sábado, 27 de julho de 2024

“Nova ilha” de Porto Alegre já mede ao menos 30 campos de futebol

 Praias próprias chamam a atenção de formação natural ao sul da ilha das Balseiras

Formação natural está a cerca de 2,5 quilômetros a oeste do Estádio Beira-Rio 

Há algo de diferente no horizonte de Porto Alegre, formado de areia, restos de galhos e, infelizmente neste caso, lixo. A nova ilha surgida no sul da ilha das Balseiras, distante cerca de 2,5 quilômetros a oeste do Estádio Beira-Rio, pode inclusive ser vista de lugares mais altos da cidade e, inclusive, visitada de lancha, com saída do Cais Mauá, no Centro Histórico, todos os dias. O serviço é oferecido pela empresa Dilancha, da Capital, atuante há quatro anos com passeios turísticos pelo Guaíba, e cujo comandante é Irineu Pederiva.

“É algo totalmente diferente que aconteceu por aqui. Vejo que há uma grande expectativa das pessoas, em razão da novidade”, comentou Pederiva. O passeio, de cerca de meia hora por trecho, com parada de cerca de uma hora na ilha, além de visitas a outras, é um convite à população conhecer a Capital por dentro do curso d’água, de onde a vista da área urbana é de tirar o fôlego. Mais informações podem ser obtidas no Instagram @dilanchaoficial ou pelo WhatsApp (51) 98015-8116.

Mas a história da nova ilha, em tese uma formação de terra separada da margem leste das Balseiras por poucos metros de água rasa, e ainda sem denominação, denota também uma reflexão. Afinal, não fossem as devastadoras enchentes de maio, ela provavelmente não existiria. “Esse montante começou a se formar ainda na enchente de setembro, depois foi crescendo, e agora está deste tamanho”, comenta o engenheiro civil Leomar Nestor Teichmann, diretor-geral adjunto do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) na gestão do prefeito Nelson Marchezan Jr., entre 2019 e 2020.

Teichmann acompanhou a reportagem a um passeio à este novo pedaço de terra, com tamanho estimado por ele de 200 mil metros quadrados, ou cerca de 30 campos de futebol. O Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) afirma que a área é maior, de 70 a 80 hectares, de acordo com medições feitas por satélite.


Independentemente de sua extensão, para o professor do programa de Pós-Graduação em Ecologia e Evolução da Biodiversidade da Escola de Ciências da Saúde e da Vida da PUCRS, Nelson Ferreira Fontoura, a ilha foi formada a partir da descida de sedimentos maiores pelo sistema do delta do Jacuí, trazidas pelo excesso de água. “Este volume maior depositou esta areia ao sul do delta. É um fenômeno natural. Quando há um fluxo de água normal, ocorre um deposição maior de sedimentos finos, e a areia que está ali é rica em lama. Quando há uma enxurrada com a velocidade de corrente muito grande, acaba arrastando ela”, comentou ele.

Como a área ao sul das Balseiras é rasa, com cerca de um metro de profundidade no ponto mais fundo, estes grânulos acumulam nesta área, onde não existe movimentação de água. O canal de navegação é entre a orla do Guaíba e a nova ilha, ou seja, barcos maiores não passam onde houve este acúmulo. “Não vejo necessidade de qualquer tipo de intervenção em relação às embarcações”, comentou Teichmann. Procurada, a Portos RS confirmou que não há mudanças na navegação no local.

Uma bola, uma boneca e embalagens plásticas abandonados mostram que outros humanos já deixaram suas marcas na ilha, que, conforme o engenheiro, provavelmente irá se conectar com a vizinha em algum tempo, mas ainda não se sabe quanto, a depender da vontade da natureza. Este novo pedacinho de Porto Alegre já conta inclusive com praias próprias, onde a água quebra na areia em grande medida instável, onde pisar e afundar os pés não é incomum.

Em outro ponto, quero-queros voam e pousam, buscando alimento e ajudando a semear o local com suas fezes. É uma pista indicando que, no futuro, deverá acontecer o mesmo que, no passado, houve com as demais ilhas de Porto Alegre, formadas também por areia acumulada ao longo dos anos, e cuja biodiversidade hoje impressiona. “Ela vai ser colonizada com vegetação ao longo do tempo. Se se mantém separada ou se conecta com as Balseiras, depende muito da questão de circulação de volume de água e deposição de novos sedimentos. Quem sabe, no futuro, em que a qualidade da água do sistema Jacuí-Guaíba será adequada, este local possa ser apropriado à balneabilidade”, comenta Fontoura. “É um processo vivo. Precisamos deixar a natureza operar”, complementa Teichmann.


Correio do Povo

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