Felipe Amorim
Do UOL, em Brasília
Após quatro sessões de julgamento, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, por oito votos a três, nesta quinta-feira (29) que o tribunal não pode revisar as cláusulas dos acordos de colaboração premiada depois de homologados (validados) pelo ministro-relator a não ser que surjam fatos novos que possam levar à conclusão de que a assinatura do acordo foi feita de forma irregular, por exemplo, caso os delatores não tenham firmado a colaboração espontaneamente.
Votaram nesse sentido oito dos 11 ministros: Edson Fachin, relator, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Celso de Mello, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.
Os ministros Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello foram contra a proposta, por entenderem que o Supremo tem autonomia na fase de julgamento para analisar todos os elementos do processo, incluindo as cláusulas do acordo de colaboração.
Na sessão anterior de julgamento, o ministro Ricardo Lewandowski havia votado a favor de que o tribunal possa analisar a legalidade do acordo de colaboração mesmo após sua homologação. Ele não estava presente na sessão desta quinta.
A decisão vale em tese apenas para o processo em julgamento, que trata das delações da JBS. Mas é esperado que o julgamento se torne referência para outros casos, já que o STF é a instância mais alta do Judiciário.
Janot diz que decisão é "histórica"
Após o STF definir o resultado, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou que esta é uma decisão histórica e que reforça as delações premiadas.
"Essa decisão é uma decisão histórica. Fortalece e muito o instituto da colaboração premiada", disse.
"O recado que se passa hoje de forma clara é que os acordos firmados, desde que obedeçam à legalidade e que o colaborador cumpra todas as condições a que se comprometeu no acordo, esse acordo será mantido", afirmou Janot.
STF mantém Fachin relator da JBS
O STF entrou hoje na quarta sessão dedicada a julgar se depois de homologadas (validadas) as cláusulas do acordo de delação podem ser revistas pela Justiça na fase de julgamento dos processos. Além dos termos da delação, os ministro também debatarem outros dois pontos:
Por unanimidade, os 11 ministros do STF decidiram que o ministro Edson Fachin deve permanecer como relator do caso.
GILMAR MENDES CRITICA HOMOLOGAÇÃO DE DELAÇÕES NO STF, E FUX REBATE
Por 9 votos a 2, os ministros decidiram que a decisão sobre a homologação é do relator -- havia a proposta de que o acordo deveria passar pelo plenário ou pelas turmas (colegiado de cinco ministros que julga processos que não vão a plenário), mas este entendimento foi vencido.
Num acordo de colaboração premiada, o Ministério Público negocia com os delatores benefícios processuais, como condenações mais brandas, em troca da delação de crimes e da apresentação de provas.
O ato da homologação, feito por um juiz ou ministro (quando a delação é levada ao STF), é o que dá validade jurídica ao acordo. A partir desse ponto os depoimentos e provas já podem ser usados em investigações.
O ministro Edson Fachin defende que os termos negociados pelo Ministério Público e homologados pelo relator não podem ser revisadas no momento que o processo for a julgamento.
"O acordo homologado, verificado quanto à legalidade, regularidade e espontaneidade, gera vinculação condicionada ao cumprimento dos deveres assumidos na colaboração", disse Fachin.
Permitir a análise da legalidade das cláusulas da delação no julgamento do processo poderia, por exemplo, levar até mesmo à anulação do acordo. A anulação do acordo, no entanto, não leva diretamente à anulação das provas e depoimentos dos delatores.
A possibilidade de revisão dos termos dos acordos é vista por membros do Ministério Público como uma ameaça às investigações, por em tese desencorajar que novas delações sejam firmadas.
A posição de Fachin é de que, no momento do julgamento, o Supremo deve apenas analisar a chamada eficácia do acordo. Ou seja, se os delatores cumpriram o acordado e merecem receber os benefícios negociados com o Ministério Público.
Por exemplo, caso os delatores tenham mentido ou entregado provas que não ajudaram nas investigações, eles podem perder o direito aos benefícios do acordo, como redução de pena ou cumprimento da condenação em regimes mais brandos, como o domiciliar.
Citados na JBS contestam Fachin
O caso foi a julgamento pelo Supremo após citados nas delações contestarem o poder de Fachin para validar o acordo da JBS.
O governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), entrou com recurso alegando que, como as suspeitas contra ele não tinham relação com a Operação Lava Jato, Fachin não poderia ter homologado essa parte da delação. O ministro é relator no Supremo dos processos sobre corrupção na Petrobras.
O advogado de Azambuja e o defensor do ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) também afirmaram, em sessão na semana passada, que o acordo conteria cláusula ilegal e não poderia ser validado por Fachin.
Eles alegam que os donos do grupo JBS, Joesley e Wesley Batista, são líderes de uma organização criminosa, o que, por lei, impediria que eles recebessem o benefício da imunidade processual, ou seja, não fossem processados pelos crimes que delataram.
A garantia de imunidade negociada com a PGR (Procuradoria-Geral da República) tem sido criticada por investigados, como o presidente Michel Temer (PMDB), alvo de uma denúncia por corrupção junto com Rocha Loures.
Em pronunciamento na última terça-feira (27), Temer chamou de "benevolente" o acordo.
"Basta verificar o que aconteceu ao longo desses dois, três últimos anos para saber que ninguém saiu com tanta impunidade", disse o presidente.
A delação da JBS levou à investigação contra o presidente Michel Temer por corrupção, obstrução de Justiça e organização criminosa, e também contra o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG), por corrupção, obstrução de Justiça e lavagem de dinheiro.
Temer e Aécio negam a prática de qualquer irregularidade.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tem defendido a garantia da imunidade aos Batista, sob o argumento de que eles entregaram provas de "crimes graves" e levaram à investigação contra um senador, um procurador da República e revelaram pagamentos suspeitos a 1.893 políticos.
Janot defende que a possibilidade de rever por decisão judicial posterior o ato de validação dos acordos de colaboração representaria um "golpe de morte" para as delações premiadas, já que, dessa forma, não haveria segurança aos delatores de que os benefícios acertados em troca da confissão seriam cumpridos.
UOL Notícias
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