Do UOL, em São Paulo
Paula Giolito/Folhapress
O ex-governador Sérgio Cabral e sua mulher, Adriana Ancelmo, em evento de 2011
Na sentença em que condenou o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB-RJ) a 45 anos e dois meses de prisão e a mulher dele, Adriana Ancelmo, a 18 anos e três meses de reclusão, o juiz Marcelo Brêtas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, apontou que a ex-primeira-dama do Rio era "mentora", ao lado do marido, dos crimes pelos quais eles foram acusados.
Tanto Cabral quanto Adriana foram condenados por organização criminosa e lavagem de dinheiro. O ex-governador também foi sentenciado pelo crime de corrupção passiva.
"A condenada Adriana Ancelmo era, ao lado de seu marido, mentora de esquemas ilícitos perscrutados nestes autos", aponta Brêtas. "Adriana Ancelmo, companheira de Sergio Cabral, integrou o núcleo financeiro-operacional da organização e atuou, essencialmente, na lavagem do dinheiro espúrio angariado pela organização, seja através da aquisição dissimulada de joias de alto valor, amplamente comprovada nos autos, seja através de seu escritório, Ancelmo Advogados, valendo-se clássica modalidade de celebração de contratos fictícios".
Segundo a denúncia, empresas de consultoria e a banca de advocacia chefiada por Adriana lavavam dinheiro de corrupção obtido pela organização criminosa por meio de contratos fictícios.
"A arquitetura criminosa montada na intimidade de seu escritório de advocacia era de muito difícil detecção, e não por acaso durante muitos anos esta condenada logrou evitar fossem tais esquemas criminosos descobertos e reprimidos", diz o magistrado.
"Não bastava à organização criminosa em questão receber muitos milhões em propinas. Havia a necessidade de dissimular a ilegalidade de tais recursos, conferindo aos mesmos uma aparência de legalidade, e essa era exatamente a função assumida pela condenada Adriana Ancelmo na estrutura da ORCRIM [organização criminosa]", segue Brêtas.
Parece óbvio que a tarefa a cargo desta condenada era da maior relevância, seja pela função de promover a lavagem de dinheiro seja pelo seu relacionamento íntimo com o mentor dessa organização criminosa, e por isso a sua culpabilidade é extrema
Marcelo Brêtas, juiz
No despacho, Brêtas diz que a postura de Adriana como advogada envergonha o direito brasileiro. "Seu comportamento vergonhoso tem ainda o potencial de macular a imagem da advocacia nacional, posto que sua atividade e sua estrutura profissional foram utilizadas nesta prática criminosa", aponta.
"Prazeres proporcionados pelo dinheiro"
O juiz Marcelo Brêtas também diz em sua decisão que Adriana Ancelmo e Sérgio Cabral usufruíram de benefícios oriundos da propina e enganaram os eleitores do Rio. O magistrado critica a postura do casal e sua ostentação.
"Ao lado de seu marido, ora apenado, [Adriana] usufruiu como poucas pessoas no mundo os prazeres e excentricidades que o dinheiro pode proporcionar, quase sempre a partir dos recebimentos que recebeu por contratos fraudulentos celebrados por seu escritório de advocacia, com o fim de propiciar que a organização criminosa que integrava promovesse a lavagem de capitais que, em sua origem, eram fruto de negócios espúrios.", indica o juiz.
"Juntamente com o então ex-governador, também condenado, a apenada Adriana Ancelmo não raras vezes desfilou com pompa ostentando o título de primeira dama do Estado do Rio de Janeiro, na mesma época em que recebia vultosas quantias 'desviadas' dos cofres públicos, com lastro em documentos forjados para dissimular a origem ilícita", diz Brêtas.
Joias da família Cabral estão entre os objetos de luxo apreendidos pela Lava
Jato
Veja Álbum de fotosO magistrado aponta na conclusão que grande parte dos crimes de lavagem de dinheiro cometidos por Cabral e Adriana se deu na compra de joias, sem nota fiscal nem comprovante de venda, no valor total de R$ 6.562.270,00.
A circunstância das joias terem sido compradas em datas comemorativas não desconfigura o crime de lavagem, afinal 'Se alguém adquire com valores ilícitos joias sem qualquer registro tanto do pagamento (em espécie) quanto da transação (sem nota fiscal), mas a presenteia a sua mulher, ocultando completamente a origem desse valor ilícito, há crime de lavagem'
"Diante desse quadro, outra não pode ser a conclusão senão a de que Sérgio Cabral e Adriana Ancelmo, de forma consciente e deliberada, com o auxílio operacional de Carlos Miranda e Carlos Bezerra, promoveram a lavagem do dinheiro espúrio oriundo do esquema de corrupção arquitetado por Cabral, através da aquisição dissimulada de joias de alto padrão e valor perante as joalherias H Stern e Antonio Bernardo", conclui o juiz.
No processo, Cabral, Adriana Ancelmo e outras 11 pessoas eram acusados pelo Ministério Público Federal de terem desviado cerca de R$ 224 milhões de contratos do governo do Estado desde 2007, quando Cabral assumiu o cargo. Apenas Pedro Ramos de Miranda foi absolvido, todos os outros foram condenados.
Somente as construtoras Andrade Gutierrez e Carioca Engenharia teriam repassado R$ 30 milhões ao esquema, referentes a obras como a reforma do estádio do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014 e a construção do Arco Metropolitano, em troca de aditivos em contratos públicos e incentivos fiscais. De acordo com o MPF, Cabral recebia 5% do valor de contratos da Andrade. O dinheiro apontado como propina teria sido lavado em compra de joias e despesas de luxo.
Veja as penas definidas por Brêtas para todos os réus:
- Sérgio Cabral, ex-governador, condenado a 45 anos e dois meses de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa;
- Adriana Ancelmo, ex-primeira-dama, condenada a 18 anos e três meses de prisão por lavagem de dinheiro e associação criminosa;
- Wilson Carlos, ex-secretário de governo, condenado a 34 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa;
- Hudson Braga, ex-secretário de governo, condenado a 27 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa;
- Carlos Miranda, operador, condenado a 25 anos de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa;
- Carlos Bezerra, auxiliar de Carlos Miranda, condenado a seis anos e meio por lavagem de dinheiro e organização criminosa;
- Wagner Jordão, operador financeiro, condenado a 12 anos e dois meses por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa;
- Paulo Pinto, auxiliar de Cabral, condenado a nove anos e quatro meses de prisão por lavagem de dinheiro e organização criminosa;
- José Orlando, operador, condenado a quatro anos e um mês por associação criminosa;
- Luiz Paulo Reis, auxiliar de Hudson Braga, condenado a cinco anos e dez meses por lavagem de dinheiro;
- Carlos Jardim, auxiliar de Cabral, condenado a cinco anos e três meses por lavagem de dinheiro;
- Luiz Igayara, auxiliar de Cabral e Adriana Ancelmo e que tem acordo de delação, foi condenado a três anos de prestação de serviços em substituição à pena de cinco anos e três meses de prisão
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