Depoimento do dono da OAS, Léo Pinheiro, ao juiz Sergio Moro é arrebatador: sacramenta que Lula se aproximou de empreiteiros poderosos para obter favores pessoais, em troca de vantagens nos governos do PT. O empresário confirmou que o tríplex é do petista e disse que, durante uma reunião secreta em maio de 2014, o ex-presidente pediu para que ele destruísse provas da Lava Jato.
Lula a Léo Pinheiro: “Destrua as provas”
Se os depoimentos de Emilio e Marcelo Odebrecht tiveram o condão de transformar o ex-presidente Lula num político menor, quase um fantoche, capaz de leiloar a alma a quem sempre chamou pejorativamente de “elite”, o contundente relato do sócio da OAS, José Adelmário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, ao juiz Sergio Moro na tarde de quinta-feira 20, em Curitiba, consolidou no petista – de maneira indelével – o perfil de um sujeito que nunca teve pudores em cultivar uma relação espúria com empreiteiros em troca de propinas, favores pessoais e benesses aos seus familiares. Na essência, o roteiro é semelhante – face de uma mesma moeda. A exemplo do que ocorreu com a família Odebrecht, Lula também se aproximou de Leo Pinheiro há cerca de 40 anos. O combustível da relação foram os interesses particulares de cada um. A amizade floresceu diante da expectativa de poder gerada pelo petista e das vantagens financeiras e do conforto que o empreiteiro conseguia lhe proporcionar. Até que Lula virou presidente e o público se confundiu com o privado. Como contrapartida às vantagens oferecidas à OAS nos governos do PT, o petista engordou as arcas do partido, financiou campanhas, mas sobretudo embolsou dinheiro, incrementou o patrimônio e deu um “up” na qualidade de vida. O ápice ocorreu entre 2009 e 2010, quando Leo Pinheiro disponibilizou o tríplex defronte ao mar do Guarujá para a família Lula da Silva.
RETA FINAL Agora só falta o juiz Sergio Moro ouvir Lula dia 3 de maio e dar a sentença
Segundo o empresário contou a Sergio Moro, o imóvel foi um regalo para o ex-presidente, conforme antecipou ISTOÉ com exclusividade em sua última edição. O apartamento fez parte dos R$ 87,6 milhões em propinas que a construtora pagou ao partido e a Lula, em troca dos R$ 6,7 bilhões em obras que a empreiteira realizou no governo petista, de 2003 a 2015, com estarrecedora dose de corrupção e, claro, com as bênçãos do morubixaba petista. Perguntado por Moro se alguma vez havia falado com Lula sobre o pagamento de propinas, Pinheiro disse que “sim”. O empreiteiro foi além: disse durante o depoimento em Curitiba que, em uma reunião secreta realizada em maio de 2014, foi orientado pelo ex-presidente a destruir provas capazes de incriminá-lo na Lava Jato. Em um dado momento da reunião, o petista perguntou ao empresário se ele efetuou pagamentos para o PT “no Brasil ou no exterior”. Pinheiro respondeu: “no Brasil”, acrescentando que a contabilidade desses valores estava a cargo de João Vaccari, ex-tesoureiro petista. Ao que Lula imediatamente ordenou: “destrua essas provas”.
O empresário foi ouvido por Moro em Curitiba na ação em que tanto ele quanto Lula são réus por corrupção. O processo envolve também o transporte e armazenamento dos bens do ex-presidente de Brasília para São Paulo, quando ele deixou a Presidência em 2011. No total, a OAS deu R$ 3,7 milhões a Lula. Sendo R$ 1,1 milhão para adquirir o tríplex, R$ 926 mil na reforma do apartamento, R$ 350 mil na aquisição da cozinha junto a Kitchens para equipar o imóvel e outros R$ 1,3 milhão pagos à Granero para transportar e armazenar a mudança de Lula – uma parte do material, como uma adega de vinhos, foi levada para o sitio de Atibaia. Ao acusar Lula e Léo Pinheiro de corrupção, o Ministério Público Federal disse que todas essas operações financeiras foram resultado de dinheiro desviado da Petrobras e pagas como propinas ao ex-presidente.
