por Daniele Madureira
Empresas enfrentam o dilema entre repassar custos ou aquecer vendas
A recente disparada do dólar –a moeda americana chegou a fechar a R$ 5,668 no último dia 21– acendeu o sinal de alerta no setor privado. Há cerca de quatro meses, em 25 de junho, por exemplo, o dólar estava em R$ 4,938. Até o fechamento desta quarta-feira (27), quando ficou em R$ 5,560, a alta acumulada é de quase 13%.
Sem saber até onde chega o câmbio, as empresas com dívidas em dólar ou que têm insumos cotados na moeda estrangeira ficam com o seu planejamento comprometido. Da mesma maneira, quem compra produto importado para revender no Brasil precisa dosar a mão para não repassar todo o aumento ao consumidor final e naufragar nas vendas.
"Parte dos lojistas está com o seu estoque limitado para a Black Friday, especialmente em eletroeletrônicos, já que muitos itens são importados", diz Luiz Augusto Ildefonso, diretor institucional da Alshop (Associação Brasileira de Lojistas de Shopping).
Segundo ele, em alguns casos, não vale a pena abastecer as lojas com o dólar neste preço, porque não será possível repassar tudo ao consumidor.
Para Idelfonso, na data promocional de 26 de novembro, o público "pode não encontrar o desconto que gostaria", por conta do câmbio. Ao mesmo tempo, diz, a disponibilidade de estoque tende a ser afetada pelo nó logístico envolvendo a falta de contêineres.
O economista Ulisses Ruiz de Gamboa, da ACSP (Associação Comercial de São Paulo), lembra que o atual cenário de aumento do risco fiscal e de turbulência política influencia diretamente a cotação da moeda, justo em um momento de retomada importante para o comércio.
"Os lojistas estão preocupados em relação a quanto do aumento de custos pode ser repassado ao consumidor agora, quando a demanda ainda não se fortaleceu", diz Gamboa.
Segundo ele, o comportamento do varejo tem se mostrado heterogêneo. "Alguns setores, como vestuário e calçados estão se recuperando, enquanto o de supermercados, móveis e eletrodomésticos tiveram queda", afirma.
Como reflexo, o consumidor tende a encontrar menor diversidade de produtos e uma faixa de preço mais elevada, uma vez que os varejistas procuram manter suas margens.
Principal acionista e fundador da rede de farmácias Pague Menos, o empresário Deusmar Queiroz diz que alta do dólar vai influenciar no reajuste de preços dos medicamentos em abril do ano que vem. No Brasil, o preço dos remédios é tabelado e o reajuste ocorre todos os anos a partir de abril.
"A variação cambial não interfere diretamente no caixa da nossa empresa, no entanto, vai influenciar no reajuste de preço da indústria farmacêutica, cuja matéria-prima é predominantemente importada", afirmou Queiroz à Folha.
Já o presidente da Anafavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), Luiz Carlos Moraes, diz que a entidade parou de fazer conta do impacto do câmbio sobre o setor em março do ano passado –período em que o dólar chegou a R$ 4,60 e iria causar um rombo de R$ 8 bilhões no ano para a indústria.
"A pressão atual sobre os custos é incalculável e ainda não foi repassada totalmente aos preços dos veículos", diz Moraes, destacando que, no ano passado, por exemplo, as importações de componentes somaram cerca de US$ 13 bilhões.
"Essa questão nos preocupa tanto quanto a escassez de componentes, como os semicondutores", diz o presidente da Anfavea. "Além disso, a desvalorização impacta ainda mais a inflação e provoca aumento da taxa de juros, reduzindo substancialmente a chance da retomada de crescimento".
A pressão que a volatilidade da moeda exerce sobre a inflação também preocupa a indústria da construção civil. "Isso pode significar maior incremento na taxa de juros e, consequentemente, um desestímulo aos investimentos nas atividades produtivas, como a construção civil", diz Ieda Vasconcelos, economista da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção).
A especialista ressalta que o principal problema que o setor vem enfrentando há cinco trimestres consecutivos é o "aumento exagerado" do preço dos insumos. A alta do dólar impacta parte desses itens, como cobre e minério de ferro, commodities que seguem a cotação do mercado internacional.
Fonte: Folha Online - 27/10/2021 e SOS Consumidor
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