domingo, 28 de agosto de 2022

Jogos infantis assustadores merecem atenção

 

Huggy Wuggy 

Nem sempre o brinquedo é divertimento. Quando causa medo, tem conteúdo de extrema violência e sem o olhar do adulto, pode ser muito prejudicial. E boa parte desse perigo se encontra a um download de distância


Por Maria José Vasconcelos e Bárbara Niedermeyer


O sorriso é largo, mas os dentes são de navalha. A animação é infantil, mas o conteúdo, nem um pouco lúdico. A ação atrai, mas os movimentos são em direção à morte. Esses são alguns jogos, games virtuais e personagens que rondam o atual universo de brincadeiras, e que se materializam em bonecos e desenhos para habitar o lazer de crianças. Porém, um olhar mais atento de educadores e pais permite uma visão mais crítica e ações mais orientadas, para que a Internet e as tecnologias digitais sejam usadas de modo mais saudável. 

Uma das febres do momento, os Huggy Wuggy, já saíram das telas de computadores e celulares e ganharam as ruas, em coloridos bonecos de pano. No Centro de Porto Alegre, as pelúcias de tamanhos e preços variados, entre R$ 30,00 e R$ 60,00, parecem inofensivas. No entanto, o brinquedo se associa ao jogo de terror Poppy Playtime, com desafios mortais. Neste assustador game de sobrevivência, os jogadores devem controlar e guiar um ex-funcionário da fábrica Playtime Co. A aventura acontece numa indústria abandonada de brinquedos, onde os participantes precisam resolver quebra-cabeças, enquanto escapam de perigos, um deles, o Huggy Wuggy. O personagem que tem feito sucesso é o primeiro inimigo encontrado no capítulo 1 do jogo e persegue o jogador no prédio. Apesar de propagar divertimento, a classificação indicada varia, de 12 a 14 anos, nas plataformas disponíveis. Na App Store, loja de aplicativos do sistema iOS, o capítulo 1 é pago e se encontra na 1ª posição da categoria “Puzzles”. Na Play Store, loja de aplicativos do sistema Android, também tem custo e na Steam, loja de aplicativo para computador, o capítulo 1 é gratuito.

Mesmo com indicativo para o público acima de 12 anos, muitas crianças, bem abaixo desta idade, conhecem ou brincam com o jogo. Numa ONG que atende crianças e jovens em turno inverso ao escolar, em Venâncio Aires, o contato com o Poppy Playtime surpreendeu as educadoras, junto a crianças entre 6 e 8 anos. Como o jogo tem sido muito difundido em plataformas de vídeo, como YouTube e TikTok, chega com facilidade ao público infantil. Os bonecos coloridos e os sons chamam a atenção para as telas, mas o medo persegue o cotidiano dos pequenos. Na Capital, uma mãe relatou que percebeu os riscos do jogo, ao ver o filho, de 6 anos, assistir a vídeos que simulavam jogadas com muita violência e sustos. E a trilha sonora acompanha, com versos como “abraçar até a morte” e “dar o último suspiro”. Pelo mundo, o brinquedo, de grandes braços e sorriso assustador, gera cuidados. Na Espanha, foram proibidos em algumas escolas e, no Reino Unido, a polícia fez comunicado sobre a inadequação para crianças. No Brasil, o assunto ainda é pouco discutido.

Além do Poppy Playtime, outros jogos de violência e terror muito populares são o “Free Fire” (fogo livre), em que soldados atiram em qualquer pessoa e, para sobreviver, os jogadores precisam eliminar os oponentes. Nesta linha, há os jogos “Five Nights at Freddy's”, com os três primeiros games, dos nove da franquia, concentrados em um segurança noturno numa pizzaria (e casa de atração de terror, no 3º jogo). Na brincadeira, o jogador precisa sobreviver, fugindo de robôs possuídos por espíritos de crianças, que foram mortas por um assassino em série. É pago e para público a partir de 12 anos.

Curiosidade e medo

O universo dos contos de fadas, lendas, histórias de ficção, brinquedos e brincadeiras ao público infantojuvenil é vasto. É um campo que alimenta trabalhos, como em literatura, teatro ou Educação Física, pois possibilitam expressão corporal, imaginação e mensagens implícitas, que podem ser mais bem exploradas pelos adultos. A assessora pedagógica Naime Pigatto, do Sindicato do Ensino Privado do RS (Sinepe), explica que medo, curiosidade e ansiedade são elementos presentes em leitura, exploração ou participação em brincadeira ou jogo. 

Nos últimos anos, Naime diz que se percebem games com acentuado incentivo à violência, mutilações e manipulações. Por isso, avalia que, “cada vez mais, é necessário ler as instruções dos jogos, conhecer o objetivo de novas brincadeiras e o conteúdo dos livros voltados à população infanto-juvenil. Não é tarefa fácil, mas precisamos aprender a ler sintomas, comportamentos estranhos, nem sempre facilmente identificáveis a olho nu”. Destaca que “pais, demais familiares e professores precisam estar alertas, pois suicídios, anorexias e quedas no rendimento escolar podem ocorrer. E dá sugestões, a escolas e pais abaixo.

Para Escolas

  • Rodas de conversas sobre sensações e percepções adquiridas na leitura de um livro de ficção (como Maluquinho Assombrado, de Ziraldo, acima), experiências em jogo ou etapas de um game, que podem ser mais bem exploradas pelos professores, em trabalho e intervenção pedagógica orientada.
  • Ensinar a utilizar corretamente a Internet, como identificar sites e programas perigosos.
  • Ser local onde estudantes possam buscar auxílio quando tiverem problemas, medos e inseguranças. Pode ter caixas para escreverem recados, desabafarem e pedirem ajuda ou sala e profissional para ouvir e fazer encaminhamentos, sempre buscando alertar a família.
  • Fazer campanhas educativas sobre o perigo em Internet e jogos que põem a vida em risco.
  • Trabalhar com expressão corporal, comunicação escrita, criação de cartazes e demais materiais que possam envolver crianças e jovens na criação de alertas sobre os cuidados com a exposição em jogos, brincadeiras violentas, sites e programas duvidosos.

Para os Pais

  • Controlar o horário de acesso a sites e jogos.
  • Bloquear determinados links e palavras que possam ser buscadas em pesquisas na Internet.
  • Conversar e deixar a criança expor sentimentos, medos e inseguranças.




Correio do Povo

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