Quatro pessoas morreram, incluindo o atirador, e mais nove ficaram feridas
Encerrada após mais de 10 horas de cerco policial, a ocorrência que resultou em pelo menos quatro pessoas mortas e outras nove feridas teve início na noite de terça-feira, no bairro Ouro Branco, em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos. De acordo com a Brigada Militar, inicialmente, uma guarnição foi acionada para atender a um chamado sobre desentendimento familiar, na rua Adolfo Jaeger.
O relato dava conta que Eugênio Crippa, de 74 anos, ligou para o 190 informando que o filho o impedia de sair de casa e também o havia agredido. Próximo às 22h40min, a primeira guarnição chegou ao local e entrou no imóvel, onde encontrou o idoso e a esposa, Cleris, de 70 anos. Também estavam ali um dos filhos do casal, Everton Luciano, de 49 anos, e a companheira Prescila de Castro Martins, de 41.
Ainda de acordo com a BM, em meio ao atendimento da ocorrência, o outro filho do casal de idosos surgiu de forma abrupta e abriu fogo contra policiais e familiares. Era ele o alvo da denúncia. O homem foi identificado como o motorista de caminhão Edson Fernando Crippa, de 45 anos.
Ali, o soldado Everton Kirsch Júnior, de 31 anos, morreu após ser atingido por um disparo na cabeça. O pai do atirador também foi morto no local. Na sequência, o suspeito teria alvejado o irmão, que estava caído na calçada, e depois retornado para o interior do imóvel.
A segunda guarnição da BM chegou ao local pouco depois, mas também foi recebida a tiros. Foi então que a sargento Joseane Muller, de 38 anos, foi baleada no ombro. Ela recebeu atendimento hospitalar e não corre risco de morrer.
Um trio de soldados também acabou sendo atingido. Rodrigo Weber Voltz, de 31 anos, foi baleado três vezes. O estado dele é crítico.
O soldado Voltz passa por protocolo de verificação de possível morte cerebral. A confirmação ou não do óbito se dará após 24 horas do início do processo.
Eduardo de Brida Geiger, de 32 anos, sofreu um disparo no pé e João Paulo Farias Oliveira, de 26, foi baleado na cabeça. Ele foi levado ainda consciente ao hospital, onde passou por cirurgia. O estado de saúde dele é considerado grave.
Também ficou ferido o guarda municipal Volmir de Souza, que prestava apoio aos militares. Ele foi atingido três vezes e passou por cirurgia. O quadro de saúde dele é estável.
O Batalhão de Operações Especiais (Bope) foi acionado às 23h25min, chegando ao local às 0h17min. Por volta das 0h31min, o comandante do Bope, tenente-coronel Felipe Costa Santos Rocha, foi atingido com um tiro de raspão. Outro integrante do Bope, o soldado Leonardo Valadão Alves, de 26 anos, foi baleado na cabeça, também de raspão. Ambos foram liberados após atendimento.
Próximo às 0h45min, o atirador derrubou dois drones da corporação que sobrevoavam a casa. Por conta dos tiros, o corpo do soldado Everton Kirsch só conseguiu ser retirado do local às 1h27min, junto a outro PM, que não teve ferimentos.
O comandante-geral da BM, Cláudio Feoli, destaca que ao longo da madrugada houve três tentativas de incursão na residência, mas todas foram repelidas por disparos do suspeito. O atirador também se recusava a dialogar com negociadores.
"A cada tentativa de aproximação, a BM era repelida por uma quantidade significativa de tiros. Tentamos a todo momento a conversa, mas não havia retorno ou respostas, apenas disparos. Fizemos a saturação da área e conseguimos avançar na primeira incursão, quando socorremos os PMs. Na segunda, fizemos a retirada do corpo do soldado Kirsch e na terceira, os familiares”, disse o comandante da BM.
A ocorrência foi encerrada por volta das 8h30min, quando um terceiro drone adentrou na casa e localizou o corpo do suspeito. Ele morreu após ter sido alvejado durante o tiroteio.
O irmão do atirador chegou a ser socorrido com vida, mas morreu no hospital. A mãe e a cunhada dele estão internadas em estado grave. As duas foram alvejadas na região do abdômen e passaram por cirurgia.
