Em entrevista ao ‘Estado’, presidente da Câmara afirma que deputados querem ajudar e cobra diálogo com o presidente
Entrevista com
Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados
Andreza Matais e Vera Rosa, O Estado de S. Paulo
Rodrigo Maia acusou o ministro da Educação de gerar crise ao defender cortes Foto: Dida Sampaio/Estadão
Brasília - O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse ao Estado que, em cinco meses de governo, o presidente Jair Bolsonaro sofre com a redução de expectativas positivas e defendeu a aprovação de uma agenda de reformas para o País. “Chegamos num ponto onde ou nós construímos essa agenda em conjunto ou vamos para o colapso. Vai entrar no colapso de ruptura das relações sociais. É nisso que vai chegar”, afirmou. Para o deputado, partidos hoje tratados “de forma pejorativa” por integrarem o chamado Centrão podem entrar para a história como os que “salvaram” o Brasil se ajudarem a aprovar medidas para impulsionar o crescimento.
Alvo de ataques em manifestações de rua, Maia disse ter certeza de que a reforma da Previdência será aprovada, mas observou que só essa medida não é suficiente para tirar o País da crise. O deputado está montando grupos de trabalho para discutir propostas sobre emprego, renda, saúde e parcerias público-privadas e criticou o ministro da Educação, Abraham Weintraub. “Educação não pode ser o que esse ministro está fazendo”, comentou ele.
A seguir os principais trechos da entrevista:
Cinco meses de governo depois, qual a sua avaliação sobre a gestão Bolsonaro?
Em cinco meses, o presidente está vendo que os desafios do Brasil são enormes e que todo mundo quer ajudar, cada um com seu ponto de vista. E que ele vai conseguir construir, como tem construído nas últimas semanas, por meio do Onyx (Lorenzoni, ministro da Casa Civil), o diálogo necessário para que as coisas possam avançar.
O sr. apoia a iniciativa de alguns senadores de encaminhar proposta de emenda à Constituição para instituir o parlamentarismo no Brasil, a partir de 2022?
Discutir isso agora é antecipar um debate. Acho que pode ser o melhor mecanismo para governar o Brasil, mas não está na hora. Tem cinco meses de governo. Pode enfraquecer um governo que começou com grandes expectativas e elas estão se reduzindo. Não é bom para o Brasil que as expectativas positivas desse governo, com a crise que a gente vive, estejam caindo tão rápido.
O sr. se refere ao impacto sobre investimentos?
Quando a popularidade do presidente cai, a confiança dos investidores em aplicar os seus recursos no Brasil também cai. Se você olhar os números da economia, vai ver dados desastrosos. Não é bom que ele já esteja em algumas pesquisas com 25% de ótimo e bom, que entre os formadores de opinião no mercado financeiro tenha caído de 80% para 14%. Vai ver o que está acontecendo com a construção civil. Pararam o Minha Casa Minha Vida, e isso é muito grave.
Agora há muitos protestos em relação ao bloqueio de recursos na educação...
Acho que tem de se perguntar o que a direita pensa sobre habitação, saúde, educação. Educação não pode ser o que esse ministro está fazendo. Eu acho que, na área de educação, quem está trazendo a crise para o governo é o ministro (Abraham Weintraub) porque ele primeiro falou de corte, depois, de contingenciamento. Ele chamou as universidades para o conflito e depois falou: “Eu não disse isso, eu disse que era contingenciamento”. Aí faz um vídeo, um musical da Disney, no qual ataca a bancada do Rio. Agora, tem rebelião na bancada do Rio. Boa parte vai votar a Previdência com o governo. Atacar a bancada porque botou uma emenda para o museu e a emenda foi contingenciada? Onde estamos?
O sr. acha que é necessário um pacto pela governabilidade entre Executivo, Legislativo e Judiciário? Isso não é um cheque em branco para o governo?
Depende do que seja escrito. Um pacto com compromissos reafirmando a importância das instituições, com princípios, pode avançar. Pactos com agenda que caminhem para debate ideológico terão dificuldade de passar por todos os Poderes, não só na Câmara. Mas acho que a iniciativa é positiva.
O sr. foi alvo de ataques em manifestações pró-governo. Na sua opinião, o presidente estimulou a ofensiva contra o Congresso?
