Ex-ministro da Justiça e Segurança Pública alega ter provas de acusações que fez contra o presidente sobre tentativa de interferir na PF
Estadão Conteúdo e Correio do Povo
O ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, afirmou à revista Veja que "o combate à corrupção não é prioridade do governo Bolsonaro". Ao deixar o cargo, o ex-juiz da Lava Jato acusou o presidente de tentar interferir no comando da Polícia Federal para obter relatórios sigilosos de investigações. Segundo Moro, essa teria sido apenas a gota d’água.
Nesta quinta-feira, o ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal, determinou ao ex-ministro que preste depoimento perante a Polícia Federal para apresentar provas de suas acusações. Em entrevista, Moro afirma que as apresentaria "no momento oportuno, quando a Justiça solicitar".
“Sinais de que o combate à corrupção não é prioridade do governo foram surgindo no decorrer da gestão. Começou com a transferência do Coaf para o Ministério da Economia. O governo não se movimentou para impedir a mudança. Depois, veio o projeto anticrime. O Ministério da Justiça trabalhou muito para que essa lei fosse aprovada, mas ela sofreu algumas modificações no Congresso que impactavam a capacidade das instituições de enfrentar a corrupção”, elencou Moro.
A transferência do Coaf, hoje batizado Unidade de Inteligência Financeira, foi uma das derrotas de Moro na gestão. Em maio, a Câmara dos Deputados transferiu o órgão para o Ministério da Economia. O governo posteriormente migrou o conselho para o Banco Central. A perda do Coaf foi uma derrota política do ex-juiz da Lava Jato, assim como projeto anticrime, que sofreu modificações durante tramitação no Congresso.
Uma das mudanças foi a inclusão do juiz de garantias, figura que atuaria durante o processo de instrução dos casos e não seria o responsável pelo julgamento dos réus. A medida foi incluída na esteira das revelações das reportagens da chamada "Vaza Jato".
“Recordo que praticamente implorei ao presidente que vetasse a figura do juiz de garantias, mas não fui atendido. É bom ressaltar que o Executivo nunca negociou cargos em troca de apoio, porém mais recentemente observei uma aproximação do governo com alguns políticos com histórico não tão positivo”, afirmou Moro.
Após as revelações de Moro, Bolsonaro foi alvo de novos pedidos de afastamento na Câmara dos Deputados, além de ser investigado em inquérito no Supremo Tribunal Federal ao lado do ex-juiz da Lava Jato. O caso envolve a demissão de Maurício Valeixo, ex-diretor-geral da Polícia Federal, e a nomeação do diretor da Abin, Alexandre Ramagem, para a chefia da corporação.
“O presidente tem muito poder, tem prerrogativas importantes que têm de ser respeitadas, mas elas não podem ser exercidas, na minha avaliação, arbitrariamente. Não teria nenhum problema em substituir o diretor da PF Maurício Valeixo, desde que houvesse uma causa, uma insuficiência de desempenho, um erro grave por ele cometido ou por algum de seus subordinados. Isso faz parte da administração pública, mas, como não me foi apresentada nenhuma causa justificada, entendi que não poderia aceitar essa substituição e saí do governo. É uma questão de respeito à regra, respeito à lei, respeito à autonomia da instituição”, afirmou Moro, à Veja.
Ramagem teve a nomeação suspensa por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF, e anulada por decreto publicado na quarta, por Bolsonaro. Apesar do ato, o Planalto afirmou que ainda recorrerá da decisão após o presidente afirmar que "seu sonho" é ter o diretor da Abin no comando da PF.