Presentes no velório destacaram liderança do político e seu apreço pelo jornalismo e pelo Inter
Por Eric Raupp
Corpo foi cremado após o velório | Foto: Fabiano Amaral
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Em meio a abraços e lágrimas, o corpo do político e jornalista Ibsen Pinheiro descansava no caixão coberto pelas bandeiras do Inter e do MDB. O velório do ex-presidente da Câmara dos Deputados – realizado na manhã e tarde deste sábado no Salão Júlio de Castilhos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul – reuniu personalidades de diferentes áreas para o último adeus ao que muitos dos presentes destacaram como “uma figura de caráter e valores”. Eles também celebraram suas três grandes paixões, o jornalismo, a política e o clube do coração, ao qual dedicou parte de sua vida. Após o encerramento da cerimônia, Ibsen foi cremado em Porto Alegre.
O deputado Carlos Marum afirmou que estava incubido pelo presidente nacional do partido, Baleia Rossi, e pelo ex-presidente da República Michel a “expressar aos familiares, amigos e correligionários o seu imenso pesar pelo passamento desse grande brasileiro”. “Existem pessoas que não precisavam morrer e estamos aqui hoje sepultando uma delas. Vai-se o homem, fica o exemplo e, especialmente para a família, a saudade”, lamentou.
Marum também mencionou a injustiça sofrida por Ibsen em 1994, quando teve o mandato cassado no episódio batizado de Anões do Orçamento, após a revista revista Veja publicar uma matéria com erros nos números divulgados sobre um suposto desvio de verbas. “Não posso deixar de expressar meu grito de dor diante da injustiça sofrida por Ibsen no mais especial momento da sua vida pública. Foi vítima do baixo jornalismo, mas também da covardia da classe política que não soube conceder a ele devido direito de defesa, devido processo legal”, falou, alertando que é preciso apelar pelo devido Estado direito, processo legal e presunção da inocência.
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Foi vítima do baixo jornalismo, mas também da covardia da classe política que não soube conceder a ele devido direito de defesa, devido processo legal.
- Carlos Marum
O ex-vice-prefeito de Porto Alegre Sebastião Melo também lembra o episódio. “Tem uma frase que eu me lembro até hoje, quando as entidades que lideravam o impeachment entregaram o pedido. O Ibsen disse: ‘O que o povo quer, esta Casa acaba querendo’. Isso foi a razão pela qual o centrão que apoiava o Collor nunca perdoou essa atitude, e aí fraudaram uma reportagem. Às vezes tu recuperas uma imagem em vida, e nós conhecemos muitos que não fazem isso. O Ibsen descansou em paz porque a fez depois de toda essa farsa que montaram contra ele na reportagem da Veja, que o próprio repórter veio a reconhecer”, defendeu.
Para Melo, o Brasil perdeu um grande líder. “Tem aqueles que fazem a história e tem aqueles que assistem. O Ibsen fez histórias nas páginas do Brasil”. avaliou. Ele também lembrou que dez anos depois de ter sido destituído do cargo, o colega “voltou pelos braços do povo de Porto Alegre como vereador e voltou depois para a Câmara”. “Que a nossa geração tenha capacidade de passar seu legado para as que vão nos suceder. As lutas do Ibsen não eram só lutas partidárias, eram da sociedade. Perdemos um grande companheiro, mas a caminhada terrena é finita. O que devemos deixar são contribuições para melhorar a sociedade e eu penso que isso ele fez muito bem”, completou.
Melo destacou trajetória de vitórias de Pinheiro | Foto: Eric Raupp / Especial / CP
Ala à esquerda do MDB e conciliador
Ex-deputado e figura emblemática do MDB gaúcho, Luiz Roberto Ponte considerou que “Ibsen foi comunista numa fase da idade”. “Ele nunca deixou de manter os princípios do comunismo, mas reciclou-se na ideia ruminar de que o que leva a isso não era o caminho que estava sendo traçado. Era isso que discutimos muito, e eu vou sentir muita falta dos telefonemas semanais, diários, que tínhamos durante muito tempo”, comentou. O engenheiro ainda brincou: “Obrigado, Ibsen. Vai para o céu. Tu não acreditava muito nisso, sempre discutimos muito, mas o céu não vai negar essa tua convicção, talvez uma das pouca erradas”, falou, arrancando aplausos.
Procurando rearticular o partido, que dizia ser a espinha dorsal da Constituinte, Pinheiro defendeu que o MDB continuasse no governo Sarney, apesar da crescente oposição a essa proposta, vinda, sobretudo, dos setores mais à esquerda da agremiação. Em janeiro de 1988 começou a articular a candidatura do presidente do MDB e da Assembleia Constituinte, deputado Ulisses Guimarães, à presidência da República. O ex-governador do Rio Grande do Sul pelo PT Olívio Dutra lembrou que o colega sofreu consequências por conta dessa atitude que manteve.
