quinta-feira, 10 de abril de 2025

Grupo que resgatou armas em vez de crianças na enchente em Porto Alegre processa empresa de artefatos bélicos

 

Os voluntários dizem que foram expostos a um alto risco.  Foto: César Lopes/PMPA

Um grupo de seis voluntários que ajudava nos resgates durante as enchentes do ano passado no Rio Grande do Sul ingressou na Justiça contra a empresa gaúcha Taurus, pedindo indenização de quase R$ 1,3 milhão. Eles relatam terem sido chamados para salvar crianças ilhadas no então inundado Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, mas que acabaram resgatando uma carga de armamento.

O processo envolve um pedido coletivo de de R$ 1.270.800 à fabricante, por danos morais. A alegação é de que foram enganados, coagidos e constrangidos na ação, que retirou 3 mil artefatos bélicos de dentro do aeroporto. Dizem, ainda, que que a Taurus mentiu sobre a missão: “Faltou lealdade, informação e assistência no episódio”.

Eles também argumentam terem sido expostos a alto risco. Isso porque não teriam recebido treinamento adequado e nem equipamentos de segurança, como coletes a prova de balas, para carregar o arsenal.

A Taurus Armas S.A. nega que tenha recrutado voluntários civis. A empresa informou não ter qualquer responsabilidade sobre a operação e que as armas estavam em processo de exportação. A custódia seria, por isso, da concessionária Fraport, que administra o aeroporto, e a responsabilidade da segurança do armamento seria da Polícia Federal (PF). Argumenta, ainda, que contratou empresas terceirizadas e com especialização nesse tipo de resgate, e que todos os envolvidos estavam sendo escoltados e que, por isso, não estariam sob risco.

A União também foi processada, porque agentes da PF atuaram no resgate. O processo diz que esses agentes sabiam que eram civis despreparados e foram omissos ao permitirem que fizessem o transporte do armamento sem escolta adequada. O UOL apurou, à época, que a PF não conferiu o documento dos voluntários.

Portanto, pessoas estranhas tiveram acesso e ficaram a sós com as armas mesmo com o risco da operação. A Advocacia-Geral da União (AGU) nega que a União tenha responsabilidade e disse que já se apresentou nos autos, apontando que qualquer irregularidade é responsabilidade da Taurus.

“A União, que tinha o dever de proteger a área do terminal aeroviário evitando saques, não seria a responsável pelo transporte dos materiais ou armazenamento dos mesmos em outro local”, diz.

O grupo alega ainda que suas imagens foram veiculadas no ‘Fantástico’ de forma indevida. Em reportagem exibida pela TV Globo, todos eles foram identificados como agentes da Polícia Federal, por isso também pedem indenização.

“Constrangidos pelos prepostos da Taurus S/A, foram expostos a essa circunstância delicadíssima, e, na prática, organizaram toda a logística envolvendo o transporte das armas para fora do aeroporto, enquanto os funcionários da empresa Taurus S/A e agentes da Polícia Federal apenas assistiam”, diz o processo.

O processo pede a atuação do Ministério Público Federal no caso, por se tratar de um assunto de interesse público e social. Para os advogados, o resgate de armas por civis é um problema de segurança pública e nacional.

A ação aguarda manifestação do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre. Indenização requerida é de, no mínimo, 150 salários mínimos para cada um dos seis voluntários. Somadas e aplicadas correções, o valor é, ao todo, de R$ 1.270.800. A defesa dos voluntários disse que “o dano moral não é fácil de quantificar. É inestimável. Nós levamos em conta a forma que eles foram chamados e a forma que foram enganados”.

O grupo de voluntários surfistas atuava há cerca de dez dias em resgates de vítimas e animais por ter conhecimento em água e embarcações. A informação foi dada por Nicolas Vedovatto, um dos voluntários. A equipe reuniu barcos, apetrechos e até brinquedos para o resgate.

Eles foram abordados por um homem, identificado como Michel Rodrigues, pelo WhatsApp. Rodrigues disse que tinha recebido um pedido de socorro de uma pessoa que sabia da localização de cem crianças ilhadas. A localização não poderia ser exposta para não gerar uma espécie de engarrafamento de barcos. “Tudo sigiloso”, disse.

Suposto intermediador alega que também é vítima. Rodrigues disse que também foi convocado para auxiliar na busca de crianças e aponta um homem chamado Leonardo Godoy como o líder da operação. Godoy, que se apresentava como empresário nas redes sociais, disse que estava na linha de frente de diversos resgates no Estado. Segundo os voluntários, Godoy se colocou como chefe da operação de resgate e pediu barcos ao grupo.

“Eu fui coagido, todos nós fomos enganados. A gente participava daqueles grupos ali de resgate (…) Mas o sorriso dos meninos (voluntários) nos vídeos do aeroporto mostra que eles não foram forçados”, disse Michel Rodrigues, suposto intermediador.

As informações são do jornal Folha de S.Paulo.

O Sul

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