Recebi um convite para uma Solenidade Militar alusiva ao Dia do Soldado. Nesse convite, o Patrono do Exército é citado como "Marechal-de-Campo" e o seu nome grafado como "Luís"...
1. Quanto ao posto na hierarquia militar, o Duque deveria ser declinado como Marechal-do-Exército (assim mesmo, "do-Exército"), o que corresponderia, hoje, ao de Marechal. No Exército Imperial, os oficiais-generais eram os brigadeiros (hoje, generais de brigada); os marechais-de-campo (generais de divisão); os tenentes-generais (generais de exército) e os marechais-do-exército (marechais).Possuo cópias de alguns "almanaks militares". O "Almanak Militar" de 1858, v.g., apresenta os cinco tenentes-generais de então, encabeçando a lista o Marquês de Caxias, seguido do Barão de Suruhy (que era seu tio) e os outros três, após o que se sucede a lista dos marechais-de-campo e a dos brigadeiros, tudo na ordem hierárquica.
Ao tempo do Império do Brasil erma seis os títulos nobiliárquicos, em ordem crescente das honorificências: barão; visconde (era o 'vice-conde'); conde; marquês e duque (não foi instituído o de arquiduque e, caso o fosse, não haveria ninguém mais apto a ser agraciado como tal, do que o nosso Patrono). Tais títulos não devem ser usados junto a outras titulações, patentes militares etc. Destarte, por exemplo, é errônea a denominação de "Edifício Marechal Duque de Caxias".
2. Luiz ou Luís?
Já dizia o Barão de Itararé: "O Português é uma língua difícil. Tanto que calça é uma coisa que se veste e bota é uma coisa que se calça"...
Em 2003, quando do bicentenário de nascimento de Caxias, todas as dúvidas a respeito dessa polêmica foram dirimidas. O nome LUIZ deveria SEMPRE assim ser grafado e não "Luís" (com "s" e acentuado). Posso afirmar isso com convicção, eis que eu era o chefe do Centro de Documentação do Exército (CDocEx) e todos nós da área cultural estávamos envolvidos com essa questão. Até porque, em janeiro de 2003, no "Livro de Aço" (existente no Panteão da Pátria, em Brasília), que relaciona os heróis e heroínas nacionais, foi introduzido o nome de Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, de forma errônea, em vista da grafia de Luís. Tal procedimento foi equivocado, repito, em face de algumas razões, abaixo alistadas:
a. O coronel português Luiz Alves de Freitas Bello era o avô materno do futuro Duque, cujo pai, o então tenente Francisco de Lima e Silva (futuro marechal, senador e regente do Império) quis homenagear o seu sogro, antes citado, o coronel Luiz (com "Z") Alves.
A propósito, creio não haver documento mais completo acerca da genealogia de Caxias do que o competente e robusto trabalho publicado em "A Defesa Nacional", de agosto de 1953, de título "A Família de Caxias", de autoria do Dr. Eugênio Vilhena de Morais, então Diretor do Arquivo Nacional;
b. A imensa maioria de biógrafos e apologistas de Caxias escreve o seu augusto nome como Luiz (com "z"). Dentre outros, poderiam ser citados o padre Joaquim Pinto de Campos; Affonso de Carvalho; Eugênio Vilhena de Morais; Flamarion Barreto Lima; Cláudio Moreira Bento; Adriana Barreto de Souza; Osorio Santana Figueiredo e Luiz Ernani Caminha Giorgis, autor da originalíssima obra, "O Duque de Caxias Dia a Dia";
c. O Batistério (também chamado de Assento ou Certidão de Batismo), que, à época, era o principal documento de identidade dos cidadãos da Colônia. A revista "Nação Armada", de número 53, de abril de 1944, publicou importante matéria, de título "O Batistério do Duque de Caxias", resgatando a Certidão de Batismo do Duque, a qual "durante muito tempo esteve em destino ignorado". Era uma transcrição da "Revista Genealógica Brasileira", sob a direção do coronel Salvador de Maya. Eis um breve excerto do dito Batistério, preservando-se a grafia original: "LUIZ - Aos doze dias do mez de setembro de mil oitocentos e três na freguezia de Inhomerim de licença do Parocho desta, baptisou e pôs os santos Oleos o Padre Agostinho Lopes de Laet a Luiz, innocente filho legítimo do temente Francisco de Lima e Silva............";
