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terça-feira, 31 de março de 2015

Sem nunca ter chegado ao auge, Brasil enfrenta desindustrialização precoce

por OSCAR PILAGALLO

Entre tantos indicadores econômicos negativos que têm gerado manchetes –desaceleração da economia, pressão inflacionária, aumento do desequilíbrio externo–, o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff será também lembrado por uma tendência que costuma ser menos mencionada: a intensificação do processo de desindustrialização precoce.

É isso o que sugerem os dados do IBGE relativos à participação da indústria no PIB em seu primeiro mandato.

No primeiro ano, em 2011, a indústria representava pouco mais de 27,2% do PIB, mesmo patamar da herança deixada por Lula. Nos anos seguintes, a participação despencou, primeiro com mais intensidade e depois à razão de um ponto percentual por ano, atingindo marca inferior a um quarto, o pior resultado das últimas décadas.

  Editoria de Arte/Folhapress  
 
Em relação às duas administrações anteriores, a de Dilma não se sai bem nesse quesito. Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), apesar das políticas liberais e da abertura do país a importações para ajudar no controle da inflação, pegou e entregou a participação da indústria no PIB na casa dos 26%.

Sob Lula, a trajetória não foi diferente: em que pesem as variações ao longo dos mandatos, a participação da indústria em 2003 e 2010 ficou em torno de 27%.

Quando se fecha o foco na indústria de transformação, cujos produtos têm maior valor agregado, o cenário é mais desolador. A participação no PIB em 2014, de 10,9%, é bem inferior à metade da registrada em meados da década de 1980, a "década perdida".

Só em São Paulo, que concentra a produção dessa indústria, houve perda de 164 mil empregos formais em 2014, retração de 2% no ano, segundo a Fiesp, a federação das indústrias de São Paulo.

ANTES DA HORA

Tal desindustrialização é precoce por ocorrer antes de a indústria do país alcançar o auge ideal e então começar a perder importância relativa na economia, em favor de setores potencialmente mais sofisticados, como serviços.

Essa seria a desindustrialização natural, típica dos países mais ricos, sem impacto negativo sobre geração de emprego e renda.

Na desindustrialização precoce ocorre perda da renda média dos trabalhadores, pois a indústria tem elevado índice de empregos formais, paga salários mais altos e é um dínamo de crescimento, devido ao efeito multiplicador na economia.

Economistas alinhados com o interesse da indústria nacional consideram que os 12 anos de governo petista representaram uma oportunidade perdida para o setor. O aumento da renda dos brasileiros, que viabilizou a compra de produtos de consumo, foi em grande parte capturado pelas importações.

Esse processo ocorreu sobretudo no primeiro mandato de Dilma, quando a produção industrial ficou praticamente estagnada. Desindustrializar, aliás, não implica necessariamente queda da produção industrial, como a de 1,2% que correu no ano passado. Trata-se apenas da perda da relevância da indústria. Na economia, o que pode ocorrer se ela não crescer ou até se crescer menos que outros setores.

Nos dois governos anteriores, a produção industrial andou no mesmo compasso da economia em geral, o que explica o fato de sua participação no PIB ter permanecido no mesmo patamar.

Nos dois governos Lula, aumentou 3,5% e 2,8%, respectivamente, segundo dados não revisados. Nos dois de FHC, as taxas foram de 1,3% e 2,5%. Antes, a indústria dera um salto (de 7,5%) na curta gestão de Itamar Franco, que se seguiu à desastrosa performance no conturbado governo de Fernando Collor, com queda de 3,7%.

PIOR DESEMPENHO

Do ponto de vista da produção industrial, portanto, o primeiro mandato de Dilma foi o mais fraco desde os dois anos e meio de Collor, marcados pelo confisco da poupança, pelo fracasso do combate à inflação, pelo início de uma abertura comercial desregrada e pelo impeachment.

Só uma análise com viés oposicionista, porém, poderia atribuir responsabilidade exclusiva a Dilma pela desindustrialização em curso.

Entre as razões do processo estão desde as políticas liberais dos anos 1990 até a baixa qualificação da mão de obra, passando pelos juros elevados, pelo baixo nível de poupança interna, pelos gargalos de infraestrutura e, até recentemente, pelo câmbio sobrevalorizado.

