por Hélio Beltrão - publicado no Jornal do Comércio de 10.06.21
Em nota conjunta no último sábado, FHC e Lula declararam apoio ao presidente da Argentina, Alberto Fernández, que tem usado seu poder de veto para impedir a modernização do Mercosul, frustrando a melhoria da competitividade internacional brasileira.
Não chega a surpreender a camaradagem FHC/Lula/Fernández do estilo “socialistas do mundo, uni-vos”, mas é escandalosoque dois ex-presidentes brasileiros defendam o interesse do governo da Argentina em detrimento do povo brasileiro.
O Mercosul é aquela elaborada peça de ficção que previa em sua fundação em 1991 (artigo 1º do Tratado de Asunción), que até 1995 seria estabelecido um mercado comum entre os quatro fundadores (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai), com: (a) liberdade total, sem tarifas, de circulação de bens e serviços, (b) coordenação e harmonização das políticas macroeconômicas,industrial, setorial, fiscal, monetária e cambial, e (c) o estabelecimento de uma tarifa externa comum (TEC) bem como a obrigação de negociações em conjunto e por consenso deacordos com terceiros países.
O item (a) entrou para a lista de literatura de ficção, por meio do estabelecimento de diversos regimes especiais, como o automotivo (que eleva as tarifas de importação a 35%), e pelaslongas listas de exceção, que driblam a TEC e impõem tarifas ainda mais elevadas em pêssegos, brinquedos, leite, coco ralado, e muitos outros.
O descumprimento generalizado do item (b) teve um lado positivo, pois os desastrosos indicadores macroeconômicos argentinos ilustram o que teria sido do Brasil caso houvéssemos harmonizado nossas políticas macroeconômicas com as dos governos peronistas.
Só a TEC e a rigidez negocial pegaram. Por conta do imobilismo do tratado, dos 400 acordos registrados na OMC nos últimos 30 anos, o Brasil só firmou o Mercosul. Criou-se desta forma o Brasil autárquico, tal qual um extenso castelo medieval, isolado e condenado à falta de competitividade internacional.
O produto manufaturado brasileiro agrega apenas 10% de conteúdo importado, contra uma média internacional de 30% a 35%. Em suma, produz-se tudo internamente, com custos mais altos, sem chance de competir no mercado internacional contraprodutos cujos componentes são adquiridos no mundo inteiro, onde for melhor e mais barato, praticamente sem tarifas.
O Brasil pratica o mercantilismo do século 17. Por aqui, as forças do atraso defendem que exportar produtos básicos é ruim, pois deveriam ser beneficiados aqui; que a substituição de importações reduz custos e atrai empregos; que saldo comercial é sinônimo de pujança; que tarifas de importação geram bem-estar social; que abrir a economia e reduzir custos para a indústria nacional sem reciprocidade de terceiros países é ingenuidade. Todas estas falácias foram devidamente refutadas por Adam Smith em “A Riqueza das Nações” (1776).
A abertura comercial é a mãe de todas as reformas: quando ocorrer, provocará o salto do Brasil ao século 21.
Durante seus governos, FHC e Lula abusaram das listas de exceção para aumentar o favoritismo a setores com lobbies poderosos. Nada fizeram para modernizar o Mercosul.
A demanda da equipe de comércio exterior do Ministério da Economia, tocada por Roberto Fendt e Lucas Ferraz, é de diminuir a TEC em 20%, linearmente, ou seja, uma redução de todas as tarifas sem favorecimento a setores. Paraguai e Uruguaiestão de acordo, mas a Argentina (com ajuda de FHC/Lula) resiste. O Brasil e o Uruguai também demandam que tenham a liberdade para implementar acordos bilaterais. A TEC permaneceria em vigor onde não houvesse acordos. Fernándeznão quer conceder esta liberdade ao Brasil; prefere que sejamosmercado cativo para seus produtos.
Chegou-se ao impasse. A maneira mais rápida de acabar com o Mercosul é não mudar nada.
Pontocritico.com
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