d. O Testamento de Caxias. É um documento histórico e assaz comovente, exarado no Rio de Janeiro, em 23 de abril de 1874, muito difundido em nossa historiografia. Assim é o seu início: " Em nome de Deus, Amém. Eu, Luiz Alves de Lima, Duque de Caxias, achando-me com saúde e meu perfeito juízo, ordeno o meu Testamento, etc". Observa-se que Luiz é escrito com "z" e o Duque não acrescenta o "e Silva", de seu nome completo;
e. Na Solenidade de Transladação (25 de agosto de 1949) de seus restos mortais e da duquesa parta o Pantheon Militar, no Rio de Janeiro. Em todos os documentos produzidos, como o "Auto de Exumação dos Despojos", o nome de Caxias é redigido como Luiz Alves de Lima e Silva (ver "Revista Militar Brasileira", de 25 de agosto de 1949, Edição Especial Comemorativa da Transladação dos Restos Mortais do Duque de Caxias para o Pantheon Militar);
f. Na instituição do Patronato do Exército, conforme o Decreto n° 51.429, de 13 de março de 1962, o nome Luiz, aparece com "z". Idem, ibidem, no Aviso n° 366, de 11 de agosto de 1925, quando do governo de Arthur Bernardes, que proclamou a data genetlíaca de Caxias, como a do "Dia do Soldado". Urge, outrossim, não esquecer da anterior "Festa de Caxias", instituída pelo ministro da Guerra, general Setembrino de Carvalho, mediante o Aviso n°433, de 25 de agosto de 1923;
g. A fim de, em definitivo, dirimir-se a controvérsia a respeito da grafia Luiz ou Luís, o saudoso general Antônio Gabriel Esper, da Diretoria de Assuntos Culturais, no ano do bicentenário de nascimento de Caxias, procedeu a uma consulta ao Arquivo Nacional, respondida em papel timbrado deste Arquivo, em 3 de julho de 2003, tendo sido afirmado que "em todos os documentos o nome do Duque de Caxias encontra-se grafado com "z", ou seja, Luiz Alves de Lima e Silva". Acrescente-se que esse procedimento foi dado a público para todo o Exército. Entretanto, desafortunadamente, ainda há os que não concordam com isso, máxime por ter sido Caxias alçado a "Herói Nacional", em 2003, e o seu nome constar no Panteão da Pátria, no Distrito Federal, como Luís Alves de Lima e Silva...
Conclusão
Muitos continuam a grafar "Luís" (com "s" e acentuado), inclusive no âmbito do Exército Brasileiro, afirmando que tudo deve ser "modernizado", podendo-se adaptar nomes como Luiz à nova ortografia; aos que brandem este esquipático argumento, eu diria apenas: sem comentários... Há quem também diga que essa discussão é irrelevante, porquanto o mais importante são as homenagens tributadas ao Patrono do Exército. Discordo, peremptoriamente, eis que se trata de um vulto nacional e o seu nome, posto na hierarquia militar e demais registros devem primar pala precisão histórica e acadêmica!
Entretanto, se ainda pairar alguma dúvida quanto ao anteriormente expendido, sugeriria que fosse feita uma consulta ao Instituto de Geografia e História Militar do Brasil (IGHMB), do qual me orgulho em ser sócio efetivo, remido, e que é o "Órgão Consultivo Oficial de Geografia Militar e História Militar" na conformidade do Decreto n°27.512, de 28 de novembro de 1949.
Coronel Veterano de Infantaria e Estado-Maior Manoel Soriano Neto - Historiador Militar.
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