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quarta-feira, 1 de março de 2017

EUA e o impacto da Revolução Cubana – A revolução social pacífica

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O envolvimento norte-americano não se limitaria a estipular diretrizes a serem seguidas por seus colaboradores na América Latina. Na realidade, deveria assumir a liderança de “revolução social pacífica” com o objetivo de, no espaço de um decênio, mudar a face do continente. Neste período, segundo os cálculos estimados por eles, os Estados Unidos investiram dois bilhões de dólares por ano (metade dos quais nos setores públicos), a serem complementados por investimentos locais numa proporção quatro vezes superior. Desta forma, esperava-se consolidar uma terceira via que serviria de alternativa à tentação revolucionária e ao imobilismo conservador ou direitista, que tradicionalmente predominava na América Latina. Como efeito demonstração da nova linha a ser seguida e dar provas da sua intenção, Kennedy empenhou-se pessoalmente na supressão da odiosa ditadura de Leônidas Trujillo na República Dominicana. Para não indispor-se com os grupos liberais que o acusavam de utilizar-se do big stick apenas contra o regime revolucionário cubano, deu sua concordância para que ocorresse a eliminação de Trujillo, o que foi feito num espetacular atentado em 30 de maio de 1961, menos de duas semanas depois da derrota na Baía dos Porcos. A marinha norte-americana presente, ancorada na baía de São Domingos, congelou qualquer possibilidade de restauração ou continuidade trujilista enquanto eram apressadas as eleições que consagraram, no ano seguinte, Juan Bosh, um intelectual e escritor progressista aceitável e perfeitamente enquadrado no espírito delineado pela Aliança para o Progresso”.

A contra insurgência

Como medida de precaução em relação a um possível fracasso do reformismo aliancista, e também para satisfazer os setores mais conservadores do Congresso e do Pentágono, o governo Kennedy passou a dar suporte prático, com o auxílio de um militar da reserva, o general Maxwell Taylor, à teoria da contra insurgência. Tratava-se de uma ampla remodelação da instrução militar do continente, para adaptar as Forças Armadas latino-americanas à luta anti guerrilheira. Até o início dos anos 60, os exércitos e as demais armas de guerra do continente haviam sido adestrados e trinados para a guerra convencional, para seguindo o TIR (Tratado Interamericano de auxílio recíproco), atuarem como tropa auxiliar dos norte-americanos em caso de um conflito aberto com a União Soviética. O aparecimento da guerrilha fidelista e o êxito obtido por ela mudou totalmente o quadro da instrução militar e da sua estratégia geral. Os exércitos, seguindo o modelo que os Estados Unidos aplicavam ao exército sul-vietnamita, deveriam ser dali em diante uma força contra insurgente. Para tanto, foi fundada em 1961 a School of the Americas, localizada no Forte Gulick, na zona do Canal do Panamá. A Escola das Américas, logo apelidada de Escola dos Ditadores, chegou a formar 33.147 militares vindos de todos os países latino-americanos. Como atuação complementar, a Junta Interamericana de Defesa apressou-se em criar o Colégio Interamericano de Defesa (CID) para acelerar o ensino da antissubversão. Até 1975, mais de 70 mil oficiais latino-americanos haviam passado pelos cursos oferecidos por aquelas instituições, e, segundo dados da mesma época, dos 500 oficiais superiores que ocupavam postos relevantes nos países ao sul do Rio Grande (presidentes, ministros, comandantes de exército, etc...) 382 deles haviam feito cursos de aperfeiçoamento nos estados Unidos. 6

