Ministros analisaram caso a partir de lei do RS
STF decidiu que sacrifício de animais em cultos religiosos é constitucional | Foto: Carlos Moura / SCO / STF / CP
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira que é constitucional a lei que permite o sacrifício ritual de animais em cultos de religião de matriz africana. Os ministros analisaram o tema através de uma lei estadual do Rio Grande do Sul que deixou expresso que é possível o sacrifício animal nessas situações. A autorização foi acrescentada no Código Estadual de Proteção aos animais, que veda agressão e crueldade.
O julgamento tinha sido iniciado em agosto do ano passado, com os votos do relator, ministro Marco Aurélio Mello, e do ministro Edson Fachin, cuja posição formou a maioria no julgamento desta quinta-feira. As divergências foram pontuais. Por exemplo, para Marco Aurélio, o sacrifício de animais seria aceitável caso a carne fosse direcionada ao consumo humano – observação que ficou vencida no plenário.
Por outro lado, por unanimidade, os ministros entenderam que a lei do Rio Grande do Sul que permite o sacrifício em ritual religioso é constitucional. A tese fixada ao fim do julgamento foi de que é “constitucional a lei de proteção animal que, a fim de resguardar a liberdade religiosa, permite o sacrifício ritual de animais em cultos de religião de matriz africana”.
“Queria deixar claro no pronunciamento do resultado que todos os votos foram no sentido de admitir nos ritos religiosos o sacrifício de animais. A corte entendeu que a lei do Rio Grande do Sul que permite o sacrifício em rituais religiosos é constitucional”, observou o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, ao pronunciar o resultado, que foi comemorado pelos praticantes das religiões de matriz africana que assistiam o julgamento do plenário.
Proteção
A maioria dos ministros destacou que a lei gaúcha não errou ao ter feito uma designação especial as religiões de matriz africana, uma vez que a menção se dá em um contexto de especial proteção às religiões de culturas que historicamente foram estigmatizadas. “Penso que a razão é que as religiões de matriz africana são as que têm sido historicamente vítimas de intolerância, discriminação e preconceito. Não penso que seja tratamento privilegiado”, observou o ministro Luís Roberto Barroso.
Primeiro a votar nesta quinta-feira – uma vez que foi responsável pelo pedido de vista que interrompeu o julgamento em agosto -, o ministro Alexandre de Moraes ressaltou que a oferenda dos alimentos, inclusive com a sacralização dos animais, “faz parte indispensável da ritualística das religiões de matriz africana”. “Impedir a sacralização seria manifestar claramente a interferência na liberdade religiosa”, considerou.
“Não se trata de sacrifício ou de sacralização para fins de entretenimento, mas sim para fins exercício de um direito fundamental que é a liberdade religiosa. Não existe tratamento cruel desses animais. Pelo contrário. A sacralização deve ser conduzida sem o sofrimento inútil do animal”, disse Barroso. “Me parece evidente que quando se trata do sacrifício de animais nesses cultos afros isso faz parte da liturgia, e portanto, está constitucionalmente protegido”, afirmou o ministro Ricardo Lewandowski.
Caso
O caso chegou ao Supremo através de um recurso do Ministério Público gaúcho, contra a previsão adicionada no código estadual. A decisão do plenário da Corte afeta apenas a lei do Rio Grande do Sul, mas expõe o entendimento dos ministros do STF, última palavra do Judiciário brasileiro, sobre o tema. Na ação apresentada em 2006, o MP estadual destacava que a previsão adicionada pela lei é desnecessária, já que a liberdade de religião é constitucionalmente garantida.
Quando o julgamento foi iniciado no ano passado, em nome do governo estadual, o procurador do Rio Grande do Sul Thiago Holanda Gonzalez afirmou que lei não traz nenhum prejuízo ao caráter laico do Estado. “A liberdade de culto dessas religiões decorre da Constituição. Mas a lei não é inócua. Ela retira o constrangimento às religiões de origem africana. O Rio Grande do Sul nunca permitiu a crueldade (com animais)”, afirmou.
Representante da União de Tendas de Umbanda e Candomblé do Brasil, o advogado Hédio Silva Júnior criticou a ação do Ministério Público estadual à época. “Parece que a vida de galinha de macumba vale mais do que a vida de milhares de jovens negros. É assim que coisa de preto é tratada no Brasil. A vida de preto não tem relevância nenhuma. A vida de preto não causa comoção social, não move instituições jurídicas. Mas a galinha da religião de preto, ah, essa vida tem que ser radicalmente protegida”, questionou na tribuna do Supremo.
Agência Estado e Correio do Povo
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