Executivo nega que tenha interferido em autonomia de estados e diz que apenas fixou patamar mínimo a ser pago à classe
A Presidência da República e a Advocacia-Geral da União (AGU) disseram ao Supremo Tribunal Federal (STF) que a lei sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro que criou um piso salarial nacional para profissionais da enfermagem é legítima e pediram que a norma não seja suspensa. Após o piso entrar em vigor, o STF foi acionado pela Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde), que pediu ao Tribunal para declarar a lei inconstitucional e revogar os efeitos dela.
A entidade pondera que a norma que criou o piso desrespeita a auto-organização financeira, administrativa e orçamentária de estados e municípios, tanto por repercutir sobre o regime jurídico de seus servidores quanto por impactar os hospitais privados contratados pelos entes para realizar procedimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
No entendimento da AGU, no entanto, "não se pode confundir o piso remuneratório profissional estabelecido pela lei com a fixação da remuneração dos servidores que exercem as atividades de todas as categorias abarcadas pelas disposições da norma no âmbito do serviço público".
De acordo com o órgão, "a lei em comento não trata de aumento da remuneração, no âmbito da administração direta da União, mas sim do estabelecimento do patamar mínimo remuneratório, em caráter nacional, do enfermeiro, do técnico de enfermagem, do auxiliar de enfermagem e da parteira, com aplicação tanto no âmbito do serviço público como da iniciativa privada".
A AGU ainda destacou que "a eventual concessão de aumento remuneratório e o respectivo incremento da despesa, nos casos em que isto se fizer necessário, a fim de adequar a remuneração dos servidores ao piso remuneratório fixado pela lei, serão feitos no âmbito de cada ente federativo, até o final do vigente exercício financeiro".
"Sob a perspectiva técnico-jurídica, a lei não concede propriamente aumento da remuneração. E nem poderia fazê-lo, sob pena de contrariar o texto constitucional, uma vez que prevê a necessidade de lei específica, de iniciativa do chefe do Poder Executivo do ente federativo respectivo, para a concessão de aumento remuneratório de servidores públicos", garantiu a AGU.
Precarização do serviço
A CNSaúde também reclama que a norma vai acarretar em uma série de efeitos práticos, como precarização dos serviços de saúde, fechamento de hospitais e repasse dos custos aos usuários da saúde suplementar. A Presidência da República rebateu e disse que a lei "apenas cumpriu aquilo que a Constituição determina: a identidade de tratamento entre os profissionais que atuam em território nacional, a despeito do local de sua residência".
"Busca-se, portanto, a redução das desigualdades regionais e não o contrário. A criação de piso salarial para determinadas categorias não se qualifica como intervenção estatal, mas mera atividade regulatória voltada à proteção de direitos fundamentais (inclusive do direito à saúde) e correção de desvios e externalidades ínsitas à atividade econômica", ponderou o órgão.
A AGU acrescentou que a lei que criou o piso "deve ser vislumbrada como a instituição de uma política pública genuinamente tradutora de esforço estatal que — muito ao revés de frustrar — verdadeiramente busca alcançar os objetivos de erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais".
"A instituição de um piso profissional digno contribuirá para diminuir o problema da evasão dos profissionais abarcados pela lei em razão da baixa remuneração, o que impacta especialmente a prestação ao serviço de saúde às parcelas economicamente mais desassistidas da população."
O piso da enfermagem
O piso foi criado a partir da aprovação de um projeto de lei no Congresso Nacional e entrou em vigor em 4 de agosto, após sanção do presidente Jair Bolsonaro (PL). A norma contempla enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiros.
De acordo com a lei, enfermeiros passam a receber um salário mínimo inicial de R$ 4.750, a ser pago em todo o país por serviços de saúde públicos e privados. A remuneração mínima de técnicos de enfermagem será de 70% do piso nacional dos enfermeiros (R$ 3.325), enquanto o salário inicial de auxiliares de enfermagem e parteiros corresponderá a 50% do piso dos enfermeiros (R$ 2.375). A ação da CNSaúde no STF que quer a suspensão da lei é relatada pelo ministro Luís Roberto Barroso.
R7 e Correio do Povo
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