Novo presidente disse que quer romper com símbolos coloniais e que, por isso, não governará do Palácio de Pizarro
O novo presidente do Peru, o esquerdista Pedro Castillo, anunciou em seu primeiro discurso que enviará ao Congresso um projeto de reforma da Constituição, após assumir o poder nesta quarta-feira, em meio a um clima de esperança para metade dos seus compatriotas e de medo para a outra.
Após afirmar que o Peru pode estar "condenado a continuar prisioneiro desta Constituição", Castillo declarou: "anuncio que apresentaremos ao Congresso um projeto de lei para reformá-la que, após ser debatido pelo Parlamento, esperamos que seja aprovado e depois submetido a um referendo popular".
A proposta de campanha de Castillo de mudar a Constituição atual, que privilegia o liberalismo econômico, foi rejeitada pela sua adversária de direita Keiko Fujimori, filha do ex-presidente, e por outros adversários políticos.
"Insistiremos nesta proposta, mas dentro do marco legal que a Constituição proporciona. Teremos que conciliar posições com o Congresso", afirmou o novo presidente, cujo partido Peru Livre tem apenas 37 das 130 cadeiras no Parlamento.
"Castillo propõe o caminho chileno para a constituinte. Um pacto com o Congresso que gere uma reforma", tuitou o analista político Juan de la Puente.
O professor rural foi empossado como o novo presidente para o período de 2021-2026 pela chefe do Congresso, a opositora María del Carmen Alva, colocou sobre ele a faixa presidencial bicolor.
Vestido com um terno andino preto bordado e seu clássico chapéu Cajamarca branco de cano alto, Castillo caminhou de mãos dadas com sua esposa, Lilia Paredes, até o Parlamento desde o Palácio Torre Tagle, sede da chancelaria, a quatro quadras de distância.
Em seu primeiro discurso, Castillo anunciou também que não vai governar o país no Palácio de Pizarro - a casa do governo - porque planeja transformá-lo em um museu e que retomará seus "trabalhos docentes de sempre" no fim de seu mandato.
"Não governarei na Casa de Pizarro, porque acredito que temos que romper com os símbolos coloniais. Cederemos este Palácio ao novo ministério das Culturas para que seja usado como um museu que mostre a nossa história", disse.
"Durante a campanha eleitoral foi dito que vamos desapropriar. É totalmente falso", declarou em outra parte de sua mensagem, embora tenha afirmado que busca um "novo pacto com investidores privados".
Três dias de cerimônias estão programados para a posse do novo presidente, que receberá a faixa bicolor no dia em que o Peru comemora o bicentenário da independência.
Muitas ruas do centro de Lima foram cercadas pela polícia, que mobilizou 10.000 agentes em toda a capital, enquanto dezenas de apoiadores de Castillo expressaram seu apoio.
Castillo assumiu em meio às esperanças de milhares de compatriotas, mas também temores do setor privado e boa parte dos peruanos que temem uma virada acentuada para o socialismo após três décadas de políticas liberais.
"Castillo tem que dar sinais da gestão da economia" e esclarecer "com quem vai selar alianças para [formar] o gabinete e o Parlamento", comentou à AFP a cientista política Jessica Smith.
Há semanas Catillo tem procurado dissipar os temores, descartando a cópia de "modelos" estrangeiros e negando que ser "chavista". Seu principal assessor econômico, Pedro Francke, disse à AFP que o programa "nada tem a ver com a proposta da Venezuela".
Castillo recebeu na segunda-feira um telefonema do chefe da diplomacia americana, Antony Blinken, que, além de parabenizá-lo, disse que Washington espera dele "um papel construtivo" em relação à Venezuela, Cuba e Nicarágua.
A posse foi assistida pelo rei da Espanha, Felipe VI, cinco presidentes (Argentina, Bolívia, Colômbia, Chile e Equador) e dois vice-presidentes (Brasil e Uruguai), bem como um enviado do presidente americano Joe Biden, o secretário de Educação Miguel Cardona.
"Desejamos muita sorte ao presidente Castillo, porque se o Peru for bem, todos nós estaremos bem", disse o presidente chileno, Sebastián Piñera, depois de se reunir com ele.
Castillo foi proclamado presidente eleito há oito dias pelo júri eleitoral, que levou um mês e meio para analisar as contestações e recursos antes de declará-lo o vencedor da votação de 6 de junho contra a candidata de direita Keiko Fujimori.
O novo presidente, de 51 anos, que costuma usar o chapéu branco típico dos camponeses de sua terra natal, Cajamarca (norte), é católico e contrário ao aborto e às uniões entre pessoas do mesmo sexo.
Castillo é "o primeiro presidente pobre do Peru", disse o analista Hugo Otero à AFP, destacando que seu maior desafio será "não decepcionar as pessoas que precisam de respostas rápidas" diante da crise econômica e da pandemia.
Castillo deve anunciar os nomes de seu chefe de gabinete e ministros-chave a qualquer momento.
Castillo viajará para a cidade andina de Ayacucho na quinta-feira para uma inauguração simbólica no Pampa de la Quinua, cenário da Batalha de Ayacucho em 9 de dezembro de 1824, que selou a independência do Peru e do resto da América espanhola. Na sexta-feira, ele comandará um Desfile Militar em Lima.
AFP e Correio do Povo
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