De acordo com várias estimativas, cerca de 100 mil pessoas se reuniram perto da prefeitura da capital econômica do país, onde um grande dispositivo policial foi mobilizado
Dezenas de milhares de birmaneses protestaram novamente em Yangon neste domingo contra o golpe de Estado que derrubou o governo de Aung San Suu Kyi, na maior manifestação no país desde a revolta de 2007, enquanto o acesso à internet foi parcialmente restabelecido após dias de bloqueio. Os manifestantes, quase 100 mil de acordo com várias estimativas, se reuniram perto da prefeitura da capital econômica do país, onde um grande dispositivo policial foi mobilizado.
Em várias cidades do país também foram organizados protestos, com muitos participantes, de acordo com os correspondentes da AFP. Estas são as maiores manifestações desde a "Revolução Açafrão" de 2007, violentamente reprimida e que terminou com dezenas de mortos. "Vamos continuar protestando até que democracia volte. Abaixo a ditadura", declarou Myo Win, de 37 anos. "A ditadura está enraizada em nosso país há muito tempo", lamentou Myat Soe Kyaw.
Alguns manifestantes entregaram rosas aos policiais, otros exibiram cartazes com frases como "Libertem a mãe Suu", em referência a Aung San Suu Kyi. Também foram exibidas bandeiras do partido de Suu Kyi, a Liga Nacional para a Democracia (LND), e muitas pessoas fizeram a saudação com três dedos, um gesto de resistência.
"Até o fim"
"Não tenho medo da repressão" e "vamos lutar até o fim", gritaram os estudantes. Apesar do medo, em um país acostumado à repressão violenta como em 1988 e 2007, os habitantes de Yangon voltaram às ruas nas primeiras horas de domingo para, como afirmam, "expulsar os demônios", os militares, com direito a panelaços.
No sábado, milhares de pessoas se reuniram em várias cidades do país para condenar o golpe de Estado de 1 de fevereiro, que acabou com 10 anos de frágil democracia. Os militares decretaram estado de emergência por um ano. Aung San Suu Kyi, líder de fato do governo civil, e outros dirigentes da LND foram detidos. Os generais não fizeram comentários sobre os protestos.
Na domingo à tarde, o acesso à internet foi parcialmente restabelecido, após um bloqueio de vários dias, de acordo com a ONG Netblocks. O exército havia ordenado aos fornecedores de internet que bloqueassem o acesso ao Facebook, rede social utilizada por milhares de birmaneses, Twitter e Instagram. Poucas horas depois do golpe de Estado, estas plataformas registraram publicações de pedidos de "desobediência civil", apoiados por advogados, médicos e funcionários públicos.
Ao mesmo tempo, as detenções continuam no país. Mais de 160 pessoas foram detidas, segundo a Associação de Assistência aos Presos Políticos, que tem sede em Yangon. Um conselheiro econômico de Suu Kyi, o australiano Sean Turnell, está retido em um hotel. "Estou atualmente detido e talvez acusado de algo", declarou no sábado ao canal BBC o professor da Universidade Macquarie na Austrália. É a primeira detenção conhecida de um estrangeiro desde o golpe.
Suu Kyi em prisão domiciliar
Aung San Suu Kyi, de 75 anos, muito criticada recentemente pela comunidade internacional por sua passividade na crise dos rohingyas, continua sendo uma figura venerada no país. Os militares a acusam de infringir uma lei comercial e ela está em prisão domiciliar na capital Naypyidaw, "em boa saúde", de acordo com uma fonte da LND. As autoridades "devem garantir o respeito completo do direito de reunião pacífica e que os manifestantes não sejam submetidos a represálias", tuitou o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos.
A ONU pediu a libertação de todos os detidos, mas não condenou formalmente o golpe de Estado em sua declaração conjunta, pois China e Rússia, apoios tradicionais do exército birmanês nas Nações Unidas, se opõem à medida. Estados Unidos e União Europeia ameaçaram adotar sanções contra Mianmar. Para justificar o golpe de Estado, o comandante do exército, Min Aung Hlaing, que concentra na prática todos os poderes, alegou "enormes fraudes" nas eleições legislativas de novembro, vencidas por ampla maioria pela LND.
Na realidade, os generais temem a perda de influência após a vitória da Aung San Suu Kyi, que teria se mostrado favorável a modificar a Constituição, muito favorável aos militares. A junta militar prometeu organizar eleições livres após o estado de emergência.
AFP e Correio do Povo
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