Rômulo Bini Pereira (*)
Envolto em uma constante crise política, econômica e social sem precedentes, o Brasil terá, em outubro próximo, mais uma eleição geral, com inúmeros pré-candidatos de diversas posturas políticas e ideológicas. Nesses trinta anos da Nova República, eis que surge no cenário eleitoral, pela primeira vez, um candidato à Presidência oriundo do meio militar, que, de modo surpreendente, atinge e mantém índices significativos nas pesquisas eleitorais. Trata-se do Deputado Federal Jair Bolsonaro, capitão da reserva do Exército Brasileiro. Para os opositores dessa candidatura, esse resultado das pesquisas é um fato que deve ser combatido com críticas de toda ordem, por representar, segundo eles, um verdadeiro perigo de retorno ao regime militar.
Tornou-se corriqueiro nos últimos anos culpar o regime militar como sendo o grande responsável pelas constantes crises e desacertos políticos e sociais. Criou-se uma imagem de escuridão e de malignidade em tudo que se referia ao regime, com uma incidência ideológica das esquerdas brasileiras em artigos a respeito, como aconteceu agora, denegrindo presidentes militares, com base em documento de agência estrangeira (CIA), relativo a fatos supostamente ocorridos há mais de quarenta anos. O interessante é que tal agência sempre foi considerada como sendo o “Grande Satã” pelas esquerdas sul-americanas. Hoje, esse “oportuno memorando” tornou-se de alta e inquestionável credibilidade. Uma evolução surpreendente!
Os fatos positivos do período, tais como a modernização do País e conquistas sociais de relevância, raramente são assinalados e muito menos as virtudes e os predicados morais que os governos militares apresentaram em suas gestões: a honestidade, a probidade, a responsabilidade no trato da coisa pública, a grandeza de colocar os interesses do País em primeiro plano e a inadmissibilidade de atos de corrupção em todos níveis governamentais.
Dentre as razões da aceitação de Bolsonaro por parte da população, sobressai a sua integridade pessoal observada em sua longa vida parlamentar sem qualquer mancha ligada à corrupção. De seus opositores, inúmeros estão envolvidos nessa corrupção desenfreada que se alastra pelo Brasil, e há, inclusive, os que atuaram na luta armada fratricida. Estes, sob a capa de uma luta pela "democracia", desejam solertemente a instalação de regimes bolivarianos. Aliados a esses opositores, há artistas e intelectuais, bem como políticos receosos de perderem as benesses que lhes proporcionam o status quo da vida política atual.
Em data recente, cerca de setenta militares, pré-candidatos a cargos eletivos em todo o País, reuniram-se em Brasilia e adotaram como lema de suas campanhas: Ética, Moral e Honestidade. Possíveis atitudes radicais, em nenhum momento, foram postas em discussão e todos eles optaram por suas inclusões democráticas no processo eletivo que já começou.
O Comandante do Exército, por incontáveis vezes, declarou a predominância dos princípios da Constituição nas soluções políticas de problemas nacionais. Em seus pronunciamentos não existe uma assertiva sequer de adoção de medidas manu militari ou o apoio a crescentes clamores intervencionistas.
Destarte, desejar relacionar candidaturas militares, principalmente a do Bolsonaro, a um possível retorno ao regime militar é, ao mesmo tempo, uma falácia e uma leviandade. Um verdadeiro fantasma criado sub-repticiamente.
Por oportuno, cito o recente artigo transcrito neste jornal, edição de 05 maio, intitulado Volta à ditadura pelo voto, de autoria do jurista dr. Miguel Reale Junior, ex-Ministro da Justiça, quando expressa a sua opinião a respeito da candidatura de Bolsonaro. O articulista assegura que ela representaria um retorno dos militares ao poder. Com a devida vênia, discordo dessa afirmativa. Nos preâmbulos deste artigo apresento as minhas razões de discordância daqueles que consideram a candidatura de Bolsonaro um perigo para o regime democrático; e complementando, digo que ela representa, além de outros motivos, um protesto do povo contra os governos incompetentes e corruptos das três últimas décadas.
Como ex-Ministro da Justiça, o dr. Reale sabe muito bem o que os militares têm representado para a solução de problemas de toda ordem nos quais a ação governamental se mostra incapaz. No presente, cumprem duas missões relevantes: uma humanitária em Roraima, no acolhimento dos refugiados oriundos da bolivariana Venezuela e, outra na intervenção federal no Estado do Rio no setor de Segurança. Na Nova República o grande objetivo foi o de servir ao País, o que lhes têm dado uma credibilidade ímpar perante a opinião pública.
Ainda em seu artigo, o dr. Reale — como a profetizar um terror futuro e alertar aos que ele denominou de "ignorantes" do que foi o regime militar —, ressalta a sua participação na presidência da Comissão de Mortos e Desaparecidos. Sem dúvida, uma ação de alto grau humanitário, mas que deu origem à polêmica Comissão da Verdade por sua forma unilateral de interpretar fatos históricos. Foi uma comissão de verdade única e ideologicamente comprometida que proporcionou milhares de beneficiários de pensões vitalícias e polpudos proveitos a bancas advocatícias. A ideologia esquerdista, com isso, foi para as calendas.
Correndo risco de ser ousado, talvez seja mais válido voltar sua inteligência e notório saber jurídico, como no impeachment de Dilma Roussef, para o nosso débil sistema democrático, no qual os três Poderes da República estão desacreditados pela população brasileira. Este sim, um fato real.
Por fim, espero que o eminente jurista compreenda e aceite as candidaturas de militares, inclusive a de Bolsonaro, como uma opção democrática e legalmente apoiada na Constituição de 1988.
(*) General-de-Exército R/1, foi Chefe do Estado-Maior/Min Def.
O Estado de S. Paulo
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