quarta-feira, 1 de março de 2017

Trechos selecionados do “Primeiro Discurso contra Felipe” de Demóstenes

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Orador grego conclama atenienses a enfrentar líder macedônio

Demóstenes é o maior exemplo do que a arte da oratória não é um dom inato, mas que pode ser aprendida pelo estudo e pela prática. O maior orador da Grécia fracassou redondamente na sua primeira tentativa de falar em público.

Segundo Plutarco (Vidas):

Quando ele, por primeira vez, dirigiu-se ao público, colheu muitas desilusões, tendo sido objeto de riso, por seu estilo estranho e grosseiro, sobrecarregado de longos períodos, e torturado por argumentos formais, levados aos mais cansativos e desagradáveis excessos. Além disso, ele possuía, segundo se diz, uma fraqueza na sua voz, uma expressão verbal perplexa e sem distinção e uma respiração curta que, ao quebrar e interromper suas sentenças obscurecia muito o sentido e o significado do que falava.”

De acordo com o mesmo Plutarco, houve uma vez em que a assembleia recusou-se a ouvi-lo... A luz veio por meio de Sátiro, o ator, que deu-lhe a primeira lição, mandando-o declamar alguma passagem de Sófocles ou Eurípedes, para, a seguir, declamar a mesma passagem, mostrando-lhe como fazê-lo.

Depois disso, Demóstenes construiu um lugar para estudo numa caverna e para ali vinha, todos os dias para treinar oratória e exercitar a sua voz. Lá permanecia, por vezes por dois ou três meses sem internação, raspando o cabelo de metade da cabeça, para que, por vergonha, não se afastasse da sua caverna.

Adquriu também, o hábito de nas conversas e negócios em que se envolvia, revia cuidadosamente, depois que seu interlocutor havia partido, tudo o que havia sido dito, organizando este material sob a forma de argumentos e concebendo as razões que se podiam sustentar contra ou a favor daqueles argumentos. O mesmo fazia com os discursos proferidos na assembleia.

Os meios que ele encontrou para corrigir os defeitos e limitações do seu corpo foram os seguintes, segundo relato do próprio Demóstenes, quando velho, a Demetrius:

Sua pronúncia desarticulada e sua gagueira, superou, treinando sua fala com a boca cheia de pequenos seixos; disciplinou sua voz declamando e recitando discursos ou versos, quando se encontrava sem fôlego, por subir correndo as elevações do terreno; e sua postura e gestos, trinou forte diante de um espelho grande que mandou fazer”

(Plutarco – Vidas)

Plutarco conclui este relato com uma frase definitiva:

Assim foi que Demóstenes era encarado como uma pessoa sem grande genialidade natural, mas sim alguém que devia todo o poder e habilidade que possuía na sua oratória, ao trabalho e à disciplina”

A vida política de Demóstenes está identificada com sua luta contra Felipe da Macedônia, e contra os atenienses que defendiam a paz com Felipe, o que equivalia à rendição aos objetivos de conquista do Macedônio. Nessa luta, ele foi tão valoroso que se tornou rapidamente muito famoso e excitava a atenção em todos os lugares, pela eloquência, e coragem dos seus discursos.

Notável é, pois, seu primeiro discurso contra Felipe da Macedônia, então no auge de seu sucesso como conquistador de povos, em plena companhia da Grécia. Demóstenes admoesta seus concidadãos atenienses a enfrentar o invasor, contando para tal com seus próprios recursos.

que doravante, os nossos recursos estão em nós mesmos, e que, se nos recursarmos a levar a guerra aos seus estados será, com certeza, sujeitamo-nos à triste e fatal necessidade de sustentá-lo às portas de Atenas!”

