Lado a lado com as autoridades e com apoio de tecnologia do século XXI, os cidadãos participam das buscas
Pelas ruas podem ser vistas muitas caminhonetes com socorristas ou carregadas de ajuda humanitária | Foto: Ronaldo Schemidt / AFP / CP
Sobram mãos para revirar os escombros, comida e água aparecem em abundância, assim como médicos e equipes de resgate, enquanto que estudantes universitários oferecem seus serviços para diminuir o sofrimento do terremoto sofrido no México. Como no terremoto de 1985, os mexicanos se organizam nas ruas no resgate de sua cidade. Assim que a terra tremeu às 13h14min do horário local (18h14min GMT, 15h14min horário de Brasília) de terça-feira derrubando dezenas de edifícios na capital, os civis reuniram forças e se lançaram na busca por sobreviventes.
Aos gritos tentavam encontrar sinais de vida entre os escombros. Logo se juntaram a socorristas, bombeiros, militares e policiais. Há exatos 32 anos, diante de um governo ausente após um terremoto de 8,1 que deixou mais de 10.000 mortos, os mexicanos se organizaram para levantar a megalópole de suas ruínas, transformando sua história social e política. Novamente, e lado a lado com as autoridades e com apoio de tecnologia do século XXI, os cidadãos participam do resgate.
Heróis anônimos
Nesta quarta-feira, nos escombros da escola primária Enrique Rebsamen, onde 21 crianças morreram, um civil voluntário sem treinamento algum foi determinante para resgatar uma menina presa por mais de 24 horas. Com seu porte pequeno, o voluntário conseguiu entrar em um estreito corredor da pilha de escombros para estabelecer contato com a menina e passar água. Milhares se ofereceram para escavar com as próprias mãos, mulheres levavam alimentos, água e equipamento médico. Estudantes universitários ofereciam seus serviços para atender feridos, avaliar edifícios danificados e dar ajuda psicológica.
"Cante e não chore"
A solidariedade se expandiu e, tanto na imprensa como nos locais afetados, pedia-se para que não enviassem mais alimentos perecíveis e que se selccionasse cuidadosamente os resgatistas voluntários. "Estamos perdendo comida, já não precisamos de água. Temos uma lista de materiais médicos que necessitamos", disse um militar em Condesa. "Não posso deixar você passar sem capacete", disse um chefe da Defesa Civil a um resgatista, que rapidamente conseguiu um e se enfiou nos escombros. Nas proximidades, passava uma mulher compartilhando sanduíches com voluntários, enquanto outros distribuíam água.
Um restaurante fechou as portas e decidiu distribuir alimentos gratuitamente. Pelas ruas podem ser vistas muitas caminhonetes com socorristas ou carregadas de ajuda humanitária. Na tragédia não faltam manifestações de alegria quando se consegue resgatar algum sobrevivente. Um grupo de voluntários entoava a todo pulmão o verso "cante e não chore" da popular canção "Cielito lindo".
Uma família incentivava os socorristas levantando cartazes com a frase "obrigada por sua ajuda" e a bandeira nacional é vista com frequência pelas ruas. Os cidadãos, muito críticos em relação aos militares desde que, em 2006, foram encarregados pelo combate ao narcotráfico, agora os reconhecem como parte do esforço de resgate.
Há 32 anos
A memória coletiva ditou os passos seguidos, pois os "chilangos", como são chamados os mexicanos da capital, viveram uma tragédia ainda maior com o terremoto de 19 de setembro de 1985, que deixou grande parte da cidade em ruínas. Há 32 anos, muitos iam para o trabalho quando subitamente patrões e operários se transformaram em socorristas improvisados que se metiam em edifícios, hospitais e escritórios em busca de sobreviventes. Surgiram os "Topos", valentes homens que se metiam em buracos estreitos e viajaram para todos os continentes para auxiliar nos desastres.
Eram outros tempos, as comunicações entraram em colapso, isolando o México do resto do mundo, sem serviço de telefonia. O então presidente Miguel de la Madrid ficou horas sem aparecer. Os mexicanos se sentiram abandonados. Dos escombros desse terremoto surgiu uma sociedade civil organizada, transformada em uma forte voz crítica e foram cimentadas as bases da Defesa Civil no México, sacudido com frequência por terremotos e arrasado por furacões.
"Compartilhem sua internet!"
O WhatsApp se tornou na terça-feira o único canal de comunicação. Serviu para que os mexicanos na capital soubessem de seus amigos e familiares e para alertar sobre as situações de risco. Mas o aplicativo foi usado sobretudo para localizar desaparecidos. "Compartilhem sua internet no celular, tirem a senha para que as pessoas presas se conectem", pediram nos edifícios colapsados. Correspondentes estrangeiros enviaram por WhatsApp os pormenores da tragédia.
Em 1985, a imprensa estrangeira pôde começar a informar no dia 20 de setembro, quando o mundo achava que a capital e seus 10 milhões de habitantes tinham desaparecido. "Enviávamos por telex no clube de correspondentes. Havia quatro e só podiam ser ocupados por 10 minutos", lembra Omar Torres, fotógrafo da AFP no México, que cobriu os dois violentos terremotos.
AFP e Correio do Povo
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