Com tantos elementos determinantes, a desindustrialização precoce do Brasil está mais para obra coletiva. A "contribuição" de Dilma foi ter deixado que sua defesa da indústria nacional se transformasse em retórica vazia.

OSCAR PILAGALLO, jornalista, é autor de "A Aventura do Dinheiro" (Publifolha)
Fonte: Folha Online - 29/03/2015 e Endividado
 

Orçado em R$ 7,1 bi, monotrilho de SP opera só em 2,9 km; obras pararam

por ARTUR RODRIGUES

Não há filas na bilheteria ou nas catracas, muito menos camelôs nas imediações da estação. Nos trens, de tão reduzido, o número de passageiros caberia numa van.

Esse é o cenário diário no monotrilho da zona leste de São Paulo, obra do governo Geraldo Alckmin (PSDB) que parece um trem-fantasma se comparada a qualquer transporte público da cidade.

Os trens funcionam em esquema de testes desde agosto do ano passado, apenas das 9h às 14h e num trecho de 2,9 km entre as estações Vila Prudente e Oratório –a obra completa, estimada em R$ 7,1 bilhões, terá 18 estações.

Por uma falha no projeto, a construção de parte das estações está paralisada. Conforme a Folha revelou, engenheiros "descobriram" galerias de água que passam embaixo das futuras estações e terão de ser remanejadas.

Na última quinta-feira (26), a reportagem acompanhou toda a rotina da linha 15-prata do metrô, o monotrilho, cujas obras estão atrasadas.

O trem, com sete vagões, tem capacidade para 1.002 pessoas: 122 sentadas e 880 em pé. Na prática, cada viagem reúne de 5 a 25 usuários.

Uma das poucas usuárias, a atendente Sandra Biazi, 49, usa a linha para ir ao trabalho, perto da Paulista. "Eu trabalho das 11h às 17h. Na volta [quando a linha já fechou], desço na Vila Prudente [linha verde do metrô] e ando 3 km até o Oratório, porque os ônibus estão lotados demais".

A dona de casa Francisca Palma, 67, que costuma aproveitar o vagão quase privativo, já pensa em abandonar o monotrilho. "Quando [tudo] estiver pronto, vai vir cheio da Cidade Tiradentes, e a gente não vai nem conseguir entrar".

  Editoria de Arte/Folhapress  
 
Hoje, o horário de pico do trem ocorre por volta das 9h, na abertura das estações, quando a lotação pode ultrapassar a casa das duas dezenas graças à presença de funcionários do metrô.

A impressão é que, entre uniformizados ou não, a maioria dos passageiros está a serviço da companhia.

Alguns trabalham em notebooks, outros andam de um lado para o outro fazendo anotações. De tempos em tempos, operários entram no vagão e fazem selfies.

Nas estações, há cadernos disponíveis para sugestões de passageiros sobre o serviço. Nas anotações, há queixas sobre a demora nos testes. Mas há também quem elogie o trem ("espetacular"), proteste ("fora, Dilma!") e fale sobre suas preferências gastronômicas ("Eu gosto de bacon").

TREPIDAÇÃO

Quem anda de metrô em SP estranha o monotrilho, pelas dimensões reduzidas ou pelo maior tempo de espera (dez minutos, em média).

O que chama a atenção do contador Wagner de Oliveira, 35, é a trepidação, num trem que circula a uma altura de 12 a 15 metros. "Quando estiver em funcionamento normal e lotado, não sei se vou ter coragem. Porque, se completamente vazio, ele já treme desse jeito, imagina cheio".

Segundo o Metrô, as oscilações são comuns em veículos que trafegam com pneus sobre concreto, como o monotrilho. A empresa defendeu o atual período de testes.

"O funcionamento das novas estações em período parcial é essencial e possibilita os ajustes finais dos equipamentos, sistema​s e suas interfaces", afirmou, em nota.

Ainda em abril, o período de operação da linha será ampliado –das 7h às 19h.

A companhia diz que, hoje, cerca de mil pessoas fazem o trajeto por dia -quando a linha estiver concluída poderá transportar 500 mil. A previsão é que mais três estações sejam entregues até 2016.
Fonte: Folha Online - 31/03/2015 e Endividado