por RENATA AGOSTINI
Para Guilherme Leal,
sócio fundador da Natura, a crise hídrica mostra que os céticos da
mudança climática "não falam coisa com coisa".
Ele integra o The B Team, grupo de empresários mundiais que buscam motivar governos a se comprometer com a economia sustentável.
Leal, que foi candidato a vice-presidente na chapa de Marina Silva em 2010, afirma que é de "pasmar" o que os governos não fizeram no Brasil para evitar a crise hídrica e prevê um ano difícil para os empresários do país.
Folha - O B Team propõe zerar as emissões de carbono do mundo até 2050. Dá tempo?
Guilherme Leal - Eu acho que não, mas temos de colocar isso como objetivo. Se zerarmos as emissões em 2100, teremos uma chance pequena de evitar o aumento da temperatura, segundo o IPCC [Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas].
Teremos US$ 95 trilhões em investimentos no mundo nos próximos 15 anos. Se não criarmos um marco legal que permita direcioná-los para uma economia de baixo carbono, não conseguiremos. As decisões que precisam ser tomadas neste ano são muito importantes, em especial no âmbito da COP21 [conferência global do clima que ocorrerá em dezembro, em Paris].
O B Team pede o compromisso com diversas medidas, como o fim dos subsídios aos combustíveis fósseis. O que deve ser prioritário?
Temos US$ 1 trilhão em subsídios a combustíveis fósseis no mundo. O investimento nas energias renováveis é de US$ 260 bilhões. Não dá. Com a queda do petróleo, abre-se espaço para reduzir subsídios e até taxar os [combustíveis] fósseis. Politicamente, é uma oportunidade rara.
Como lidar com os que não acreditam nas mudanças climáticas?
A crise hídrica está mostrando que os céticos não falam coisa com coisa. É lastimável termos um ministro da Ciência e Tecnologia [Aldo Rebelo] que não acredita em mudança climática. O Brasil tem papel importante para o equilíbrio de emissões com suas florestas. E tem de assumi-lo.
Quais as chances de esse tema entrar na agenda do governo neste ano?
Você pensa: no meio dessa confusão de Operação Lava Jato, seca, recessão, ajuste fiscal, [eleição do presidente da Câmara] Eduardo Cunha... Dá para parar e abrir uma cerveja? (risos). Mas não dá para desistir. Por mais complexo que seja 2015, fazemos parte do mundo. O Brasil tem um papel importante historicamente nessas negociações por ser o país que é, um patrimônio natural.
Se estivermos criando de fato uma dinâmica negocial em torno da indústria florestal, seremos um ator importante. Estamos falando de desenvolvimento econômico.
O governo de São Paulo não tem abordado medidas de longo prazo, como a recuperação das matas ciliares...
Estamos tratando o ontem. O colapso total está aí e até agora quase nada foi feito. A curto prazo, não tem outro jeito senão uma profunda racionalização do consumo.
Para que isso aconteça, tem de faltar [água], ou as pessoas e as indústrias não se mobilizam. Aqui é de pasmar o que nós não fizemos e o que não estamos fazendo. Vai acabar tudo e ninguém fará nada?
A crise forçará as empresas a repensar o uso de água?
É um alerta fundamental. Todos serão afetados. Por isso, temos previsão de recessão por causa da crise de água e energia. Olhando para a frente, não vai melhorar. Não vai ter abundância de recursos hídricos nunca mais. A situação de São Paulo tem de trazer essa consciência.
Qual o impacto para a Natura?
Temos água de poços artesianos suficiente e backup de energia com geração a diesel. Não é a melhor coisa, porque aumenta nossa emissão de carbono. Temos a meta de reduzir emissão em mais 33% nos próximos cinco anos. A crise atrasa cumpri-la.
O senhor está no grupo dos pessimistas com a economia?
Sou realista. O quadro é muito preocupante. Você junta crise de água e energia, o quadro macroeconômico, a Petrobras sangrando e o quadro político absolutamente instável. Independentemente de posição política, você vê uma presidente isolada, com sua base fragmentada.
A situação está conseguindo ser mais oposição do que a própria oposição. Há um grupo de empresas envolvidas [no escândalo da Petrobras] importante para o andamento das obras do país. E como se sai disso? Quais são as lideranças? Não é fácil. Ninguém quer falar nisso, mas até numa hipótese de um eventual impeachment, se as coisas se complicam demais lá na frente, quem substitui? Nosso constitucionalista Michel Temer? Zzzzzz [finge dormir].
O mercado de consumo sofrerá neste ano?
Sofrerá. Somos ainda um setor com dinâmica importante. Os números não foram nada ruins em 2014, mas a taxa desacelerou fortemente.
Agora vem aumento de carga tributária. É obvio que o consumo está cedendo. É que [o impacto] chega atrasado. Não estou dizendo que nosso mercado está com problema ou crise. Ele crescerá, mas será em ritmo muito menor.
RAIO-X GUILHERME LEAL
IDADE
64
O QUE FAZ
Sócio-fundador da Natura Cosméticos e conselheiro da organização filantrópica Instituto Arapyaú
ONDE NASCEU
Santos, São Paulo
FORMAÇÃO
Administrador de empresas pela FEA/USP
POLÍTICA
Candidato a vice-presidente na chapa de Marina Silva (então pelo PV) em 2010
Fonte: Folha Online - 08/02/2015 e Endividado
Ele integra o The B Team, grupo de empresários mundiais que buscam motivar governos a se comprometer com a economia sustentável.
