domingo, 8 de outubro de 2023

PDT abre mão de cargo na Seduc após saída de Paulo Burmann

 Romildo Bolzan Júnior esteve com ex-diretor em Santa Maria e reforçou que, no atual cenário, partido não deve indicar reposição

Burmann e Romildo estiveram juntos em reunião-almoço do PDT em Santa Maria 

Após o anúncio da saída de Paulo Afonso Burmann do cargo de diretor geral da Secretaria de Educação do Estado, o presidente estadual do PDT, Romildo Bolzan Júnior, encontrou-se nesta sexta-feira com o ex-reitor da UFSM, em Santa Maria, em atividade da executiva do município, que integra uma caravana por cidades da região central do Estado. Em almoço na cidade, além da preparação do partido para as eleições de 2024, a saída da Seduc também esteve à mesa.

Embora o partido siga na base do governo de Eduardo Leite (PSDB) e que a ideia de deixar o cargo tenha partido de Burmann, Romildo afirma que a sigla endossa a decisão. O presidente diz que não houve um retorno do Executivo sobre alteração, mas caso o governo sugira manter o posto com o PDT ele será declinado. “Nesse cenário de esvaziamento o PDT não vai fazer avançar”, disse, condicionando uma mudança de visão às alterações sugeridas por Burmann, em carta que elenca suas divergências.

Romildo esteve na Casa Civil, na última terça-feira, junto com a bancada do partido na Assembleia Legislativa, e na ocasião, entre outros temas, tratou sobre a decisão de Paulo Burmann. “Era uma situação que já vinha sendo tratada. O partido deu carta branca e comunicamos na reunião.” O presidente estadual da sigla, assim como Burmann, entende que o ponto da educação, principal bandeira histórica do partido, está desalinhado com o governo.

Em 2022, o PDT decidiu apoiar Leite no segundo turno, colocando como condições para isso a maior atenção à educação e a não privatização do Banrisul. O partido segue com outros cargos no governo, como o titular da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Profissional, Gilmar Sossella, e o diretor-presidente da Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social (FGTAS), José Scorsatto, presente na ativade em Santa Maria.

Burmann foi empossado no começo de fevereiro e, desde abril, afirma tratar do assunto com o partido. Ele diz que pretendia deixar o cargo na metade do ano, mas com o PDT passando por mudança de comando, aguardou a posse de Romildo. Para Burmann, houve desconsideração do governo com o partido. “Não merecia esse tratamento. A principal bandeira do partido é a educação e ela foi esvaziada”, afirmou, revelando que se sentia “isolado” no cargo.

Embora ainda não tenha sido publicada no Diário Oficial do Estado sua exoneração, o agora ex-diretor da Seduc, via-se “sem função” no cargo, lamentando não ter mais espaço para contribuir. “Fizemos bem o trabalho de atendimento das demandas. Mas para isso não era necessário um diretor geral.”

12 pontos divergentes

Em carta, datada do dia 28 de setembro, mas publicada nesta quinta-feira em suas redes sociais, foram elencados 12 pontos de divergência, embasando sua decisão para pedir demissão. Além do esvaziamento da função, ele cita a incompatibilidade nas políticas adotadas “frente a ideia de uma educação verdadeiramente emancipadora e cidadã”, e a falta de infraestrutura.

Romildo destacou divergências “principalmente nas questões pedagógicas”. Burmann, por exemplo, defende a necessidade do ensino em tempo integral desde o Fundamental, enquanto o governo vem implementando mais vagas no Ensino Médio. “A frustração vem em nome das crianças e jovens que estão desassistidas pelo sistema”, afirma o ex-diretor.

Procurada, a Seduc respondeu através da assessoria de comunicação da pasta. “A secretária Raquel Teixeira foi informada pelo diretor de sua saída na terça-feira, dia 3/10. Ela lamenta o fato, tendo em vista o perfil qualificado do Professor Paulo Burmann, e informa que não há definição sobre um novo nome”, diz a nota.

Paulo Afonso Burmann é o presidente do PDT, partido no qual está filiado desde 1982, no município de Santa Maria. Seu nome é o mais cotado da sigla para a disputa da eleição para o cargo de prefeito. Ex-reitor da UFSM de 2013 a 2021, ele é o segundo suplente de deputado federal da sigla, tendo feito mais de 22 mil votos nas eleições do ano passado.

