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sábado, 6 de junho de 2015

A Guerra dos Emboabas

 Apesar da fome que assolou as minas em 1697/98 ter sido terrível, uma crise de desabastecimento ainda mais devastadora se abateria sobre a região em 1700. Três anos depois da descoberta das primeiras jazidas, cerca de 6 mil pessoas tinham chegado às minas. Na virada do século 18, esse número quintuplicara: 30 mil mineiros já perambulavam pela área. Simplesmente não havia o que comer: qualquer animal ou vegetal que pudesse ser consumido já o fora. “Chegou a necessidade a tal externo que se aproveitavam dos mais imundos animais e, faltando-lhes esses poderem alimentar a vida, largaram as minas e fugiram para os matos para comerem cascas e raízes”, relatou o governador Artur de Sá à corte, em 1701. Foram devorados cobras, içás, sapos e “bichos mui alvos criados em paus podres”, cuja ingestão às vezes era fatal aos famintos. Formigas tostadas viraram uma iguaria comparada à “melhor manteiga de Flandres”. Os preços de qualquer comestível que chegava à região se tornaram exorbitantes: quando os baianos abriram o caminho que, pelas margens de São Francisco, conduzia ao pólo minerador, um boi, que em Salvador valia 4 mil-réis, era ali revendido por 96 mil-réis. No Caetê, uma galinha galinha valia 14 gramas de ouro.
O pior estava por vir. “Morreu muita gente naquele tempo, de doença e necessidades e outros que matavam para os roubar, na volta, que levavam ouro (…) matavam uns aos outros pela ambição de ficarem com ele, como aconteceu em muitos casos”, relatou um contemporâneo. Em 1707, o previsível aconteceu: rebentou a guerra nas Minas Gerais. De um lado, os paulistas; de outro, os “forasteiros”, chamados de emboabas.
A Guerra dos Emboabas prolongou-se por quase três anos e deixou duas centenas de mortos. Seus episódios são confusos e contraditórios e os relatos da época eram redigidos por partidários ou inimigos de uma facção ou de outra. A seguir, o resumo do conflito e seus desdobramentos:
O que foi: A Guerra dos Emboabas foi o confronto entre os paulistas – descobridores das minas e dos caminhos que levavam até elas – e os “forasteiros” (especialmente os portugueses), que chegaram depois e se apoderaram (pela força das armas ou do dinheiro) de algumas das melhores lavras. Os queriam exclusividade na mineração.
Quanto durou: O primeiro confronto deu-se em maio de 1707, quando um paulista matou o português dono de uma estalagem em Ponta do Morro (vilarejo próximo a São João del Rei). O último combate ocorreu a 22 de novembro de 1709, quando, depois de oito dias de luta, os paulistas desistiram de tentar tomar o arraial onde os emboabas estavam entrincheirados.
Como começou: Depois do incidente em Ponta do Morro, três episódios semelhantes ocorreram em menos de um semestre. Em todos eles, um paulista matou um “emboaba” por motivo fútil. Sob a liderança de Manuel Nunes Viana, os emboabas reagiram, incendiaram Sabará e expulsaram boa parte dos paulistas das minas. Viana se tornou “governador” da região, no lugar do paulista Borba Gato. Diz a lenda que, ao chegarem em casa derrotados, os paulistas foram forçados por suas mulheres a retornar ao campo de batalha. Apesar de matarem 80 emboabas, durante o sítio ao Arraial Novo, não conseguiram a vitória.
Palavra emboaba: Vem do tupi amô-obá e significa “estrangeiro”.
Consequências: Na prática, os paulistas perderam o controle das minas mas, em 1710, São Paulo acabou se tornando uma capitania independente.


Fonte: História do Brasil (1996), página 67.