(Luiz Fernando Janot - O Globo, 22) Deitado em berço esplêndido, o Rio vive um momento de profunda letargia. Bem que gostaria de elogiar suas qualidades, mas, do jeito que as coisas andam, seria apenas um devaneio. Não dá pra continuar enaltecendo o passado diante de um presente cada vez mais adverso. Críticas podem ser feitas ao ex-prefeito, menos acusá-lo de omissão. Acredito que se ele tivesse uma assessoria técnica capaz de orientá-lo em suas decisões, alguns problemas de obras teriam sido evitados. A ciclovia da Avenida Niemeyer é um bom exemplo.
Ao declarar que, se pudesse não a faria de novo, ele atribuiu o ocorrido aos fenômenos da natureza, quando, na verdade, a causa encontra-se na concepção do projeto. Se a ciclovia fosse acoplada à avenida, além de incorporar uma calçada para circulação dos moradores, ela teria uma estrutura capaz de suportar os impactos que a destruíram por duas vezes. Muitos problemas ocorridos em obras públicas se devem ao fato de o processo de licitação ter como referência apenas o projeto básico. Ao transferir para a empreiteira a responsabilidade pela elaboração do projeto executivo, abre-se espaço para os costumeiros reajustes de preço e os habituais desvios de conduta. Demolir ou recuperar a ciclovia, eis a questão que se apresenta para a prefeitura neste momento. Enquanto especulações são feitas, o prefeito parece atônito e sem saber o que fazer. A sua falta de iniciativa revela a dificuldade em lidar com problemas de uma cidade do porte do Rio de Janeiro. Para que não pareça uma acusação leviana, relaciono alguns fatos que comprovam tal afirmação: ruas repletas de buracos; calçadas ocupadas por vendedores ambulantes; conservação precária de praças e jardins; podas irresponsáveis de árvores; monumentos históricos relegados ao abandono; assaltos frequentes à luz do dia; e um crescente número de pessoas dormindo nas ruas.
Além dessas questões, temos que conviver com os frequentes alagamentos na cidade; com o BRT em estado precário; com rios e canais despejando esgoto nas lagoas e na Baía da Guanabara; com a falta de contenção das encostas; com favelas crescendo sem infraestrutura; com a expansão descontrolada de loteamentos e construções irregulares; e com o estigma da violência assombrando a cidade. Como se vê, não é pouca coisa. Para o Rio não sucumbir à degeneração progressiva, será necessário mobilizar os governos estadual e federal para atuarem solidariamente no aporte de recursos e meios para ajudar o município a enfrentar tal situação. É imprescindível que a sociedade se envolva nesse processo através de representações e organizações sociais e culturais.
O Porto Maravilha seria o local ideal para iniciar tal movimento. Principalmente, pelo fato de o plano para transformar aquela região em um sofisticado polo empresarial não ter logrado o sucesso desejado. Ademais, o modelo proposto se mostrou incompatível com a realidade da própria cidade. A legislação urbanística idealizada para gerar recursos para as obras de infraestrutura não atraiu investidores. A solução foi recorrer à Caixa Econômica para aportar recursos e levar o projeto adiante. Hoje, o desinteresse pela área se reflete na baixa ocupação e na má conservação dos espaços públicos.
Urge, portanto, rever o que foi planejado e encontrar uma alternativa viável para ocupar essa área. Estou seguro de que os usos habitacional e comercial são os mais indicados. Mas não se pode achar que a inserção aleatória de tais edificações será capaz de atender aos objetivos desejados. O plano existente precisa ser revisto, e um novo projeto de ocupação deve ser realizado.
Resta saber se o prefeito estará disposto a encarar mais esse desafio. A cidade precisa de mais gestão e menos demagogia. Não podemos continuar de braços cruzados esperando milagres que jamais acontecerão. Portanto, chegou a hora de o Rio despertar, sacudir a poeira e dar a volta por cima. Se possível, antes que seja tarde demais.
Para a cidade não sucumbir à degeneração progressiva, será necessário mobilizar os governos estadual e federal.
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