Restaurante Leblon, também conhecido como Poletto, foi um dos principais atrativos do bairro
Quem chega ao centrinho do Belém Novo, no extremo-sul de Porto Alegre, percebe um clima diferente. O ambiente lembra o de uma cidade do interior, ou mesmo, do litoral. E, de fato, o bairro tem praia. Durante décadas, os balneários do Guaíba foram o grande atrativo do verão para os moradores da Capital.
No principal ponto da praia, bem junto à beira do Guaíba, um conjunto de ruínas guarda parte da história do Belém Novo. O local onde hoje restam pedaços de uma construção durante décadas abrigou o Restaurante Leblon, mais conhecido como Poletto, por ter sido administrado durante três décadas por Almiro Poletto.
A imponente construção contava com grandes janelas voltadas para a água. Durante a temporada, o local atraía grande movimento de público e o entorno ficava repleto de veículos. O projeto foi elaborado pelo engenheiro Armando Boni, italiano radicado em Porto Alegre, responsável por outros projetos importante na cidade, como a Concha Acústica do antigo Auditório Araújo Vianna, o Cemitério São Miguel e Almas e a Livraria do Globo.
O estabelecimento era o destaque de um Belém de intensa vida cultural, que contava com dois cinemas - Cine Arte e Cine Belgrano - restaurantes, bares e um Hotel Cassino.
Local de encontro dos jovens
Moradora do bairro, a funcionária pública aposentada Rejane Linck, 68, tem boas lembranças dos encontros com os colegas de escola no antigo Poletto.
“Eu estudava no Glicério Alves e nos períodos vagos a gente ia jantar ali. Lembro que a à la minuta era maravilhosa. Ali era o ponto de encontro da turminha daquela época. Nos verões, vinha mais gente de fora, de outros bairros.”
Rejane recorda com saudades da vida cultural intensa do bairro e dos carnavais dos clubes: o Belém Praia Clube, fundado em 1931, e a Sociedade dos Amigos de Belém Novo - Saben, fundada em 1978. Ela lamenta que o bairro não disponha mais de atrativos aos jovens.
A ocupação do Belém Novo como balneário teve declínio a partir da década de 1960, em funão de problemas de poluição. A imprensa denunciava a falta de infraestrutura e o abandono da área por parte do poder público.
Com o asfaltamento de RS-040 e a construção da Freeway, inaugurada em 1973, o caminho de Porto Alegre ao Litoral Norte ficou mais fácil e a população da Capital passou a dar menos atenção aos balneários. Após o fechamento, no fim dos anos 70, ainda houve tentativas de retomar o Leblon, mas sem o sucesso dos tempos de ouro.
Ainda hoje, balneário é alternativa no verão
O Belém Novo ainda é uma opção para quem busca praia sem sair de Porto Alegre. O bairro é procurado pelos moradores da cidade, principalmente durante o verão. Nos dias de calor, os espaços são disputados nas praças José Comunal, próximo à garagem da empresa de ônibus, e Almerindo Lima, e na Praia do Veludo.
As praças dispõe de banheiros públicos e churrasqueiras à sombra das árvores, que atraem grupos e famílias nos fins de semana de calor.
A qualidade da água do Guaiba é monitorada pelo Dmae nesses três pontos e em outros três no Lami. No levantamento mais recente, divulgado no dia 18 de janeiro, todos os pontos eram considerados próprios para banho.
Divino Ribeiro, 62 anos, mora no bairro desde os cinco anos de idade. Ainda hoje frequenta o mesmo ponto, junto às ruínas do antigo Poletto. Em uma dessas tardes quentes do janeiro porto alegrense, ele jogava o anzol na água do Guaíba enquanto as filhas e netos afugentavam o calorão em um banho de rio.
Divino recorda as épocas de ouro do bairro-balneário. Ele conta que o estabelecimento era frequentado por “quem tinha dinheiro.” Para os guris sem grana, como ele e os amigos, o imponente restaurante era fonte de renda.
“Eu lembro que quando eu era guri, eu vinha lavar carro aqui na frente do Poletto, eu e mais dois ou três guris. A gente cuidava, lavava os carros, e ganhava um troco. Vinha mais carro de gente granfina. Naquela época, quem tinha um Opalão ou um Maverick tinha dinheiro. Quem tinha um pouco menos tinha um Fuquinha”, recorda.
O primeiro bairro-balneário da Capital
O início da ocupação data da segunda metade do século XIX, com a mudança do local da Freguesia de Belém. Em 1876, foi elaborada, por engenheiros da intendência, uma planta urbanística, localizando o porto, a praça, a igreja, o cemitério e os primeiros lotes, formando um núcleo urbano inicial.
“Por alguns anos o povoado manteve sua estrutura urbana bastante limitada. Somente após a década de 1920, com o interesse imobiliário no local, houve uma expansão de sua estrutura por meio dos dois loteamentos balneários em questão. A partir da análise das datas dos projetos empreendidos para toda a zona sul de Porto Alegre, Belém Novo teria sido o primeiro arrabalde a receber um projeto com o conceito de balneário”, descreve a arquiteta e urbanista Clarissa Maroneze Garcia, na dissertação de mestrado apresentada em 2017 ao Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com o título “Ver o presente, revelar o passado e pensar o futuro: a evolução urbana do Bairro Belém Novo em Porto Alegre”.
Correio do Povo
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