Hoje a vida é movida em tweets de 140 caracteres
Guilherme Buamhardt
Eu era menino, tinha seis anos de idade, e lembro muito bem de uma das minhas avós falando: "Hoje à noite ficaremos em casa, não vamos sair, porque hoje tem a propaganda eleitoral do Brizola". O ano era 1989. E este que vos escreve, ainda moleque, se posicionou ao lado da vó para assistir o velho caudilho desfilar suas ideias (algumas interessantes, outras tantas nem um pouco) sobre os problemas e as soluções do país.
O bloco, para a maior parte dos postulantes, era de uma hora. E era exclusivo do candidato, não compartilhado como é hoje. Ou seja, todos aqueles que tinham este latifúndio precisavam ser bons de lábia, ter discurso, trazer ideias. Falavam, falavam, falavam. E, claro, quem tinha mais dinheiro conseguia produzir programas melhores, com uma edição mais caprichada. Não havia celulares. Não havia equipamentos de alta definição. Mas para a época, alguns beiravam um acabamento digno de novela de horário nobre. A outros restava berrar, em poucos segundos, "meu nome é Enéias!", uma figura que ficou marcada mais pelo bordão do que pelas ideias (algumas delas interessantes).
Hoje a vida é movida em tweets de 140 caracteres. Qualquer celular tira fotos, filma, edita e grava áudios. Em milésimos de segundos um tropeço de um candidato cai na rede, viraliza, viaja o mundo. No lugar de programas intermináveis de uma hora, neste segundo turno cada candidato tinha cinco minutos para apresentar algo (ou tentar alvejar o adversário). Ganharam importância os spots, peças de trinta segundos ou um minuto, veiculadas dentro das caixas comerciais. Para os marqueteiros, é isso que faz a diferença.
Os tempos são outros até para jogar sujo. Antigamente havia os panfletos apócrifos, jogados nas ruas e praças das cidades, durante a madrugada, sem assinatura, sem autoria. E, muitas vezes, sem a verdade também. O panfleto apócrifo hoje viaja pela rede de dados, com a velocidade do 5G.
De lá para cá tentamos aprimorar o sistema. Melhoramos em alguns pontos, pioramos em outros tantos. No lugar de estimular o eleitor a buscar informações fidedignas ou ao menos desconfiar de algo que chega pelo WhatsApp, a Justiça Eleitoral e algumas agências de checagem acharam que teriam condições e capacidade de frear mentiras na rede. Talvez uma grande demonstração de soberba.
Se antigamente já era impossível descobrir a autoria de um manifesto atirado pela porta de uma Kombi em movimento, o que fez com que autoridades brasileiras pensassem ser possível filtrar milhões e milhões de informações geradas a cada minuto em todo o Brasil? Autossuficiência? Ou descolamento da realidade?
Não se trata de dar carta branca à mentira, mas ver no eleitor alguém apto a fazer escolhas, uma pessoa capaz de estabelecer seus próprios filtros. E, o mais importante, aprender com seus erros e acertos.
Amanhã encontraremos as urnas em uma das eleições mais tensas da história brasileira. A decisão sobre quem vai governar o país e os estados nos quais há segundo turno é exclusiva da maioria. Se cabe uma sugestão para as próximas é a seguinte: deixar uma certa dose de arrogância de lado, e não ver em quem já vota há anos um grau excessivo de inépcia. Somente adultos votam - ou jovens na fase final da adolescência. A informação ganhou em produtividade e velocidade. E todos têm acesso. Que no próximo pleito o protagonista seja o eleitor antes de mais nada, logo depois os candidatos e, somente no final, aqueles que neste ano tentaram incorporar o papel daquele árbitro de futebol que se achava mais importante do que a final do campeonato.
Correio do Povo
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