86%) e siderurgia (Usiminas +1,33%) com a alta na casa de 4% para o minério de ferro na China, que reaproximou a tonelada da linha de US$ 200, no dia em que o PMI chinês veio a 51 em maio - leituras acima de 50,0 indicam expansão da atividade, na margem. Na ponta do Ibovespa, Cosan subiu 6,61%, seguida por Eneva (+4,59%) e Raia Drogasil (+3,11%). No lado oposto, Braskem (-3,23%), Equatorial (-2,71%) e Iguatemi (-2,61%).
Mesmo com o Brent em alta em torno de 1% na sessão, negociado perto de US$ 70 por barril, o dia foi moderadamente negativo para as ações de Petrobras, com a ON em baixa de 0,22% e a PN, de 0,44% no fechamento, em leve realização após os fortes ganhos da última sexta-feira, quando reagiram à recomendação de compra do JPMorgan. "A reunião de Opep+, que acontece entre hoje e amanhã, pode trazer mais novidades sobre níveis de oferta e demanda do produto", observa Pietra Guerra, analista da Clear Corretora.
No quadro macro, "melhores perspectivas de crescimento econômico, a melhora nos números fiscais e alguns avanços nas discussões das reformas contribuem para cenário favorável, inclusive para o fortalecimento do real frente ao dólar, que acumulou valorização de 3,8% (em maio), com o câmbio a R$ 5,22", acrescenta a analista. A relativa recuperação dos fundamentos brasileiros, refletida também na temporada positiva de resultados corporativos no primeiro trimestre, resultou em ingresso líquido de recursos estrangeiros até aqui em maio.
De acordo com dados divulgados nesta segunda pela B3, os investidores estrangeiros ingressaram, em ternos líquidos, com R$ 1,781 bilhão na última quinta-feira, 26, quando o Ibovespa fechou em alta de 0,30%, aos 124.366,57 pontos, e giro financeiro reforçado a R$ 51,4 bilhões. Em maio, as entradas de recursos externos somam R$ 10,845 bilhões até o dia 26, elevando o fluxo positivo a R$ 30,025 bilhões em 2021.
Em maio, em dólar, o Ibovespa foi a 24.156,58 pontos, o maior nível do ano, comparado a 21.887,67 pontos no fim de abril e a 20.721,62 no encerramento de março. No fechamento de 2020, o índice da B3 em dólar estava em 22.937,77, vindo de 20.368,35 pontos no encerramento de novembro, quando se iniciou recuperação significativa do Ibovespa, com o índice de ações em alta de 15,90% naquele mês - uma retomada interrompida entre janeiro e fevereiro. Assim, no primeiro mês do ano, o Ibovespa em dólar foi a 21.018,82 e, no encerramento de fevereiro, oscilou para 19.629,85 pontos.
Em nota, os analistas Heloise Sanchez e Régis Chinchila, da Terra Investimentos, também chamam atenção para desdobramentos recentes, positivos para a perspectiva doméstica. "Os investidores seguem de olho em Paulo Guedes e Roberto Campos Neto. O ministro disse que a dívida pública brasileira fechará o ano perto de 85% do PIB, no mesmo evento em que Bolsonaro afirmou que o governo está comprometido com as reformas", observam. Além disso, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, apontou que até o final do ano todos os brasileiros estarão vacinados contra a Covid-19, acrescentam os analistas da Terra.
"O posicionamento dos BCs ao redor do mundo, de que os estímulos devem continuar, ajuda a manter os níveis recordes das bolsas. Acreditamos que o discurso deve permanecer nesse sentido por ora, dado que choques inflacionários temporários já estão nos modelos", aponta Paula Zogbi, analista da Rico Investimentos. Ela destaca também, na terça, a divulgação do PIB do Brasil no primeiro trimestre como importante fator de orientação para o mercado, que vinha melhorando as estimativas para o período assim como para o ano, especialmente desde a última leitura do IBC-Br.
Agência Estado e Correio do Povo