Além de escancarar a relação promíscua com a fina flor do empresariado nacional, as revelações de Pinheiro a Moro a respeito do tríplex devem render a Lula a primeira condenação por corrupção ainda em maio. No próximo dia 3, o petista ficará frente a frente com o juiz, quando mais uma vez abusará do malabarismo verbal na tentativa de se defender do indefensável. As provas colhidas até agora pelos investigadores são irrefutáveis. Mesmo assim, depois dessa etapa, o juiz cumprirá a liturgia usual: abrirá prazo de 15 dias para as teses dos advogados de defesa e do Ministério Público e concluirá a sentença.
PROTESTO CONTRA O IMÓVEL DE LULA Em março de 2016, manifestantes protestam contra o tríplex doado a Lula, gritando palavras de ordem
O “Brahma”
As relações de Lula com Léo Pinheiro transcendem ao tríplex. Começaram na década de 80, quando o petista despontou em meio às greves no ABC e desabrochou para a política. O empresário foi um dos patrocinadores das primeiras campanhas lulistas, inclusive a que ele disputou contra Fernando Collor de Mello, e perdeu. A eleição para o primeiro mandato de Lula também foi financiada com dinheiro da OAS, mas o relacionamento amadureceu mesmo no segundo governo petista. Depois que o ex-presidente deixou o poder, em 2011, os contatos que já eram frequentes foram intensificados. Segundo pessoas próximas a ambos, Léo Pinheiro gostava de tomar a famosa cachacinha com Lula no cair da tarde. Nos dias mais quentes, não dispensavam a cerveja. Não por acaso, Pinheiro se referia a Lula como “Brahma” nas conversas em que mantinha com outros diretores da OAS e cujas mensagens foram interceptadas pela Polícia Federal.
Em uma das mensagens, Léo Pinheiro disse a um de seus funcionários que iria levar “Brahma” para o Chile, onde a OAS mantinha interesses comerciais. A viagem aconteceu entre 24 e 26 de novembro de 2013. Para aproveitar o programa, Lula fez uma palestra a empresários chilenos. “Léo (diz Cesar Uzeda, diretor da área internacional da OAS), colocamos o avião à disposição de Lula para sair amanhã ao meio dia. Seria bom você checar com Paulo Okamoto (presidente do Instituto Lula) se é conveniente irmos no mesmo avião”. Nessas viagens promocionais da companhia, a OAS oferecia a Lula a possibilidade de encher os bolsos. Em 2011, quando a empresa decidiu ingressar no mercado da Costa Rica, Léo Pinheiro pediu que Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula, “encaixasse” o ex-presidente numa palestra para empresários costa-riquenhos. Resultado: Lula recebeu a bagatela de R$ 200 mil pela palestra em São José, capital da Costa Rica. Em outra mensagem interceptada pela PF, em 7 de janeiro de 2014, às vésperas da deflagração da Operação Lava Jato, Pinheiro indica que Lula poderá repetir a agenda no Uruguai, país onde a empreiteira também era muito requisitada. “A viagem pode ser em fevereiro. Veja com o Diego quando seria melhor”.
INSTITUTO LULA As empreiteiras pagaram R$ 55 milhões ao Instituto Lula e a Luiz Inácio Lula da Silva Palestras de 2011 a 2014. Desse valor, R$ 7,5 milhões foi parar no bolso de Lula. Boa parte desse dinheiro veio da OAS e Odebrecht
Em troca dos préstimos da OAS, Lula se comprometeu a ajudar a empreiteira a abrir novas frentes não apenas no Brasil como além-mar. Como, por exemplo, estreitar laços empresariais com nações africanas, por onde o petista sempre transitou com desenvoltura. Atuando como uma espécie de embaixador da OAS mundo afora, Lula foi bem sucedido. Os números são eloqüentes. Até meados de 2008, a empreiteira engatinhava no mercado internacional. Com a ajuda de Lula, a empresa passou a ter 14 escritórios no exterior e a tocar 20 grandes obras fora do País. Como Lula fez isso quando ainda estava no governo, essa ação é tipificada como crime de tráfico de influência. “Brahma” também ajudou a OAS a fechar um negócio de R$ 1 bilhão na Guiné Equatorial. Trata-se da construção de uma estrada de 51 quilômetros ligando a capital Malabo à cidade de Luba, dois dos principais portos do país africano. A obra estava avaliada em US$ 320 milhões. De acordo com a Polícia Federal, o próprio Léo Pinheiro indica – em mensagem enviada para o então diretor de Relações Institucionais da OAS, Jorge Fortes, em 31 de janeiro de 2013, – que Lula fez lobby pela obra junto ao ditador Teodoro Obiang, no poder há 37 anos. Obiang se aproximou de Lula quando ele virou presidente e decidiu incrementar as relações do Brasil com os países africanos.
