Lei foi aprovada em 2017 e é criticada por entidades de classe
Serão abertas 38 vagas para veterinários terceirizados | Foto: Fernando Dias / Divulgação / CP
Rejeitado pelos fiscais agropecuários estaduais e defendido pelas indústrias, o novo sistema de inspeção sanitária e industrial de produtos de origem animal começa a funcionar neste mês em empresas sob fiscalização do Estado. Com o novo modelo, instituído pela lei n15.027, de 2017, o serviço de inspeção deixa de ser totalmente público dentro dos frigoríficos e, assim como já ocorre em Santa Catarina e no Paraná, passa a contar com veterinários ligados à iniciativa privada.
De acordo com a Secretaria da Agricultura, Pecuária e Irrigação (Seapi), existem 38 vagas que podem ser imediatamente preenchidas por profissionais habilitados. Vários empresários começaram a negociar a contratação de veterinários com as credenciadas e um já formalizou pedido ao Estado para migrar da inspeção pública para a privada.
A proposta do sistema de inspeção delegada à iniciativa privada começou a tramitar no Estado em junho do ano passado, quando o então secretário da Agricultura, Pecuária e Irrigação, Ernani Polo, apresentou uma minuta ao setor produtivo.
Na Assembleia Legislativa, o projeto de lei foi aprovado por 34 votos a 15 em agosto. No dia 22 de dezembro, o Diário Oficial do Estado publicou o decreto de regulamentação. Uma das principais mudanças geradas pela lei foi a diferenciação de inspeção e de fiscalização. Antes das novas regras, o serviço oficial tinha atribuição de inspecionar e fiscalizar os processos industriais. Agora, o setor privado pode fazer a inspeção permanente dentro das empresas que abatem animais, enquanto que o Estado, que tem poder de polícia, focará na fiscalização.
Com exceção da aplicação de autuações, que é papel exclusivo do serviço oficial, o inspetor privado assumirá os mesmos procedimentos que antes eram executados pelos fiscais. Entre suas tarefas estão fazer o exame clínico dos animais que chegarem ao abatedouro e acompanhar todo o procedimento durante e após o abate, até o encaminhamento das carnes para as câmaras frias, de onde seguirão para a comercialização. Se constatar irregularidades, o inspetor acionará imediatamente o fiscal estadual ou, dependendo do caso, repassará os apontamentos ao servidor público na ocasião da fiscalização à empresa. Caberá ao agente público, então, analisar o termo de irregularidade e decidir sobre a aplicação de penalidades cabíveis.
Os inspetores contrários à mudança argumentam que não há como dissociar a inspeção da fiscalização, mas a Seapi alega que a inovação está respaldada em recomendações da Organização Mundial de Saúde Animal (OIE). Para o diretor-geral da Seapi, Antônio Machado de Aguiar, o novo modelo propõe outro paradigma, já que desde 1996 procedimentos relacionados aos produtos de origem animal nunca mudaram. Ele lembra, no entanto, que os frigoríficos, se quiserem, podem optar por continuar sob inspeção do serviço oficial.
A empresa Compilar Consultoria de Resultados ME, de Venâncio Aires, que foi a primeira a se credenciar na Seapi como prestadora do serviço, tem pelo menos 10 negociações em andamento com frigoríficos de carne bovina, aves e suínos, e 40 veterinários cadastrados na sua base de dados. Todos possuem mais de 600 horas de experiência em inspeção, o que já os habilita a começar a atuar nas indústrias. Segundo o diretor executivo da Compilar, Joel Luiz Martins, o trabalho destes profissionais será avaliado semanalmente para manter a credibilidade e a transparência. “Sabemos que tem um segmento contrário às mudanças, mas o Estado não dá mais conta do recado sozinho”, analisa.
Além das 38 vagas que já estão à espera de inspetores privados, a Seapi acredita que o número pode subir se as prefeituras que cedem cerca de 40 profissionais ao Estado começarem a encerrar os convênios. “O Estado tem quadros escassos e por isso deu encaminhamento a este assunto com os objetivos de evitar que as empresas deixem de funcionar por falta de inspeção e de não comprometer a questão sanitária por falta de fiscalização”, destaca o atual secretário da Agricultura, Odacir Klein.
Como uma das tarefas do atual modelo será transferida para os inspetores privados no novo, a expectativa é que seja reduzido o déficit de funcionários em outras áreas do serviço, como a própria fiscalização e as vistorias e análises para a autorização de funcionamento de novas plantas e ampliações industriais. No ano passado, a Seapi apontava a existência de 32 projetos represados, à espera da análise da Divisão de Inspeção de Produtos de Origem Animal, que estariam deixando de gerar 450 novos empregos e R$ 19,5 milhões de ICMS ao ano no Estado.
Aguiar argumenta que este valor é muito superior aos cerca de R$ 2 milhões que não entrarão mais nos cofres públicos com o novo modelo, já que parte da taxa de abate de animais deixará de ser recolhida quando as empresas migrarem para a inspeção privada.
Apesar da iminência da operação da nova estrutura, algumas entidades questionam a credibilidade e a legalidade da proposta. O presidente da Associação dos Fiscais Estaduais Agropecuários do Estado (Afagro/RS), Antonio Augusto Medeiros, diz que o novo modelo ainda é “algo incerto para os servidores públicos” que, no ano passado, não foram ouvidos e que, até agora, não têm informação sobre como se operacionalizará a fiscalização separada da inspeção. “Para nós, este modelo é inviável e as preocupações continuam as mesmas de quando se começou a falar nisso”, critica. “Só grandes empresas vão ter condições de arcar com esta inspeção, que tem custo elevado. As pequenas, que são maioria, vão ficar de fora”, acrescenta.
Correio do Povo
Brasil, pátria educadora!!!!!