Cidade ainda possui a maior parte das residências desabitadas e moradores que não pretendem mais voltar para casa
Família Garcia usa a comemoração do Dia dos Pais para celebrar a união que manteve todos juntos durante a enchenteUma das mais representativas datas do ano, o Dia dos Pais é, em todo o país, um momento de união familiar e de confraternização. Em Eldorado do Sul, as dificuldades vividas por quem ainda luta para recomeçar a vida após perder tudo para as enchentes de maio, não são empecilho para que a família Garcia mantenha, na união, um combustível para dar a volta por cima.
Acompanhado das cinco filhas, o marceneiro autônomo, João Salvador de Oliveira Garcia, autônomo, de 58 anos, fez questão de manter a tradição de assar o tradicional churrasco para celebrar o seu dia. Neste ano, a data comemorativa ganhou ainda mais importância, para a família que, mesmo no momento mais difícil já vive, se manteve junta.
Há dois meses, mais de 2,70 metros de água praticamente cobriam até o telhado da moradia, localizada na área Central da cidade. Segundo Garcia, esta união de todos foi fundamental para passar pelas adversidades. “Reunir a família, a gente reúne sempre. Festejar o dia dos pais não é um momento simbólico, é um momento real daquilo que a gente vive sempre. Mesmo na enchente estávamos juntos todos os dias. Quando saímos daqui, fomos para a casa da filha em Bom Retiro (localidade da cidade). Ficamos em 15 pessoas lá”, relembra.
Depois que a água baixou, em cerca de uma semana o marceneiro e a família já retornou à casa, para levantar tudo que havia sido perdido. Depois, foram mais de 15 dias de limpeza para que pudessem voltar a morar. No interior da moradia, praticamente tudo foi perdido. Garcia perdeu, também, móveis já prontos e materiais de trabalho. O mesmo ocorreu com a esposa, Eloísa Barcellos Garcia. Costureira, perdeu desde as linhas até as máquinas que utilizava para confeccionar roupas.
A brevidade com que a família retornou, porém, não se repete na vizinhança. “Muita gente não voltou ainda, outros foram embora e não voltam mais, tem também os que abandonaram a casa. Virou uma situação bem dramática”, resume Garcia.
Na casa para comemorar com o pai, a filha Ketlen destaca que a água nunca havia chegado até a residência. “Em novembro (do ano passado), entrou 50 centímetros. Nas outras enchentes que teve na cidade, este era um lugar que acolhia. Meu pai sempre ajudou a receber e distribuir doações. Nunca imaginamos que isso aconteceria conosco”, conta. “É algo que nunca vimos e que nunca mais queremos ver”, complementa o pai.
Mesmo com todas as dificuldades vividas, os relatos são feitos com doses de bom humor. “Mesmo quando estávamos fora de casa, sempre rimos e brincamos juntos. Escondido, alguém até pode ter chorado ou lamentado, mas, juntos, sempre mantivemos o bom humor”, ressalta Ketlen.
Na comemoração de Dia dos Pais, o patriarca tomou as rédeas para preparar o almoço de toda a família. “Os genros estão aqui, mas deixaram a churrasqueira comigo”, brinca. Pilchado como um bom assador gaúcho, em prosa, ele declara seu amor por Eldorado. “Amo minha cidade, nunca vi coisa igual. Desde 89 estamos vivendo neste local”.
Casas vazias pela cidade
Mesmo passados mais de dois meses, a situação é dramática por toda a cidade. Na rua Sete de Setembro, no bairro Cidade Verde, há presença de entulhos daqueles moradores que, há pouco, retornaram para suas casas. Há, também, de forma visível, muitas casas que ainda permanecem vazias.
Entre os moradores, a cuidadora Alessandra Pinheiro da Silveira, que praticamente perdeu sua casa em outro bairro da cidade, passou a residir com o marido e três filhos na casa da mãe. Ela também cuida de uma irmã, acamada.
Ela e sua família ficaram dois meses fora de casa e, há cerca de duas semanas, se instalaram na residência com a mãe. “Estamos se ajeitando ainda. Tive que pagar para dar uma limpada, mas nos fundos ainda não conseguimos limpa”, relata. “Também não conseguimos, ainda, todos os móveis.
Só tenho um fogão e uma geladeira, mas cama ainda não. Para dormir, estamos botando o colchão no chão”, completa.
A situação na vizinhança é semelhante. “O pessoal recém está voltando, mas são poucos. A maioria está dizendo que nem vai voltar. Muitas casas estão fechadas e vazias. As pessoas estão comprando casas em outros lugares. Eu também, se tivesse como sair, também iria. Ouvi as conversas de que indenizariam as pessoas, mas é difícil”, conta Alessandra.
Apesar de ter casa própria, a cuidadora conta que não tem como voltar. “Sofreu muitos danos no telhado e paredes estão rachadas. A vistoria aprovou, mas quando chove escorre água pelas paredes. Não tem como morar”, conclui.
Correio do Povo
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