Páginas

terça-feira, 30 de novembro de 2021

Nova onda de protecionismo no mundo ameaça 50 bilhões de dólares em exportações brasileiras

 


A volta do protecionismo no mundo, que aumentou com a pandemia e tem no Brasil um forte alvo, dado o perfil do país de grande exportador de produtos agropecuários, é uma ameaça direta a quase US$ 50 bilhões em exportações.

A cifra considera itens que, hoje, são mais suscetíveis a barreiras protecionistas, sanitárias e comerciais: carne bovina, soja, farelo de soja e café. E representa metade das vendas externas do agronegócio brasileiro.

No ano passado, as exportações desses produtos somaram US$ 47,6 bilhões. Em 2021, com a alta dos preços das commodities no mercado internacional, a receita exportada deve ser bem maior.

Considerando os dados de 2020, o volume de vendas externas ameaçado com medidas protecionistas corresponderia a quase 20% do total embarcado pelo Brasil para o exterior, que somou US$ 235,8 bilhões.

Para o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, grande parte das exportações do agronegócio está na linha de tiro, e os superávits gigantescos na balança comercial garantidos pelo setor podem acabar.

“Isso sem contar açúcar, carne suína e frango. O mundo está mais protecionista, e o Brasil tem que fazer o dever de casa”, afirma Castro.

A China parou de comprar carne bovina in natura brasileira há três meses. Pecuaristas americanos, alarmados com a ida para os EUA de parte da carne que não foi para o mercado chinês, pressionam autoridades a suspenderem o ingresso do produto no país.

Mas, hoje, o que mais tem preocupado o governo brasileiro é um projeto de lei apresentado pela União Europeia (UE) ao Parlamento do bloco que pune importadores de commodities extraídas de áreas desmatadas ilegalmente ou mesmo quando o desmatamento legal ocorrer após dezembro de 2020.

Em entrevista ao jornal britânico Financial Times, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Carlos França, classificou o projeto de protecionista, disse que há uma espécie de “miopia” da UE e criticou o governo francês pelos subsídios a seus agricultores:

“O que eu não posso aceitar é que o meio ambiente seja usado sob a forma de protecionismo comercial. É ruim para os fluxos de consumo e comércio.”

A reportagem do FT pontua que a publicação da proposta da UE aconteceu pouco antes da divulgação de dados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que mostram que a destruição da Amazônia brasileira saltou para a maior alta em 15 anos, resultando em questionamentos sobre o compromisso do governo em proteger a floresta.

Na avaliação de integrantes do governo brasileiro, os europeus jogam pesado, sem justificativa legal para adotarem barreiras. Uma fonte afirmou que a medida é “uma clara medida protecionista, com o objetivo de exercer pressão sobre outros países. Tudo definido unilateralmente, em desrespeito aos processos negociadores e às normas e tratados internacionais”.

O projeto da UE foi atacado tanto pelo governo brasileiro — a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, chamou a medida de protecionismo climático — como pelos produtores de soja, que o classificaram de afronta à soberania nacional.

Contra-ataque na OMC

O embaixador da Alemanha em Brasília, Heiko Thoms, disse que a maior parte dos produtores agropecuários brasileiros age corretamente, mas pode se prejudicar por um pequeno grupo responsável pelo desmatamento ilegal. Ele acredita que o projeto passará no Parlamento europeu sem dificuldades, pois o texto reforça a política ambiental da UE.

“Os brasileiros deveriam se preparar, porque é uma questão muito séria. Essa direção da UE não vai mudar “,afirmou o diplomata alemão, que sugeriu que Brasil e UE se unam na formação de “cadeias produtivas transparentes”.

O Brasil já tinha planos para se movimentar sobre o tema na 12ª Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC). O evento estava previsto para ocorrer em Genebra, na Suíça, entre esta terça (30) e sexta-feira (3), mas foi suspenso, devido ao agravamento da pandemia

A expectativa era que fosse negociada uma declaração sobre comércio e sustentabilidade. O Brasil vai defender que a OMC não aceite que questões ambientais sejam usadas para justificar barreiras comerciais.

“O Brasil entende que a OMC deve estimular respostas aos desafios do desenvolvimento sustentável. A OMC não pode ser fonte de protecionismo e medidas unilaterais e discriminatórias”, disse o secretário de Comércio Exterior e Assuntos Econômicos do Itamaraty, Sarquis José Buainain Sarquis.

“Acidente de percurso”

A Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja) argumenta que a demanda por alimentos no mundo está crescendo e o Brasil é um dos grandes fornecedores, mesmo tendo uma legislação rigorosa, que é o Código Florestal.

Para o secretário-executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini, acabar com a destruição da maior floresta tropical do mundo deveria ser uma obsessão e um diferencial para o Brasil. Para ele, o maior desafio é mostrar a diferença entre o atual governo e o País:

“Precisamos deixar claro que Bolsonaro é um acidente de percurso e que, ali na frente, o País será recolocado no rumo certo do debate ambiental.”

O Sul

Nenhum comentário:

Postar um comentário