O ex-governador Olívio Dutra chega à AL para prestar suas homenagens a Ibsen Pinheiro, que faleceu na noite de sexta-feira.
“Uma pessoa de centro-esquerda, conciliador. Fomos colegas na Constituinte, nem sempre concordamos, mas sempre houve muito diálogo e respeito”, ressaltou.
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“Eu participei com ele na Constituinte, que teve uma maioria eventual, um centrão que até hoje se compõem no Congresso. Ele sempre teve um papel importante ali, não puxando mais para cá ou para lá, mas um homem de centro-esquerda, buscando a conciliação com a qual nem sempre concordamos. Mas nem por isso se impediu de trabalhar numa visão de que o Brasil não é eu, tu, ele, mas o Brasil são milhares de pessoas e um país que tem que ser administrado no interesse público, não no privado, particular”.
Dutra considera que Pinheiro foi “uma figura de centro-esquerda”, o que entende como “importante no momento em que estamos vivendo de direitismo e preconceitos de toda ordem, de imposturas e arrogâncias”. “O Ibsen vai fazer falta porque ele tinha paciência, compreensão da diversidade e da pluralidade, do respeito às ideias opostas, é uma figura de um político que fez presença com referência de que a política pode ser a construção do bem comum com o protagonismo das pessoas”, avaliou ao se aproximar da entrada do Palácio Farroupilha, vestindo um chapéu com o emblema do Inter.
Ideais para as novas gerações
O ex-governador José Ivo Sartori apontou que Pinheiro foi um militante pela liberdade em um momento em que a democracia ainda era incipiente “O que eu acho que se guarda dele é a serenidade, a tranquilidade e acima de tudo a sua imposição pela compostura, firmeza e convicção, coisa que não existe muito nos nossos dias, que as pessoas terem ideal, sonhos e conteúdo”, avaliou. O emedebista considerou que o correligionário era um homem inteligente e elefante, pois “tinha suficiente humildade para não demonstrar a sabedoria que possuía”. “O Rio Grande perde não apenas um cidadão, mas uma grande pessoa humana e o país muito mais, porque era uma referência política”, lamentou, considerando que preciso "tocar para frente".
A primeira mulher designada para comandar um batalhão de Polícia Militar no Estado do Rio Grande do Sul, comandante Nádia Gerhard, foi eleita vereadora em 2016. Ela apontou que Ibsen teve muita importância para sua filiação ao partido. “Foi um dos que me acolheu quando iniciei na vida política, inclusiva com bons exemplos, com palavras encorajadoras. Realmente um homem que mostrou seu valor na política como um homem de família. Digo que o Rio Grande do Sul e o Brasil perdem um grande político, mas com certeza todos nós perdemos um grande homem que pode ser um exemplo para muitos outros”, analisou.
"Colorado de cepa única"
O ex-presidente do Inter Fernando Carvalho marcou presença na cerimônia fúnero e afirmou que a relação de Pinheiro com o clube era de lucidez, lealdade, caráter, participação e abnegação. Ele lembrou que conheceu o amigo em um aeroporto em 1982, quando tinha 30 anos e teve seu primeiro assunto como advogado do Colorado: regularizar a situação do uruguaio Rubén Paz. “Indo a Brasília, encontrei no Aeroporto Ibsen Pinheiro. Ele não me conhecia. Eu o abordei, relatei o meu problema e ele imediatamente me acolheu, me ajudou, me levou para o seu apartamento e eu acabei ficando três dias hospedado lá tentando resolver esse problema. A partir daquele dia, solucionada a questão, possamos ser amigos e sempre devotarei a ele as melhores homenagens”, discursou.
Carvalho considerou que o político era um “colorado de cepa única” e foi indispensável para os gloriosos anos do clube na década de 1970. “Começou lá na década de 1960, criando um núcleo duro para pensar futebol de forma competitiva e enfrentar um adversário que ganhava há sete anos seguidos. Com sua ideais, com as ideias que ele defendia, nós conseguimos espantar esse grande adversário num momento de muita felicidade. Durante a década de 1970 essas mesma ideias prevaleceram e nós conseguimos nossas maiores vitórias em cima de tudo isso que ele pregava”, avaliou, lembrando que “teve o prazer e a satisfação de estar junto com as pessoas que o convidaram para voltar para o clube” em 1997.
“Seria a maneira que ele encontraria para seu retorno à visibilidade, ele que esteve no exílio voluntário a partir do seu ingresso novamente no Inter e passaria a ter uma vida normal, enfrentando a tudo e a todos como ele fez. A partir dali eu comecei a trabalhar com Ibsen e tive mais admiração por ele. Sua lucidez e pelo seu coloradismo, era um colorado de cepa única, sempre disposto a estar ao lado do clube e das direções”, ponderou.
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