Acho que as manifestações são legítimas. O presidente teve apoio num grupo muito radical. Não é um grupo que fale com o meu eleitor, com os setores médios da sociedade. Agora, na hora em que vai o grupo mais próximo do presidente para a rua, e da forma com que ele se comunicou nos últimos meses, querendo transferir a responsabilidade para o Parlamento, o eleitor dele viu aquilo como necessário. Talvez de forma incoerente porque, modéstia à parte, se não fosse pelo meu trabalho, a Previdência estava ainda nas gavetas da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). O movimento ataca aqueles que têm salvado o governo.
De que forma?
O Affonso Celso Pastore (ex-presidente do Banco Central) deu uma entrevista (ao Estado, publicada ontem) e, no final, fala quantos votos nós tivemos. O Parlamento teve 97 milhões de votos. O presidente foi eleito em dois turnos. O núcleo dele continua com ele, mas o eleitor que não era desse núcleo já saiu.
O governo não tem base de sustentação no Congresso. Como aprovar as reformas assim?
A Previdência tem construção no Parlamento e vamos trabalhar para aprovar. A reforma tributária tem consenso maior ainda, os marcos regulatórios de garantia de investimento para o setor privado, também. Estamos com comissão tratando das parcerias públicos-privadas. Chegamos num ponto onde ou nós construímos essa agenda em conjunto ou vamos para o colapso. Vai entrar no colapso de ruptura das relações sociais. É nisso que vai chegar. Já estamos num colapso fiscal, num colapso previdenciário. A política está distante da sociedade, foi criminalizada. Todos os problemas que a sociedade vive hoje passaram a ser da política. Alguns pontos são corretos, mas às vezes esse pêndulo é exagerado. Para que a gente possa dar solução para o colapso social, precisamos ter uma agenda que venha do Executivo.
O governo continua um deserto de ideias, como o sr. disse antes?
Acho que a coisa está melhorando. Nós estamos aqui querendo ajudar. O próprio presidente do Banco Central (Roberto Campos Neto) esteve aqui com agenda muito positiva. Vou montar um grupo para trabalhar com ele e tratar de redução de juro, spread bancário, como montei outro para tratar de modernização do Estado.
Mas o presidente ainda critica a “velha política”...
Ao longo do tempo ele vai compreender, até porque foi deputado, que a maioria dos deputados quer ajudar. Ou todos. Cada um do seu ponto de vista. Para mim, a reforma da Previdência é vital; para o Ivan Valente (deputado do PSOL), não é. E a posição dele é tão legítima quanto a minha. O governador do Rio Grande do Sul (Eduardo Leite) disse na convenção do PSDB uma frase muito boa: “Coragem mesmo precisa quem tem a ousadia de ser ponderado”. Acho que a gente tem de radicalizar na ponderação, no equilíbrio, no diálogo.
Por que o DEM quer agora se descolar do Centrão?
Eu não entro nessa questão de “eu não sou daqui, eu não sou dali”. A presidente do Parlamento espanhol, quando esteve aqui, me perguntou: “Como vocês vão fazer para governar sem partido? Porque na Espanha isso é impossível”. Então, vamos criticar as pessoas que erram, mas não vamos desqualificar os partidos. Quem coloca você numa posição ou outra são seus atos ou atitudes. Se os partidos que estão no Parlamento provarem que tem agenda das reformas como prioridade... A forma pejorativa como se trata o tal Centrão hoje, amanhã na história vai entrar como os partidos que salvaram o Brasil do colapso social, do crescimento da desigualdade, da pobreza, da falta de educação e da falta de médicos.
O sr. acha que a reforma da Previdência vai ser aprovada?
Tenho certeza.
Quando o ministro Paulo Guedes diz que, se a reforma virar uma “reforminha”, pega as coisas e vai embora, isso ajuda?
A gente que está na política há muitos anos sabe que ninguém é insubstituível. O mercado financeiro, há um ano, queria R$ 500 bilhões. E se o governo está com pressa, a reforma do Michel (ex-presidente Michel Temer) começou com R$ 1 trilhão e o último texto falava em R$ 500 bilhões. Eles poderiam ter aprovado em março a (proposta) do Michel, se tivessem voto.
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Estadão