Leal, que foi candidato a vice-presidente na chapa de Marina Silva em 2010, afirma que é de "pasmar" o que os governos não fizeram no Brasil para evitar a crise hídrica e prevê um ano difícil para os empresários do país.
Folha - O B Team propõe zerar as emissões de carbono do mundo até 2050. Dá tempo?
Guilherme Leal - Eu acho que não, mas temos de colocar isso como objetivo. Se zerarmos as emissões em 2100, teremos uma chance pequena de evitar o aumento da temperatura, segundo o IPCC [Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas].
Teremos US$ 95 trilhões em investimentos no mundo nos próximos 15 anos. Se não criarmos um marco legal que permita direcioná-los para uma economia de baixo carbono, não conseguiremos. As decisões que precisam ser tomadas neste ano são muito importantes, em especial no âmbito da COP21 [conferência global do clima que ocorrerá em dezembro, em Paris].
O B Team pede o compromisso com diversas medidas, como o fim dos subsídios aos combustíveis fósseis. O que deve ser prioritário?
Temos US$ 1 trilhão em subsídios a combustíveis fósseis no mundo. O investimento nas energias renováveis é de US$ 260 bilhões. Não dá. Com a queda do petróleo, abre-se espaço para reduzir subsídios e até taxar os [combustíveis] fósseis. Politicamente, é uma oportunidade rara.
Como lidar com os que não acreditam nas mudanças climáticas?
A crise hídrica está mostrando que os céticos não falam coisa com coisa. É lastimável termos um ministro da Ciência e Tecnologia [Aldo Rebelo] que não acredita em mudança climática. O Brasil tem papel importante para o equilíbrio de emissões com suas florestas. E tem de assumi-lo.
Quais as chances de esse tema entrar na agenda do governo neste ano?
Você pensa: no meio dessa confusão de Operação Lava Jato, seca, recessão, ajuste fiscal, [eleição do presidente da Câmara] Eduardo Cunha... Dá para parar e abrir uma cerveja? (risos). Mas não dá para desistir. Por mais complexo que seja 2015, fazemos parte do mundo. O Brasil tem um papel importante historicamente nessas negociações por ser o país que é, um patrimônio natural.
Se estivermos criando de fato uma dinâmica negocial em torno da indústria florestal, seremos um ator importante. Estamos falando de desenvolvimento econômico.
O governo de São Paulo não tem abordado medidas de longo prazo, como a recuperação das matas ciliares...
Estamos tratando o ontem. O colapso total está aí e até agora quase nada foi feito. A curto prazo, não tem outro jeito senão uma profunda racionalização do consumo.
Para que isso aconteça, tem de faltar [água], ou as pessoas e as indústrias não se mobilizam. Aqui é de pasmar o que nós não fizemos e o que não estamos fazendo. Vai acabar tudo e ninguém fará nada?
A crise forçará as empresas a repensar o uso de água?
É um alerta fundamental. Todos serão afetados. Por isso, temos previsão de recessão por causa da crise de água e energia. Olhando para a frente, não vai melhorar. Não vai ter abundância de recursos hídricos nunca mais. A situação de São Paulo tem de trazer essa consciência.
Qual o impacto para a Natura?
Temos água de poços artesianos suficiente e backup de energia com geração a diesel. Não é a melhor coisa, porque aumenta nossa emissão de carbono. Temos a meta de reduzir emissão em mais 33% nos próximos cinco anos. A crise atrasa cumpri-la.
O senhor está no grupo dos pessimistas com a economia?
Sou realista. O quadro é muito preocupante. Você junta crise de água e energia, o quadro macroeconômico, a Petrobras sangrando e o quadro político absolutamente instável. Independentemente de posição política, você vê uma presidente isolada, com sua base fragmentada.
A situação está conseguindo ser mais oposição do que a própria oposição. Há um grupo de empresas envolvidas [no escândalo da Petrobras] importante para o andamento das obras do país. E como se sai disso? Quais são as lideranças? Não é fácil. Ninguém quer falar nisso, mas até numa hipótese de um eventual impeachment, se as coisas se complicam demais lá na frente, quem substitui? Nosso constitucionalista Michel Temer? Zzzzzz [finge dormir].
O mercado de consumo sofrerá neste ano?
Sofrerá. Somos ainda um setor com dinâmica importante. Os números não foram nada ruins em 2014, mas a taxa desacelerou fortemente.
Agora vem aumento de carga tributária. É obvio que o consumo está cedendo. É que [o impacto] chega atrasado. Não estou dizendo que nosso mercado está com problema ou crise. Ele crescerá, mas será em ritmo muito menor.
RAIO-X GUILHERME LEAL
IDADE
64
O QUE FAZ
Sócio-fundador da Natura Cosméticos e conselheiro da organização filantrópica Instituto Arapyaú
ONDE NASCEU
Santos, São Paulo
FORMAÇÃO
Administrador de empresas pela FEA/USP
POLÍTICA
Candidato a vice-presidente na chapa de Marina Silva (então pelo PV) em 2010
Fonte: Folha Online - 08/02/2015 e Endividado