Mais de 23 mil moradias da Capital não possuem numeração oficial
O endereço e o número de residência são os dados solicitados para pedir qualquer tipo de serviço público – como ligação de luz, água ou cadastro em programas sociais. E também para receber uma encomenda pelos Correios ou pedir um delivery. Essa espécie de ‘RG’ do local de moradia, no entanto, não é a realidade de 23,2 mil endereços de Porto Alegre, de acordo com o Censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O dado representa 3% de residências ou estabelecimentos sem catalogação oficial, dos 762.240 mil endereços contabilizados na Capital.
O bairro Rubem Berta, na Zona Norte, é o que possui o maior em número de estruturas nessa situação, com 1.766. Na sequência, estão os bairros Farrapos (1.625), Lomba do Pinheiro (1.429) e Restinga (1.385). Todas elas estão situadas em regiões periféricas da cidade. Confira abaixo os 10 principais locais.
Onde estão as casas sem número
A falta de numeração de um endereço é registrada pelos recenseadores do IBGE no momento da coleta de dados do Censo Demográfico, realizado a cada 10 anos. Os profissionais aplicam um questionário, por meio de entrevista presencial, a todas as pessoas residentes no território.
Conforme o coordenador operacional do Censo no Rio Grande do Sul, Luís Eduardo Puchalski, normalmente, os domicílios sem identificação estão concentrados em dois tipos de áreas: comunidades periféricas, onde existem ocupações recentes, e zonas rurais.
“São as duas partes de território onde são mais comuns essas situações. Porque naquelas áreas urbanizadas, já tradicionais, onde se tem arruamento, em que os lotes têm título de propriedade, é bem mais raro encontrar situações como essas”, explica Puchalski.
Ao andar por acessos do bairro Rubem Berta é possível listar diversas casas sem qualquer identificação por número. Entre elas, estão as residências da família de Jeremias Lopes Alves, 53, na rua Afonso Moacir Cerioli, onde ele também mantém um estabelecimento comercial.
Fruto de uma ocupação há cerca de três décadas, a área que começou com uma pequena construção, hoje concentra novas estruturas levantadas pelos filhos do comerciante ao longo dos últimos anos. Por se tratarem de moradias mais recentes e em processo de regularização, ainda não possuem identificação visível.
“Aqui deste lado da minha casa e do bar temos número. Mas ali do outro lado, faz cerca de dois meses que recebemos a instalação da luz pela companhia de energia e também o número, até então não tinha. Agora, estamos vendo a melhor maneira de colocar na frente.”
Das correspondências ao acesso à saúde: impactos da falta de endereço
Atividades corriqueiras, como abrir cadastro para comprar em lojas ou receber entregas em casa, podem se tornar um problema para quem mora em uma local sem numeração. Outros desafios também surgem em situações de emergência, como para acionar serviços de atendimento médico ou policial, por exemplo.
O professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) e coordenador do Observatório das Metrópoles - Núcleo Porto Alegre, Mário Lahorgue, explica que o endereço é tão importante quanto a carteira de identidade de uma pessoa.
“Uma forma de alcançar cidadania é ter endereço. Isso significa que, em Porto Alegre, 23 mil pessoas estão fora de qualquer parâmetro de cidadania.”, explica.
Os dados também são importantes para mensurar e calcular rotas e estimular políticas públicas centradas nas localizações dos habitantes.
No caso da família de Jeremias, a solução encontrada para evitar problemas pela falta de registro oficial foi utilizar o endereço da casa já registrada como referência para entregas e serviços. “Quando é o caso de alguma encomenda, todos acabam mandando para cá.”
De quem é a responsabilidade
A competência de numerar um endereço é da prefeitura do município. Em Porto Alegre, a identificação segue regras que definem se o número é par ou ímpar, e a distância em metros do início da rua até a entrada da casa. A solicitação pode ser feita durante o processo de obtenção do alvará de construção.
Questionada pela reportagem sobre a situação dos imóveis sem identificação na cidade, a prefeitura afirmou que os endereços se encontram em áreas irregulares.
“Todas as edificações regulares, com Carta de Habitação emitida pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus), possuem numeração. A regularização fundiária é o processo urbanístico, social, ambiental e jurídico que possibilita regularizar a posse de terra, regrada pela Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017.”
Regularização Fundiária
Para o geógrafo, o caminho para resolver este e outros problemas habitacionais passa pela regularização fundiária, processo que visa legalizar a posse de terras e imóveis ocupados de forma irregular. O objetivo é garantir o direito à propriedade e à moradia, além de promover o desenvolvimento urbano.
“É interessante que os gestores públicos tomem ciência desses dados, porque são importantíssimos e mapeiam onde é que estão os principais problemas das cidades. Tudo isso está previsto em legislação, existe como fazer, mas é preciso ter vontade para realizar esse tipo de investimento.”
Para este processo, a prefeitura informa que a Procuradoria de Assistência e Regularização Fundiária da Procuradoria-Geral do Município (PGM) atua na regularização fundiária jurídica e registral em processos coletivos, por meio da orientação jurídica, coleta de documentação e encaminhamento para registro.
As etapas incluem levantamento topográfico, projeto urbanístico e documentação dos ocupantes dos terrenos.
Para mais informações, o cidadão deve entrar em contato com o setor responsável:
Procuradoria Geral do Município
- Telefone: (51) 3289-1485 (WhatsApp)
- E-mail: parf@pgm.prefpoa.com.br
- Endereço: Rua Siqueira Campos, 1300, 12º andar - Centro Histórico
Cenário nacional
No contexto nacional, o Censo de 2022 mostra que 22,8% de todos os endereços do Brasil não têm identificação. São 24,4 milhões de residências ou estabelecimentos sem catalogação oficial. Foram contabilizados 106 milhões de endereços no Brasil.
Três capitais lideram o ranking de endereços sem número. Segundo o IBGE, Brasília, com 1,2 milhão de endereços, Goiânia, com 526.308, e Rio de Janeiro, com 280.496, são as cidades com maior informalidade na identificação das residências.
Correio do Povo
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