Lembra-lhes, com insistência, que os males do presente resultam da displicência com que os assuntos públicos foram tratados em Atenas:

Eu vos digo: foi vossa extrema negligência que ocasionou vossas desgraças”

Numa Atenas atemorizada pelo sucesso das armas de Felipe da Macedônia (pai de Alexandre, O Grande), os discursos de Demóstenes contra o invasor resgatam a lembrança daqueles tempos áureos que fizeram Atenas o símbolo maior da Grécia Clássica.

O Discurso

“Se se tivesse anunciado a discussão de um novo tema, eu esperaria Atenienses, que a maior parte dos nossos oradores houvesse opinado (…) mas, já que a mesma matéria, tantas vezes por eles discutida, é de novo submetida a exame, hão de perdoar-me, eu o espero, por ser a primeiro a levantar-se porque afinal, se com relação ao passado os seus conselhos houvessem correspondido às necessidades, não vos veríeis na contingência de debater o tema ainda hoje.”

“Começai, homens de Atenas, por não desesperar de vossa situação, por mais deplorável que vos pareça, porque a própria causa de vossos antepassados, revezes é a melhor esperança para o nosso futuro. Como assim? Eu vos digo: foi vossa extrema negligência que ocasionou vossas desgraças (…) Tomo por testemunho disso que a Lacedemônia, que foi vencida por vossa atividade, quer insolente (Felipe da Macedônia) que nos perturba hoje, por que recusamos aos negócios públicos a atenção indispensável que eles exigem.”

“Se por vossa vez, ó ateniense, quereis hoje já que não o fizestes antes regular a vossa conduta pelo mesmo princípio (de Felipe): se cada um desprendendo-se de todo o subterfúgio se empenhar em subvencionar, segundo puder, as despesas públicas, os ricos por contribuições, os moços pegando em armas; em uma palavra, se resolverdes não depender senão de vós mesmos (…) querendo Deus recobreis as vossas possessões, reparareis os desastres da vossa negligência e castigareis esse homem.”

“Não imagineis Felipe uma divindade acompanhada e perpétua felicidade: ele é objeto de temor, de ódio e de inveja até para aqueles que parecem ser-lhes mais devotados. E como não supor, naqueles que o cercam, todas as paixões dos outros homens? Agora porém, essas paixões carecem de auxiliares, que se encontram timidamente comprimidos, sob esta inércia que, repito, forçoso será desde já romper. Vede, com efeito, Atenienses, até onde tem chegado a audácia deste homem, que não vos deixa escolher entre a ação e o repouso, que vos ameaça (…) e ao passo que, imóveis contemporizamos, enquanto ele nos aperta e investe contra nós por toda a parte.”

“Quando cumprireis os vossos deveres, atenienses? Que esperais? (…) Quanto a mim, e para as almas livres, não conheço necessidade mais urgente do que o momento da desonra. Quereis sempre viver em praça pública a perguntar uns aos outros “que se diz de novo?”, E que mais haveria de novo do que um macedônio vencedor de Atenas e dominador da Grécia?! Felipe é morto? Não, por Júpiter: está doente”. Morto, ou enfermo, que vos importa? Se lhe suceder desgraça e vossa vigilância permanecer como é, no mesmo instante fareis surgir outro Felipe: porque este deve menos o seu engrandecimento às forças próprias, do que à vossa inércia.”

“Quanto a mim, atenienses, por todos os deuses! Eu creio que este homem, embriagado de suas magníficas proezas, terá mil sonhos brilhantes a acariciar a sua imaginação, já que ele não vê obstáculo algum levantar-se contra ele.”

“Desprezemos nossas miragens e consideremos que o macedônio é o nosso inimigo, o nosso espoliador; reflitamos que, há muito, ele nos insulta e nos ultraja; que todos os socorros, com que contávamos, voltaram-se contra nós; que, doravante, os nossos recursos estão em nós mesmos, e que, se nos recusamos a levar a guerra aos seus estados será, com certeza, sujeitar-nos à triste e fatal necessidade de sustentá-lo às portas de Atenas!”

Francisco Ferraz

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