Atirador havia sido internado por esquizofrenia
De acordo com a Polícia Civil, o atirador e o pai sofriam de esquizofrenia. O suspeito somava quatro internações psiquiátricas e, apesar disso, ainda mantinha ativo o registro de CAC (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador). Ele também havia completado diversos cursos de atirador, conforme a irmã dele informou aos policiais.
Foram apreendidas quatro armas de fogo no local da ocorrência, sendo duas carabinas e duas pistolas. Nenhuma das armas era irregular. De acordo com o secretário da Segurança Pública, Sandro Caron, as pistolas tinham sido legalizadas pela Polícia Federal e pelo Exército Brasileiro.
“Ele tinha armas legalmente. Duas eram registradas, sendo uma no sistema Sigma, do Exército, e outra no Sinarm, da Polícia Federal. Esse homem teve que apresentar um laudo atestando que teria condições de portar uma arma, mas ele já teve quatro internações por esquizofrenia. Com esquizofrenia não é uma questão de se, mas de quando a tragédia vai acontecer”, disse Caron.
O chefe da Polícia Civil, delegado Fernando Sodré, destacou que uma investigação foi instaurada para descobrir como um homem com esquizofrenia manteve armas em casa. Ele também disse que os desentendimentos entre o atirador e o pai eram constantes, mas que não havia nenhuma ocorrência policial dos casos.
Ainda conforme Sodré, a investigação ainda vai determinar se o homem premeditou o crime. Isso porque Crippa tinha vasta munição, tendo disparado mais de 100 tiros. Outras centenas de balas foram encontradas intactas dentro do imóvel, além de uma reserva de água no quarto dele.
"Ele tinha no quarto uma reserva de garrafas com água e energético. Também havia diversas caixas de munição armazenadas. Não descartamos que ele tenha premeditado o ataque”, disse o chefe da PC.
Eugênio Crippa era motorista de cargas especiais, o que inclui o transporte de itens de valor e materiais de risco. A profissão garante condições para porte e posse de armas. O que ainda não se sabe é como ele conseguiu manter a autorização com diagnóstico de esquizofrenia e tendo sido internado por diversas vezes.
Crippa não tinha antecedentes criminais. Após uma rápida investigação, foi encontrado apenas um boletim de ocorrência por ameaça, mas que não gerou processo.
Rua coberta por cápsulas
A rua Adolfo Jaeger amanheceu coberta por cápsulas de diversos calibres. Vizinha do atirador, Adriana Cristina Trein, de 52 anos, relatou que o confronto foi semelhante ao cenário de uma guerra.
"Foi uma noite terrível, parecia uma guerra. O tiroteio foi muito intenso. Cheguei a pensar que fosse alguma ocorrência envolvendo um confronte de facções, porque o bairro fica próximo do Instituto Penal de Novo Hamburgo, onde na terça-feira havia ocorrido outro ataque a tiros. Me surpreendi quando soube que o atirador era um vizinho e que ele havia disparado contra familiares e policiais”, descreveu.
Morador do bairro Ouro Branco desde 1974, Fábio Mollon, de 50 anos, foi colega do pai do atirador quando jovem. Ele conta que, antes de se aposentar, o idoso trabalhava como motorista de ônibus. A vítima já havia relatado ao amigo que sofria maus-tratos.
“Ele me contava que as vezes o filho não o deixava sair de casa. Era uma relação bastante complicada. O homem subjulgava os pais.”
Eugênio Crippa estava desempregado há cerca de um ano. Desde então, ele morava com os pais. Um vizinho que não quis se identificar descreve que o atirador tinha comportamento excêntrico, o que gerava estranheza entre moradores do bairro.
"Eu decidi que, por causa dele, não falaria mais com a família que morava ali. Era um homem que tinha olhar estranho e jeito agressivo. Certa vez, uma ventania derrubou telhas da minha casa em frente ao portão dele. Fui gentilmente me oferecer para limpar o material que havia caído lá, mas não tive resposta. Ele apenas ficou me olhando, de forma estática, sem falar nada”, contou o vizinho.
Correio do Povo
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