Acordo com o governo prevê retomada de mais horas para formação geral, mas com flexibilidade para integração com cursos técnicos
Reforma tenta corrigir críticas ao modelo definido em 2017A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira, o texto-base do projeto de lei que altera a reforma do ensino médio. O texto foi aprovado em votação simbólica (quando não há registro individual de voto), após acordo entre o relator da proposta, deputado Mendonça Filho (União-PE), e o governo a respeito da carga horária mínima para a formação geral básica. Depois de aprovados os destaques, o projeto deverá seguir para o Senado.
A reforma do ensino médio foi sancionada em 2017 na gestão Michel Temer (MDB). Esse novo formato flexibilizou o currículo da etapa, com a previsão de mais disciplinas optativas e oferta da educação técnica e profissional. O ensino médio tem alta evasão e é um dos principais gargalos do ensino básico do País. A ideia era de que a reforma tornasse a etapa menos engessada, mais atrativa para o jovem e também conectada com as demandas do mercado.
Nos últimos anos, porém, estudantes e especialistas apontaram falhas na implementação do modelo e reivindicaram mudanças - parte pediu até a revogação - ao longo do ano passado. Diante da pressão, a gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu fazer uma consulta pública e propor mudanças no formato ao Legislativo.
A tramitação da mudança, porém, havia travado no Congresso no ano passado. Nos últimos dias, o principal entrave entre o governo e o relator da proposta era a carga horária da formação básica (as disciplinas obrigatórias comuns, como Matemática, Português, Química e Geografia). Na proposta original do ministro da Educação, Camilo Santana (PT), a carga mínima da formação básica seria de 2,4 mil horas, mas secretários de educação apontaram que isso poderia inviabilizar a oferta de cursos técnicos mais longos, como na área de saúde, e pediram mudanças.
A negociação entre Camilo e Mendonça Filho, ex-ministro da Educação da gestão Temer, teve episódios de tensão nesta semana, mas houve acordo. Especialistas e gestores elogiaram a chegada do consenso diante da urgência de planejar o próximo ano letivo e a implementação das mudanças.
Carga horária
Nos casos em que houver ensino médio junto do curso técnico, a formação básica poderá ser menor, com um mínimo de 2,1 mil horas, das quais 300 poderão ser usadas como uma articulação entre a base curricular do ensino médio e a formação técnica profissional, caso as redes achem necessário. O modelo foi proposto por emendas acatadas pelo deputado.
Na prática, isso pode reduzir a carga horária mínima da formação básica para 1,8 mil horas, de forma a abrir espaço para a formação técnica. A redação permite também que caso a parte técnica demande menos horas de ensino, a formação geral básica nesses cursos poderá aumentar.
A parte flexível do currículo do ensino médio - que pode ser de aprofundamento de estudos ou de curso técnico - volta a ter o nome de "itinerários formativos”. O MEC, na gestão Lula, havia trocado pelo termo “percursos de Aprofundamento e Integração de Estudos”.
O relator fixou limite mínimo de 600 horas para esses itinerários, que poderão ser ofertados nas quatro áreas do conhecimento (Linguagens; Ciências Sociais Aplicadas; Ciências da Natureza; e Matemática) ou na educação profissional e técnica.
Todas as escolas deverão oferecer aprofundamento integral das quatro áreas do conhecimento, que poderão ser organizadas em pelo menos dois itinerários, de modo que as redes possam articular esses conteúdos. Por exemplo: itinerário Ciências da Natureza e Matemática; Linguagens e Ciências Sociais Aplicadas. A lei aprovada diz ainda que o MEC deverá elaborar diretrizes para os itinerários formativos.
A lei determina que a União deverá estabelecer padrões de desempenho esperados no ensino médio para que sejam utilizados como referência para as avaliações, que também são usadas como seleção para acesso ao ensino superior, como o Exame Nacional do Ensino Médio (embora o texto não cite explicitamente o Enem). Essas avaliações nacionais devem levar em conta o conteúdo da Base Nacional Comum Curricular, ensinado na formação geral básica, e da diretriz construída pelo MEC para os itinerários formativos.
O novo texto não acata a proposta do governo de tornar obrigatória a oferta de espanhol. O relatório determina que os sistemas de ensino podem ofertar outras línguas além do inglês, optando “preferencialmente” pelo espanhol.
Outro ponto que gerou controvérsia entre alguns parlamentares foi o fato de o relator incluir na lei que profissionais com notório saber reconhecido possam dar aulas de áreas relacionadas a sua experiência na educação técnica e profissional. Após resistência de parte dos deputados, o deputado resolveu excluir o trecho que autorizava a medida.Atualmente a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) já prevê a possibilidade de uso de notório saber nesses casos, o que continua mantido.
Andressa Pellanda, coordenadora da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, apontou avanço no tamanho da carga horária da formação básica, mas também criticou pontos do PL nas redes sociais. Entre as ressalvas, ela diz que a proposta é “reducionista sobre formação profissional, em carga horária e em possibilitar voluntarismos em estágios, e itinerários frágeis, etc”. Ex-diretora do Banco Mundial e especialista em educação, Claudia Costin afirmou que “baixar para 1,8 mil horas de formação geral (no ensino técnico) vai ao encontro do que outros países fazem”. Costin preside atualmente o Instituto Singularidades.
Estadão Conteúdo e Correio do Povo
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