sábado, 9 de janeiro de 2021

Dólar sobe 4,4% na semana com risco fiscal e fecha sexta-feira aos R$ 5,41

 Bolsa tem máxima histórica, terminando em alta de 2,20%, a 125.076,63 pontos



O real, assim como terminou 2020, começou 2021 como uma das moedas com pior desempenho ante o dólar, considerando as 34 divisas mais líquidas. A moeda americana acumulou alta de 4,4% na primeira semana do ano, a quarta consecutiva de valorização. O risco fiscal em alta no Brasil voltou a incomodar os investidores e, nos últimos dias, a divisa dos Estados Unidos passou também a ganhar força internacionalmente, em um movimento de correção estimulado pelas altas dos juros dos Treasuries americanos, com a visão de que a economia norte-americana pode crescer mais no governo de Joe Biden, gerando mais inflação e fim das compras de ativos pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA).

Nesse ambiente, o dólar encerra a semana no Brasil no maior nível desde novembro. No fechamento desta sexta subiu 0,32%, aos R$ 5,4165. No mercado futuro, o dólar para fevereiro subiu 0,18%, a R$ 5,4245.

"Vimos nos últimos meses uma sequência de procrastinação, com o Executivo e o Legislativo empurrando com a barriga decisões fiscais importantes", avalia o gestor da Kairós Capital, Fabiano Godoi, citando a dificuldade de avançar com vários temas da agenda, incluindo o Orçamento de 2021. Com a eleição para os comandos da Câmara e do Senado, Godoi acredita que o governo terá o Orçamento aprovado só em março.

"O reflexo nos mercados é a piora da percepção fiscal do País", destaca o gestor da Kairós, em live da Ohmresearch, citando que o efeito maior tem sido no câmbio e nos juros futuros. "O real está extremamente desvalorizado em relação a outros emergentes, tem uma grande distorção em relação aos pares."

"É crescente a percepção que o teto de gastos pode não ser cumprido", disse o colaborador da Ohmresearch e ex-chefe do Departamento de Operações do Mercado Aberto do Banco Central, Sergio Goldenstein, na mesma live. "O risco de populismo fiscal subiu", disse ele, citando que persiste a possibilidade de extensão do auxílio emergencial. "O panorama fiscal de curto prazo é bastante grave."

O reflexo é a piora do câmbio e a maior inclinação da curva de juros. Há ainda, ressalta Goldenstein, a questão da vacinação, que está mais lenta no Brasil que outros mercados, outro ponto a incomodar os investidores.

No mercado internacional, o DXY, que mede o comportamento do dólar ante divisas fortes, voltou a operar nesta sexta acima dos 90 pontos, no maior nível desde 29 de dezembro. Os estrategistas do JPMorgan avaliam que o Congresso nas mãos dos democratas dá algum respiro para o dólar, após a divisa testar os menores valores no final de 2020 desde 2018. Ainda é cedo para falar se será o fim da tendência de enfraquecimento da moeda americana, destacam nesta sexta-feira, mas a perspectiva de maior crescimento econômico e inflação mais alta nos EUA pode levar a novo fortalecimento da moeda americana.

Bolsa

Mesmo com desempenho mais moderado em Nova Iorque, com sinais mais fracos sobre o mercado de trabalho nos Estados Unidos e alguma tensão sobre os últimos dias de poder de Donald Trump, o Ibovespa atingiu a marca de 125 mil pontos nesta sexta-feira, após ter saído de 119 mil para alcançar pela primeira vez o nível de 122 mil na sessão anterior. A ascensão sem escalas nesta primeira semana do ano por terreno não mapeado, enquanto dólar, juros e CDS continuam a refletir cautela quanto à situação fiscal doméstica, coloca em jogo a extensão do rali iniciado em novembro com o retorno do investidor estrangeiro à B3. A liquidez global continua a ser o mote para levar adiante o Ibovespa, adiando realização de lucros mesmo nos dias menos azuis.

Nesta sexta-feira, o índice emendou o segundo fechamento em nível recorde, distanciando-se da marca de 119,5 mil pontos que vigorou entre 23 de janeiro passado e a quarta-feira.

O giro financeiro chegou nesta sexta a R$ 46,3 bilhões, após ter se mantido na também elevada casa de R$ 43 bilhões nas duas sessões anteriores.

Na semana, o Ibovespa acumula ganho de 5,09%, tendo fechado nesta sexta em alta de 2,20%, a 125.076,63 pontos. No melhor momento, às 17h10, estabeleceu novo pico intradia acima de 125 mil, aos 125.323,53 pontos, em alta de 2,40%, saindo de mínima na sessão a 122.385,76 pontos. Assim, o índice emendou também o segundo avanço semanal, obtendo seu melhor desempenho desde a semana encerrada em 6 de novembro (7,42%).

Na hora final, os três índices de Nova Iorque voltavam a esboçar direção única, positiva, após terem se mantido mistos na maior parte do dia. Nos EUA, Joe Biden, disse no fim da tarde que a decepcionante leitura dos mais recentes dados sobre vagas de trabalho no país, divulgados pela manhã, "mostra que precisamos prover ainda mais alívio fiscal, urgente". Ele afirmou também que o pacote fiscal inteiro "estará na soma de trilhões de dólares" - sem mais detalhes, devendo sair na próxima semana.

