segunda-feira, 1 de novembro de 2021

Donos de restaurantes comemoram permissão para doarem alimentos para quem passa fome

 Projeto de lei estabelece critérios para ajuda


Mais de 19 milhões de brasileiros estão passando fome. E mais da metade da população do país, cerca de 116,8 milhões de pessoas, enfrenta a insegurança alimentar, o que significa que não tem acesso pleno e permanente a alimentos. Os dados são do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, elaborado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN).

As frequentes cenas de pessoas fazendo filas para receber os ossos que sobram em estabelecimentos e açougues são o retrato fiel dessa realidade. Esses números refletem e comprovam a verdadeira tragédia alimentar que o povo vive. Um alento para minimizar os impactos dessa desigualdade social foi a aprovação na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, na semana passada, de projeto de lei que autoriza os estabelecimentos responsáveis pela produção, fornecimento, comercialização, armazenamento e distribuição de gêneros alimentícios, sejam eles industrializados ou in natura, a doarem o seu excedente a pessoas físicas ou jurídicas, sem necessidade de licença prévia ou autorização da Prefeitura da Capital.

“Nos sentimos mais seguros em fazer as doações dos alimentos excedentes, pois agora estamos amparados por lei”, comentou Gilmar Kuhn, gerente de um restaurante no Centro Histórico. “Atualmente, por causa da pandemia, a comida sobressalente varia de cinco a dez marmitas bem cheias”, acrescenta. Antes, porém, os volumes eram bem superiores.

A presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-RS), Maria Fernanda Tartoni, avaliou como positiva essa nova realidade. “A expectativa é que mais restaurantes doem os alimentos excedentes e nós vamos incentivar isso. Estamos discutindo a questão de logística e de operacionalidade das doações”, revelou. “Temos comida de qualidade indo para o lixo e agora poderemos direcionar esses alimentos para quem vai fazer bom uso”, completou.

A Equipe de Alimentos da Vigilância em Saúde cuida da segurança e da qualidade dos alimentos comercializados ou consumidos na Capital. Sua função é eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde, além de fiscalizar o comércio de alimentos e investigar surtos de doenças de transmissão alimentar (DTA). Também promove ações de educação voltadas para a prevenção das DTAs. A Vigilância em Saúde municipal informou que “não haverá uma fiscalização específica” sobre as doações dos alimentos excedentes. Conforme destacou, “essas ações entrarão no fluxo da fiscalização normal. O atendimento de qualquer denúncia será realizado quando houver suspeita de irregularidade.”

O proprietário Jonathan Chies, que tem um bufê em um movimentado ponto do Centro, afirmou que, devido à pandemia da Covid-19, “apenas 40 quilos de alimentos têm ficado sobressalentes no dia a dia.” O dono do estabelecimento lembra que nos dias de normalidade e sem o coronavírus, “até 80 quilos de alimentos próprios para consumo eram desperdiçados depois do horário de fechamento do restaurante.” Agora, as marmitas poderão ser doadas para quem passa fome pelas ruas da cidade. “Se a gente caminha perto do Mercado Público percebe que muitos estão com fome na rua”, observa Jonathan Chies.

A situação é um pouco diferente no caso dos estabelecimentos à la carte. Os alimentos que sobram nos pratos dos clientes não podem ser reaproveitados. “Não temos muita sobra, pois os clientes pedem a porção no prato. Não poderíamos doar devido a essa situação”, explica Vilmar Lando, gerente e proprietário de um restaurante na rua dos Andradas. Conforme relata, muita gente entra no estabelecimento para pedir comida diariamente, alguns inclusive abordam os clientes em busca de sobras de alimentos.

O projeto de lei, de autoria da vereadora Fernanda Barth, determina que as doações devem atender a alguns critérios. Os alimentos devem estar dentro do prazo de validade; em condições próprias para o consumo, e devem ser observadas as suas condições de preservação e mantidas as suas propriedades nutricionais; as normas sanitárias devem ser obedecidas pelo estabelecimento doador; e a doação deve ser livre de encargo, salvo o relativo à cobrança de custos para o transporte do produto ao seu destinatário final, se assim for acordado entre o doador e o beneficiário. Este último item não deve ser um entrave. A reportagem do Correio do Povo apurou que muitos estabelecimentos pretendem fazer as doações para as pessoas que vivem em situação de rua no entorno dos próprios bufês.


Correio do Povo

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