Nuances da promíscua relação entre Pinheiro e Lula foram esmiuçadas pelo próprio empreiteiro em agosto de 2016, quando ele esboçou um acordo de delação premiada com o a Procuradoria-Geral da República (PGR). As negociações para a colaboração com a Justiça, no entanto, acabaram sendo descartadas pelo procurador Rodrigo Janot, sob o argumento de que o teor de parte dos setenta anexos havia vazado antes mesmo de o seu conteúdo chegar ao conhecimento do Ministério Público Federal. Agora, com o contundente depoimento a Moro, o sócio da OAS alimenta a expectativa de assinar um novo acordo, que lhe permita reduzir a pena de 26 anos de prisão.
O ARMAZÉM A OAS pagou R$ 1,3 milhão à Granero para ela transportar e armazenar os bens pessoais do ex-presidente em São Paulo. Os vinhos foram para o sítio de Atibaia
Tríplex é prova irrefutável
A negociação envolvendo o tríplex, contudo, é a demonstração cabal de como Lula não só gostava de embolsar gordas propinas e dinheiro de caixa dois para o PT, como também se refestelava com os mimos ofertados pelos empreiteiros. A história teve início em setembro de 2009, quando a Bancoop quebrou, deixando centenas de famílias, que haviam investido seu suado dinheiro nos imóveis da Cooperativa Habitacional dos Bancários, ao relento. Menos, claro, a de Lula. Na ocasião, a entidade era presidida por João Vaccari, então tesoureiro do PT, hoje preso em Curitiba. Ainda como presidente da Bancoop, Vaccari transferiu para a OAS a incumbência de concluir as obras do Edifício Solaris, no Guarujá, onde Lula e dona Marisa Letícia tinham um apartamento e pelo qual já haviam pago R$ 209.119,73. Numa das reuniões com a empreiteira, Vaccari revelou ao presidente da OAS, Léo Pinheiro, que Lula possuía um imóvel no prédio. Tratava-se da unidade 141, um apartamentinho simples. Para agradar Lula, que na ocasião ainda era presidente da República, a OAS resolveu destinar-lhe a cobertura 164-A, assumindo a diferença de R$ 1,147 milhão que variava de um imóvel para outro. Segundo relatos dos construtores, Lula e Marisa amaram o presente, pois sempre quiseram ter apartamento na praia, “tipo pé na areia”. Na delação premiada entabulada por Léo Pinheiro em agosto do ano passado, e que foi incinerada por Janot, o empresário diz que acertou com Vaccari que o apartamento de Lula seria “abatido dos créditos que o PT tinha a receber por conta das propinas em obras da OAS na Petrobras”. “Perguntei ao João Vaccari se o ex-presidente tinha conhecimento de que o tríplex era fruto dos desvios na Petrobras. Ele respondeu positivamente”, disse Léo Pinheiro num dos sete anexos da primeira delação.
O CAIXA DE LULA Paulo Okamoto participou da operação do tríplex
A ocultação
O apartamento, no entanto, permaneceu em nome da OAS. O acerto era que a propriedade seria transferida mais tarde para o casal, depois que Lula deixasse a Presidência. De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal, a partir de 31 de agosto de 2013, com a conclusão das obras no edifício, Lula e Marisa passaram a “ocultar a propriedade”, o que caracteriza crime de lavagem de dinheiro. “Cientes da disponibilização do imóvel ao casal e da necessidade de lhe conferir acabamento, Léo Pinheiro, Paulo Gordilho, Fábio Yonamine e Roberto Moreira (todos executivos da OAS) agiram para que não só a propriedade do tríplex continuasse oculta, como também para que as reformas e decoração fossem realizadas e custeadas pela OAS, permitindo que Lula e Marisa Letícia recebessem tais vantagens de forma encoberta”. As reformas foram feitas em 2014, incluindo a instalação do elevador. As obras foram feitas pela Tallento Construtora e pagas pela OAS, no valor de R$ 926 mil. Engenheiros da OAS disseram aos procuradores que Lula e dona Marisa estiveram no apartamento no começo de 2014, para decidirem as alterações ao projeto original. No dia 2 de fevereiro de 2014, a PF resgatou uma mensagem de texto a partir de uma conversa mantida entre Léo Pinheiro e Paulo Gordilho. “O projeto da cozinha do chefe tá pronto. Se marcar com a madame pode ser a hora que quiser”, disse Gordilho, falando sobre as reformas no sítio de Atibaia. “Vou confirmar. Seria bom também ver se o de Guarujá está pronto”, respondeu Léo Pinheiro, aproveitando para falar também sobre as obras no tríplex.
