No aniversário de 253 da Capital, revisão completa 15 anos atrasada. Expectativa da prefeitura é vencer esse imbróglio até o fim do ano
A Capital dos gaúchos vai completar seus 253 anos nesta quarta-feira sem ver vencido um dos seus principais imbróglios há 15 anos: a revisão do plano diretor. O plano diretor de Porto Alegre deveria ter sido revisado em 2020, como prevê a lei. Cinco anos, uma pandemia e uma enchente histórica depois e o principal instrumento de desenvolvimento e organização da cidade segue esperando atualizações.
Se as promessas do prefeito Sebastião Melo (MDB) se concretizarem e o caminho previsto não sofrer curvas, o projeto de revisão será enviado à Câmara de Vereadores ainda este ano – de preferência até o final deste semestre. Assim, os vereadores devem se debruçar sobre o texto até o fim do ano, aprovando uma nova versão antes de 2026.
No entanto, com a complexidade do tema somado aos entraves judiciais e o embate polarizado presente no Legislativo, nada garante que a discussão não se prolongue para além do previsto. Um exemplo de como as coisas podem sair do planejado, é que Melo havia prometido vencer o tema ainda em seu primeiro mandato. Foi reeleito sem o ter feito, e agora corre para não entrar no segundo ano de governo com uma promessa antiga ainda pairando.
Um projeto “fatiado”
- Ainda sob a gestão do ex-prefeito Nelson Marchezan Jr. (PSDB), no final de 2019, a prefeitura iniciou as primeiras etapas no processo de revisão, por meio das chamadas “oficinas temáticas territoriais”. As discussões foram interrompidas, contudo, em 2020, em função da pandemia de Covid-19. Uma eleição e dois anos depois, o assunto só voltou à pauta em 2022, quando a Secretaria do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) anunciou o novo cronograma de trabalho.
- Com ele, uma novidade: o “fatiamento” do plano que gerou mudanças em duas regiões, Centro Histórico e 4º Distrito. Normalmente analisado e votado de forma conjunta, Melo apresentou duas propostas distintas de revisão para as duas regiões e, em novembro de 2021, os vereadores aprovaram a chamada “reabilitação” do Centro – bairro que ganhou atenção nas ações da prefeitura durante o primeiro mandato. Um ano depois, em agosto de 2022, o mesmo aconteceu com o 4º Distrito. Agora, resta o plano geral. Desde então, a revisão segue empacada.
O que a prefeitura propõe?
O plano que vem sendo desenvolvido pela prefeitura é lastreado em cinco objetivos centrais: qualificar os espaços públicos e potencializar a utilização do Guaíba; reduzir o tempo de deslocamento das pessoas dentro dos seus trajetos diários; reduzir o custo da moradia na Capital; adaptar a cidade para os efeitos das mudanças climáticas e zerar as emissões de efeito estufa; e transformar Porto Alegre em uma cidade robusta.
Essas transformações serão possíveis por meio de mudanças que tornem o plano diretor atual em menos “limitador”. “Hoje eu vejo o Plano Diretor como algo muito regulador, ficamos nos preocupando com o portão para dentro. A ideia é que tenha um plano que vá orientar o desenvolvimento da cidade”, explicou a secretária-adjunta da Smamus, Júlia Zardo.
Projetos que ampliem a utilização da Orla do Guaíba, a exemplo da última de revitalização obra, alternativas de modais hidroviários e a “miscigenação” de bairros, permitindo, por exemplo, a construção de comércio onde só é possível a construção de casas, são apenas alguns dos exemplos do que está por vir.
Agora, quando o assunto envolve áreas alagadas, proteção de cheias e a construção de uma cidade mais resiliente, as alternativas ainda não estão bem postas. Em viagem para Holanda no último mês, o titular da Smamus, Germano Bremm, foi buscar exemplos que pudessem ser importados para a Capital. Até porque Melo já afirmou que “não construir mais onde a água chegou não é o caminho, o caminho é ter um sistema robusto de proteção de cheias que dê segurança para quem já mora”. “A cidade cresce e a gente tem que produzir esse processo criando uma infraestrutura vertiginosa”, resumiu Bremm.
Entraves
Os embates judiciais, entretanto, podem ser uma pedra no sapato da prefeitura na celeridade desse processo. Isso porque a Justiça anulou, em fevereiro, a eleição dos representantes de entidades não governamentais para compor o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano Ambiental (CMDUA).
Uma das últimas etapas na finalização do projeto, o conselho tem caráter consultivo e fica responsável por formular e aprovar políticas e projetos sobre o desenvolvimento urbano e ambiental da cidade. No entanto, o juiz Gustavo Borsa Antonello, da 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital, acatou a ação popular movida por entidades do setor de planejamento urbano e identificou falhas no processo eleitoral. A chapa eleita tinha como presidente o secretário Germano Bremm. Nesta semana, a prefeitura recorreu da decisão.
O que a oposição espera?
Do outro lado do balcão, a oposição na Câmara de Porto Alegre tem a expectativa de que o governo respeite os ritos que o plano diretor exige. São elas: a criação de sete direções temáticas para debater os diferentes pontos do projeto que serão repartidos entre os vereadores respeitando os blocos partidários, a tramitação de no mínimo seis meses e, terminados os estudos, que haja a possibilidade de a população participar através de consultas e audiências públicas, por exemplo.
“Nós temos concordância que tem que ter atualização, mas não da forma açodada e fatiada como o governo fez na gestão anterior (em referência ao Centro Histórico e 4º Distrito). Ele (governo) possibilitou que os índices construtivos exagerassem e acabaram perdendo na Justiça. Por isso (o plano diretor) tem que ser debatido”, afirmou o vereador Aldacir Oliboni (PT). No momento, os sinais indicam que o governo não repetirá o modelo adotado anteriormente.
Isso não indica, contudo, que a oposição não esteja preparada para enfrentar algumas searas. Uma delas é a venda de prédios públicos que, na avaliação de Oliboni, poderia ser reutilizada para execução de serviços públicos, como creches – uma crise que a Capital enfrenta. Como a disputa no voto é mais difícil – a oposição é minoria na Câmara, com 12 dos 35 vereadores – a aposta é o diálogo. “Os vereadores (da base) têm que entender que uma questão não é ‘do vereador’, é da sociedade que está debatendo aquela questão”, afirmou.
Correio do Povo
Nenhum comentário:
Postar um comentário