por Daniela Arcanjo
Na reunião desta quarta (17), taxa básica subiu de 2% para 2,75% ao ano, uma alta que poucos analistas projetaram SÃO PAULO
A taxa básica de juros do Brasil, a Selic, aumentou nesta quarta-feira (17) pela primeira vez em quase 6 anos.
A decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central elevou os juros de 2% para 2,75%. O último aumento havia sido em 29 de julho de 2015, quando a Selic subiu de 13,75% para 14,25%. A queda começou em 19 de outubro do ano seguinte, quando baixou para 14%. A taxa estava em 2% desde agosto do ano passado.
O BC já considerava determinar uma alta desde a última reunião, há 45 dias. A alta desta quarta coincidiu com a expectativa de parte do mercado financeiro, mas não era unanimidade entre os economistas. Isso porque a medida aumentará o custo da dívida pública em um momento de baixa atividade econômica por causa da pandemia.
Por outro lado, os defensores da elevação defendem que a manutenção da taxa causaria um descontrole ainda maior da inflação e inibiria investimentos no Brasil.
A manutenção vai impactar diretamente as escolhas financeiras dos brasileiros. Entenda como e por que esse índice é tão importante para o país.
O QUE É O COPOM?
O Comitê de Política Monetária é um órgão deliberativo do Banco Central que se reúne a cada 45 dias —são oito reuniões por ano. Nesses encontros, que normalmente ocorrem em dois dias, estão presentes o presidente e diretores do BC.
No primeiro dia da reunião, quadros técnicos do banco apresentam análises da inflação, do nivel de atividade econômica do país e da taxa de câmbio. No segundo, delibera-se sobre a taxa Selic, divulgada no mesmo dia, sempre uma quarta-feira. Os votos, junto com a ata da reunião, são tornados públicos seis dias depois.
Esse comitê foi criado em 1996. Antes, a decisão era menos protocolar, e a divulgação era feita apenas em um comunicado. O órgão foi criado visando prestar contas à sociedade e ser mais transparente, deixando claro ao mercado financeiro o que o BC pensa para o futuro.
O QUE É POLÍTICA MONETÁRIA?
Esse é o nome de um conjunto de ferramentas que as autoridades monetárias utilizam para chegar a determinadas metas na vida financeira do país.
O objetivo geral é estabilidade, ou seja, "fazer a economia funcionar com a taxa de desemprego baixa e a inflação contida, na meta", explica Clemens Nunes, professor de economia na FGV-SP. Para isso, além da política monetária, onde o Copom se encaixa, há a política fiscal, ou seja, o controle do gasto público e da arrecadação.
Como qualquer política, há diferentes modelos no mundo. O mais utilizado por países desenvolvidos e que está em voga no Brasil hoje é o de metas da inflação.
Uma alternativa seria controlar, ao invés da taxa básica de juros, a moeda. Fixar uma unidade do real em relação ao dólar, por exemplo. Porém, essa é uma política que conta com inúmeros exemplos de fracasso ao redor do mundo. "Já está bem pacificado hoje que a política correta é tomar conta da taxa de juros, internamente. Porque ao dolarizar a economia, você tem também que produzir igual aos Estados Unidos", explica Carlos Heitor, professor de economia da UFRJ.
No Brasil, o CMN (Conselho Monetário Nacional) define a meta da inflação e o BC utiliza os seus instrumentos para cumpri-la.
Esse conselho é presidido pelo ministro da Economia, atualmente Paulo Guedes, e formado pelo presidente do BC e pelo secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia. A influência do Poder Executivo, portanto, ocorre pela escolha da meta. Apesar dessa interferência, o modelo é pensado para ficar distante dos ciclos políticos.
O QUE É A TAXA SELIC?
Selic é a sigla para Sistema Especial de Liquidação e Custódia. Criado em 1979, é um sistema eletrônico que permite a atualização diária de posições das instituições financeiras, assegurando maior controle sobre as reservas bancárias.
Também chamada de taxa básica de juros, a Selic é o que o BC usa como referência para realizar operações, ou seja, comprar e vender títulos públicos federais. No mercado, ela é apenas uma meta na negociação —normalmente efetiva por causa do magnitude do BC.
Esses títulos públicos são de curto prazo (ou seja, podem ser resgatados em menos de um ano) e, por serem do Estado, têm um retorno mais seguro em relação ao restante do mercado.
As operações do BC vão influenciar todo o resto da economia. "Você vai comparar qualquer outro ativo com essa taxa", explica Nunes. Isso porque, geralmente, outros ativos são de maior prazo e mais arriscados. Para adquiri-los, o investidor vai querer uma taxa maior do que a Selic.
A atividade econômica e a inflação também podem influenciadas por esse índice. Com uma taxa menor, diminui o custo de captação dos bancos, que podem emprestar dinheiro para outros agentes a custos menores.
"O banco fundamentalmente empresta recursos que não são dele, porque o dinheiro dos acionistas é para colchão de liquidez. Para gerar resultado para o acionista, portanto, ele tem que captar e emprestar, e as pessoas que vão fazer esse empréstimo vão olhar para a taxa Selic. Elas não vão emprestar a uma taxa de 2%, por exemplo, se podem comprar um título do governo, que é mais seguro, e está com uma taxa de 2,5%", explica Nunes.
Esse comportamento desencadeia uma série de consequências na vida econômica do país. Com taxas de juros baixas, os acionistas podem escolher não colocar dinheiro no banco, e sim no mercado acionário, em novos negócios, no consumo. O custo para o governo se financiar é mais baixo, e o estímulo do consumo pode favorecer o aumento da inflação: com mais demanda, os preços tendem a aumentar. Apesar disso, o atual cenário sem precedentes da pandemia não permite fazer uma previsão tão exata.
COMO ESSA TAXA INTERFERE NA VIDA DO CIDADÃO?
"Todas as outras taxas de juros que você imaginar vão partir da taxa Selic", explica o professor da UFRJ Carlos Heitor. Um aumento da Selic causa, naturalmente, uma pressão de aumento de juros do cheque especial e no cartão de crédito, por exemplo.
Se as taxas de juros interferem no custo de captação de dinheiro dos bancos, é natural que eles repassem esse custo em empréstimos. Resumindo, o canal de crédito fica mais caro.
Por outro lado, se os títulos brasileiros ficam mais atrativos —ou seja, com uma taxa de juros mais alta—, entram mais investimentos externos. Esse movimento fortalece o real frente a moedas estrangeiras (principalmente o dólar) e os bens que o país importa tendem a ficar mais baratos.
O QUE SE LEVA EM CONTA PARA DETERMINAR A TAXA?
Nas reuniões, o Copom vai olhar essencialmente dois parâmetros: a atividade econômica e a expectativa da inflação. Quanto menor a taxa, mais pressão de movimentação na economia é gerada, mas menos investimentos externos são feitos. A inflação fechou 2020 em 4,52%, acima da meta para o ano, de 4%.
Um aumento da Selic também pressiona os cofres públicos. Com os gastos na pandemia, as contas do governo federal tiveram um rombo recorde de R$ 743,1 bilhões em 2020.
Fonte: Folha Online - 17/03/2021 e SOS Consumidor
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