Todas as reformas no apartamento no Guarujá foram supervisionadas por Marisa Letícia e seu filho Lulinha. O dono da Tallento, Carlos Augusto Curiati Bueno, confirmou ao MPF que ao final das obras, em agosto de 2014, uma reunião foi realizada no imóvel com a participação de dona Marisa, Lulinha e Léo Pinheiro. Os procuradores destacam no processo que a OAS se beneficiou amplamente dos ilícitos praticados contra a Petrobras. “Léo Pinheiro era bastante próximo de Lula. Significativas nesse cenário foram as visitas ao tríplex. Na primeira oportunidade Lula e Marisa Letícia foram acompanhados por Léo Pinheiro e outros executivos da OAS logo que o projeto foi personalizado e executado”, reforça o MPF na denúncia aceita pelo juiz Sergio Moro. No meio jurídico, todos são unânimes em afirmar que o tríplex está para Lula assim como a sonegação de imposto esteve para Al Capone. Ou seja, o petista está bem próximo de ser condenado por um crime menor, entre tantos outros mais graves que indiscutivelmente cometeu.
O sítio dos “laranjas”
Advogado é acusado de fazer contrato frio para reforma no sítio de Atibaia
O sítio Santa Bárbara, em Atibaia, atribuído ao ex-presidente Lula, é um verdadeiro laranjal. Que o imóvel seria de Lula, mas está em nome de Jonas Suassuna e Fernando Bittar, dois amigos de Fábio Luiz Lula da Silva, todo mundo já sabia. Na última semana, o engenheiro Emyr Costa, da Odebrecht, acrescentou elementos bombásticos ao caso. Disse que a Odebrecht lhe deu R$ 500 mil em dinheiro vivo para tocar as reformas no sítio, mas que a empresa não poderia aparecer. Quem tocava os trabalhos era uma empreiteira subcontratada. Ele contou à Procuradoria-Geral da República que chegou a comprar um cofre para guardar a dinheirama em espécie. Segundo ele, Roberto Teixeira redigiu um contrato fictício entre Bittar e Carlos Rodrigo do Brato para que as obras fossem feitas. E colocou o valor de apenas R$ 150 mil para ficar compatível com os rendimentos de Bittar. A delação derrete a tentativa de defesa de Lula. Em seu depoimento, Emílio Odebrecht confirmou que gastou R$ 700 mil na obra a pedido de dona Marisa para fazer uma “surpresa a Lula”.
Sempre perto da elite
Desde cedo, Lula se aproximou dos empresários para obter benesses
Os depoimentos dos empreiteiros, ao revelar que Lula sempre recebeu favores, quando não foram gordas propinas, expõe o perfil do ex-presidente como um homem afeito à receber mimos de empresários. O primeiro bem-feitor de Lula, que lhe pagava desde festas de aniversário em restaurantes em São Bernardo, à cessão de casa para moradia, sem nada pagar em troca, foi o advogado Roberto Teixeira. O advogado chegou a colocar à disposição de Lula um carro com motorista. Além de Teixeira, também os empresários Jonas Suassuna e Fernando Bittar emprestaram seus nomes para Lula adquirir o sítio de Atibaia. Fernando é filho de Jacó Bittar, ex-prefeito de Campinas, e muito amigo de Lula. Mas Lula não recebia só pequenos favores dos empresários. Voava em aviões emprestados por eles e recebia propinas das empresas, como mostraram os empreiteiros Emilio Odebrecht e Léo Pinheiro. Todos financiaram as campanhas do petista com caixa 2. Emílio chegou a dizer em sua delação que Lula sempre pediu favores. A empresa pagava mesada a seu irmão, ajudou seu filho a criar um campeonato de futebol americano e deu dinheiro para seu sobrinho em negócios em Angola. A hábito do cachimbo faz a boca torta.
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