Leia a carta na íntegra

Porto Alegre, 28 de Setembro de 2023.

Indicado que fui pelo Partido Democrático Trabalhista, em janeiro do corrente ano para atuar pelo partido e seus princípios na nobre área da educação, pilar do trabalhismo de Getúlio Vargas, João Goulart, Alberto Pasqualini, Darcy Ribeiro, Alceu Collares, Brizola e de tantos outros expoentes e fundantes do trabalhismo brasileiro moderno, informo que pela coerência que tem orientado minhas ações políticas e pelas razões a seguir solicitei meu desligamento da função que ocupo na Direção Geral (DG) da Secretaria de Estado da Educação (SEDUC):

1. A DG é uma função que foi esvaziada e o cargo não conta com qualquer assessoria para o desenvolvimento da atividade e não permitiu a discussão e implementação dos princípios compreendidos como basilares para uma educação trabalhista frente ao liberalismo e as necessidades reais da população que depende da educação pública;
2. Incompatibilidade nas políticas adotadas frente a ideia de uma educação verdadeiramente emancipadora e cidadã a partir do modelo dos CIEPS com retomada da educação integral para o ensino fundamental, além da discordância com projeto das escolas cívico-militares;
3. A falta de um novo modelo de contratação do serviço de merenda escolar, para atender a milhares de crianças que também dependem da alimentação para melhor aprender;
4. Os Problemas vividos na educação no campo, particularmente o do transporte escolar. Há vários municípios no RS dependendo apenas de remuneração justa para que o município transporte os estudantes das escolas estaduais da zona rural; algumas escolas do campo, indígenas e quilombolas têm funcionado em condições precárias e as soluções se arrastam de maneira incompreensível;
5. A urgência na valorização da carreira dos profissionais da educação, que passa por profunda discussão sobre a federalização do sistema da educação pública como um todo e a federalização da carreira; Não haverá educação pública de qualidade sem investimento público, também qualificado, o que nunca poderá ser tratado como gasto ou algo “caro” – “Cara mesmo é a ignorância do povo brasileiro”;
6. Há um passivo de infraestrutura que se acumula há mais de 8 anos, agravados por entraves técnicos e burocráticos;
7. Há um passivo preocupante no PPCI das edificações escolares que não vem recebendo a devida atenção;
8. Quase 2.000 escolas sem quadra esportiva e/ou salão de eventos/área de recreação na forma de pavilhão coberto/fechado; programa Escola Aberta está suspenso e sem definição de futuro;
9. Programa “Escola melhor, sociedade melhor” precisa de maior articulação política e incentivo à comunidade;
10. Há um grande volume de emendas parlamentares disponíveis, inclusive de exercícios anteriores, ainda aguardando execução;
11. Preocupa o elevado volume de recursos empenhados em consultorias que poderiam ser realizadas, quando necessárias, junto às instituições gaúchas capacitadas e que conhecem a realidade gaúcha;
12. Apesar dessas dificuldades, procurei fazer o que esteve ao meu alcance e além, colocando, sempre que possível, minha experiência de duas décadas na gestão pública da educação e com grandes equipes, a serviço da SEDUC. Tratei a equipe da SEDUC e a todos aqueles que me procuraram com urbanidade, cordialidade, respeito e atenção; sempre lhes ofereci apoio e respostas, algumas delas truncadas pela burocracia que domina a tomada de decisões e compromete a agilidade necessária.

Portanto, entendo que é o momento de seguir outros caminhos e minha luta pela educação pública em outras frentes. Ressalto que continuarei à disposição e militando pelos ideais do Partido Democrático Trabalhista, na expectativa de muito melhores dias na educação pública do Rio Grande do Sul e do Brasil. Também, estarei dedicado ao fortalecimento e à retomada do protagonismo trabalhista em Santa Maria e na região central do RS, onde há um grande espaço para crescimento.Como trabalhista convicto e com o currículo que construí nestes anos, me julgo capaz de alavancar a retomada dos espaços perdidos pelo PDT.

Agradeço pela oportunidade de ter contribuído para com a educação do Rio Grande do Sul, ainda que nos limites impostos para a Direção Geral.

Atenciosamente,
Paulo Afonso Burmann

Correio do Povo

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