21 JAN ’19LUCAS BERLANZA
O Estadão deu publicidade a um jantar oferecido pelo ex-estrategista de Donald Trump, Steve Bannon, ao filósofo Olavo de Carvalho, familiares e amigos, em sua casa em Washington. O assunto “governo Bolsonaro” não poderia deixar de estar nos holofotes.
De acordo com a reportagem, Bannon demonstrou preocupação com o ministro da Economia, Paulo Guedes, a quem se referiu como “o cara de Chicago” – evidente alusão à Escola de Chicago, de nomes como Milton Friedman, a que o grande liberal do governo Bolsonaro pertence. Ele teria dito ainda que o mercado financeiro ama mais a Escola de Chicago que ao próprio Bolsonaro, como se tal fosse algo ruim, e quis saber se Olavo poderia influenciar o economista, ao que o brasileiro respondeu negativamente.
Steve Bannon é o articulador de uma iniciativa internacional chamada “O Movimento”, que procura reunir forças políticas vagamente descritas como “nacionalistas” e “populistas de direita”, que teriam em comum a oposição ao “globalismo”, a George Soros, à União Europeia e à força das instituições supranacionais.
O inimigo identificado por Bannon é real. Meu problema com sua receita é que ela é muito simples e associa, como se fossem aliados naturais, forças muito diferentes, se for baseada apenas nesse único critério. Teríamos de nos ver, por exemplo, ladeados da “democracia iliberal” de Viktor Órban, do nacionalismo protecionista da francesa Le Pen, entre outras correntes políticas com que não temos a menor afinidade.
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O próprio Bannon é influenciado por autores como Julis Evola e René Guenón, com ideias abertamente avessas a tudo quanto é moderno, ao liberalismo e à democracia. Um liberal conservador como eu, na expressão de autores como José Guilherme Merquior, é, por definição, um liberal, e por isso não negocia as características institucionais e econômicas do liberalismo em prol de meras seduções estéticas. Não sou um aliado natural de nenhuma dessas pessoas ou grupos; o inimigo do meu inimigo não é meu amigo.
Ao mesmo tempo, o jornalista José Fucs, também no Estadão, escreveu uma matéria com sua visão dos diferentes grupos que comporiam a base do governo Bolsonaro, classificando alguns dos membros dos primeiros escalões dentro desses grupos e descrevendo alguns dos conflitos já travados entre suas visões e estratégias. Os grupos seriam o dos militares, nem sempre muito afeitos às pretensões econômicas liberais; o dos políticos, como Onyx Lorenzoni; o dos “lavajatistas”, figuras ligadas à operação de combate à corrupção, como o ex-juiz Sérgio Moro; o dos evangélicos, basicamente restrito ao – desnecessário – Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos; o dos “olavistas”, com alunos e ideólogos ligados ao pensamento de Olavo de Carvalho; e, finalmente, o dos liberais, ligados a Paulo Guedes.
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Tenho minhas ressalvas a essas classificações, muito embora entenda que Fucs está classificando as forças do modo por que foram dispostas e colocadas onde estão. O professor Ricardo Vélez Rodríguez é um nome histórico do Instituto Liberal, entusiasta de Roberto Campos, por exemplo, mas está classificado como “olavista” porque teria sido em função de Olavo e seus representantes no governo que ele chegou ao cargo. O general Mourão igualmente é um militar, mas às vezes denota posições econômicas mais liberais que o próprio presidente. Não é como se esses grupos fossem tão perfeitamente estanques e incomunicáveis.
De todo modo, as duas reportagens deixam claro que existem, inevitavelmente, dada a gama plural da coalizão que elegeu Bolsonaro, grupos de interesse que não se coadunam tão bem com as nossas ideias. Se os grupos não são estanques, é inegável que geram atrito e calor, o que tem provocado confusão nessas duas dezenas de dias de governo. Forço-me a lembrar que, por exemplo, um dos filhos do presidente, Carlos Bolsonaro, já publicou diversas mensagens de ataque ao Movimento Brasil Livre, aos “liberais” como um todo, bem como já defendeu seu pai de um suposto desmerecimento frente a Paulo Guedes, como se o presidente e o ministro liberal estivessem em disputa.
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Será necessária firmeza na sustentação inegociável dos nossos pontos. Um dos mais importantes, que se faz imperativo firmar agora, é a agenda liberal de Paulo Guedes. Sem as reformas, a começar pela da Previdência, o país se inviabiliza. Sem reformas, sem governo.
Paulo Guedes e sua agenda precisam estar acima de quaisquer picuinhas. São urgentes e indispensáveis para o Brasil. O interesse nacional não é “avançar a agenda do nacionalismo econômico”. O interesse nacional é equacionar as contas, comercializar com o mundo inteiro, gerar riquezas e empregos. Tudo com sobriedade e respeito às leis e à democracia, o que é nada mais que o óbvio. Se o governo, ou setores dele, se afastarem desses pilares, teremos que marcar posição – com sabedoria, com senso de espírito público, mas teremos. Não abriremos mão do liberalismo de Paulo Guedes.
Lucas Berlanza
Jornalista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Lucas Berlanza é carioca, editor dos sites “Sentinela Lacerdista” e “Boletim da Liberdade” e autor do livro “Guia Bibliográfico da Nova Direita – 39 livros para compreender o fenômeno brasileiro”.
Instituto Liberal
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