Com a melhora em Nova Iorque, e ganhos de 3% nas cotações da commodity, Petrobras PN (+0,39%) e ON (-0,19%) chegaram a ensaiar reação conjunta, enquanto as ações de siderúrgicas reduziam perdas e uma pequena parte das de bancos passou a subir (BB ON +0,58% no fechamento), conferindo ainda mais dinamismo para o Ibovespa na reta de chegada da sessão. Assim, às 16h55, o Ibovespa tocou pela primeira vez a marca de 125 mil, a 125.002,16, e a largou às 17h46, mas conseguiu recuperá-la nos ajustes finais.

Nem o dia majoritariamente negativo para carros-chefes como Vale ON (-0,31%), bancos (Bradesco PN -0,86%, Santander -1,06%) e na maior parte de siderurgia (CSN +0,60%, Gerdau PN -1,49%) impediu o Ibovespa de alcançar novas altitudes ao longo da sessão. O destaque foram as ações de utilities, defensivas, com Cemig em alta de 6,87% e Eletrobras ON, de 3,16%, bem como as do setor de saúde, na ponta do Ibovespa, com Intermédica em salto de 26,59% e Hapvida, de 17,68%, impulsionadas por proposta de combinação de negócios entre as empresas, apresentada pela segunda. A Hapvida passaria a deter 53,1% da nova companhia e a Notre Dame Intermédica, 46,9%, com a fusão.

"O mercado está inundado de liquidez e a disponibilidade de vacinas dá mais previsibilidade para a retomada, o que tem se refletido na demanda global por todo tipo de ativo, seja petróleo, minério, ações e mesmo bitcoins", diz Romero Oliveira, especialista em renda variável da Valor Investimentos. "Na B3, tivemos esta recuperação puxada por commodities e bancos, mas ainda há oportunidades em setores que ficaram de fora deste movimento recente, como o de varejo", acrescenta.

"Em um mundo com tanta liquidez, houve mesmo este evento atípico - uma invasão que deixou mortos no Congresso americano - sem causar efeito nos mercados. Realização alguma está ocorrendo", conclui Oliveira. "O céu azul lá fora nos deu algum tempo para iniciar a arrumação da casa por aqui, o que dependerá do controle de gastos para que o fiscal se reequilibre", acrescenta o especialista, chamando atenção para a eleição das presidências da Câmara e do Senado, em fevereiro, como fator que será acompanhado de perto pelo mercado, em busca de sinais sobre o caminho.

Juros

A pressão fiscal doméstica se juntou, nos minutos finais do pregão regular, à chance de os estímulos americanos serem menores do que o precificado pelo mercado, embora Joe Biden tenha dito o contrário, levando a um movimento de alta dos juros futuros nesta sexta-feira. Assim, a curva ganhou inclinação em relação ao encerramento da semana passada, com o diferencial entre os contratos de janeiro 2022 e 2027 passando de 355 pontos no dia 30 a 390 pontos nesta sexta-feira.

A taxa do Depósito Interfinanceiro (DI) de janeiro de 2022 passou de 3,035% na quinta-feira a 3,125% nesta sexta (regular) e 3,135% (estendida). O janeiro 2023 foi de 4,621% a 4,680% (regular) e 4,675%(estendida). O janeiro 2025 avançou de 6,184% a 6,260% (regular) e 6,230% (estendida). E o janeiro 2027 subiu de 6,963% a 7,030% (regular) e 7,010% (estendida).

As exibidas no fechamento destoaram do movimento da manhã no mercado de juros, acompanhando o dólar e a produção industrial levemente inferior ao consenso. Mas o movimento não se sustentou, em meio ao noticiário político local e externo.

Primeiro, no fim da manhã, o candidato à Presidência da Câmara Baleia Rossi (MDB-SP), apoiado por Rodrigo Maia (DEM-RJ), elogiou a votação rápida do auxílio emergencial no ano passado. Foi uma fala protocolar, típica de quem está em campanha. Só que os investidores não gostaram do tom, pois esperavam, nas palavras de um profissional do mercado, uma "mensagem mais dura" no compromisso fiscal.

Essa mensagem até veio, horas depois, pelo Twitter. "Quero reforçar o que disse no lançamento de minha candidatura: temos que olhar nossa pauta com responsabilidade fiscal. A pandemia ainda não acabou. Qualquer discussão sobre o auxílio emergencial passa, necessariamente, pelo cuidado com as contas públicas", escreveu o deputado. Os juros até passaram por um movimento de correção pontual, mas, como pontuou o operador antes mencionado, "o estrago já foi feito".

Mas o impasse político com temas fiscais não ficou restrito ao Brasil nesta sexta. O senador democrata Joe Manchin se posicionou contra a ampliação do auxílio financeiro individual nos Estados Unidos, mostrando que mais estímulos ainda não são consenso no partido que agora comandará Senado e Câmara.

Minutos depois, o presidente americano eleito contemporizou e argumentou que os números do payroll nesta sexta cedo mostram que é necessária mais ajuda fiscal no país. Mais uma vez, o mercado ficou refém da "gangorra" dos headlines políticos.

Há de se pontuar ainda que houve abertura das taxas de juros nos Estados Unidos nesta semana, em meio à aposta de crescimento e inflação mais forte no médio prazo. O juro da T-note de 10 anos voltou ao nível de 1%, o que não ocorria desde março.

Para a semana que vem, além da política, o mercado vai monitorar, internamente, os números do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de dezembro e de 2020 (terça-feira) e os resultados de novembro do setor de serviços (quarta-feira) e varejo (sexta-feira). No exterior, a semana traz os dados da balança comercial da China (sem data definida) e a inflação ao consumidor nos EUA (quarta-feira).


Agência Estado e Correio do Povo

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