A adoção da doutrina da contra insurgência fez com que, nos anos que se seguiram, não só a política externa dos Estados Unidos retomassem os princípios intervencionistas (invasão de São Domingos, em 1965) como realizasse uma completa reciclagem da função das forças armadas latino-americanas. Os militares, subentendia-se, não seriam apenas os guardiões das normas constitucionais e das fronteiras nacionais, mas passariam a exercer diretamente eles próprios o poder em seus respectivos países, se as circunstâncias assim o determinassem. Para os altos estrategistas do Departamento do Estado a debilidade da democracia nos países latino-americanos fazia com que ele fosse alvo fácil dos assaltos da subversão, obrigando a que medidas extraordinárias fossem tomadas para contê-la. Expedientes que, fatalmente conduziam a um sacrifício temporário das normas democráticas e a suspensão dos direitos gerais dos cidadãos, visto que o inimigo ideológico (as várias agrupações e partidos marxistas espalhados pelos continente), aproveitava-se das instituições e das garantias constitucionais de um Estado de Direito para semear a discórdia e difundir programas que insuflavam a luta armada contra a ordem instituída. Assim, durante o próprio governo Kennedy, em meio as suas próprias ambiguidades, é que forma lançadas as semelhantes das futuras ditaduras castrenses que multiplicaram-se a partir de 1964. A Doutrina da Contra insurgência e a Aliança para o Progresso eram as duas faces da mesma moeda, complementos da política de carrots and aticks, cenouras e relhos, que caracterizou o curto mandato do governo Kennedy.

6.COMBLIN, J. A Ideologia da Segurança Nacional. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p. 138, e segs.

Kennedy e os seus aliados

Os potenciais aliados e melhores intérpretes latino-americanos da política Kennedyana, eram significativamente os dissidentes do sistema oligárquico que se alinhavam em meio aos partidos democráticos, liberais esquerdistas ou populistas, tais como Eduardo Frei no Chile, Arturo Frondizi naArgentina, João Goulart no Brasil, Raul Leoni na Venezuela e o já citado Juan Bosh na República Dominicana. Poucos deles sobreviveram ao vendaval golpista que se desencadeou sobre a América Latina após a morte de John Kennedy em novembro de 1963. A Terceira Via aprovada pelos brain trust de Kennedy, um caminho alternativo entre o domínio oligárquico e a revolução comunista, foi definitivamente sepultada com a ascensão do seu vice-presidente, o texano Lyndon Johson (1963-1969). Com ele deu-se o recrudescimento da intervenção norte-americana na Guerra do Vietnã, levando os Estados Unidos para o atoleiro de uma guerra sme horizontes no Sudeste Asiático. Tornou-se a ser uma contradição cada vez mais gritante apregoar-se a liderança de uma política reformista e de compromisso social na América Latina com as exigências dos Estados Unidos conseguirem sustentação para com seu crescente envolvimento na guerra indochinesa. Lyndon Johson, ao tempo em que encaminhava ao Congresso norte-americano a progressita legislação dos Direitos Civis em favor dos negros, reclamada pelo reverendo Martin Luther King, inclinou-se externamente cada vez mais para uma solução de direita para enfrentar a ascendente maré de turbulências que começou a sacudir a América Latina motivada pelo sucesso da revolução cubana.

A ascensão da direita

Para as forças da direita, sólida e historicamente estruturada na América Latina, tendo a seu favor a tradição, o rígido espírito de hierarquia e os privilégios secularmente introjetados nos seus hábitos e costumes, a revolução fidelista passou a ser ameaça concreta aos quatro séculos de dominação exercida pelas diversas oligarquias que a controlavam desde a época da Conquista. De fato, o comunismo deixara de ser um espectro longínquo, circunscrito aos países do Leste europeu ou do distante Oriente, assumindo com a presença de Fidel Castro na ilha de Cuba, contornos ameaçantes bem nítidos e palpáveis. Não era mais uma bandeira vermelha agitada ao longe, mas sim a subversão social posicionada as portas de quase todos os países. A política de Fidel Castro, de defesa intransigente da sua revolução radicalmente antiamericana, havia aberto as fronteiras do continente americano à sua penetração soviética, como os incidentes com os mísseis russos instalados em Cuba, em 1962, bem o demonstravam. Situação gravíssima que, naquela ocasião, com o mundo em estado de suspense, quase levou as suas superpotência à guerra atômica. Desde aquele momento, marcado pelo recuo soviético, delineou-se uma guerra sem contemplação para com a subversão comunista, uma guerra sem misericórdia que exigia toda a capacidade repressiva dos aparatos de poder do Estado na América Latina.

Fonte: http://educaterra.com.br/voltaire/mundo/2002/08/12/001.htm

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