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PAs continuam fechadas em São Paulo, mesmo com
Bruno Bocchini - Repórter da Agência Brasil
Apesar de construída, Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Guarulhos (SP) permanece fechada Rovena Rosa/Agência Brasil
No estado de São Paulo, 28 unidades de Pronto Atendimento (UPAs) continuam fechadas mesmo após o Ministério da Saúde alterar regras para facilitar a inauguração. Há municípios, como Guarulhos, que estão com duas UPAs praticamente prontas, mas impossibilitadas de atender ao público. Os dados do ministério foram divulgados no início da janeiro.
No início deste ano, a pasta publicou portaria que flexibilizou as exigências para o funcionamento de UPAs. Com as novas regras, cada unidade poderá ser aberta com, no mínimo, um médico por turno. Antes, era exigido o número de dois médicos por período. Caberá ao gestor municipal definir o número de profissionais na equipe.
“É melhor dois [médicos] do que nenhum. O Brasil precisa cair na real. Não temos mais capacidade de contratar pessoal”, disse o ministro da Saúde, Ricardo Barros, ao apresentar as novas regras. “É melhor essa UPA funcionando com um médico de dia e um de noite do que ela fechada”, completou.
Um mês depois de o governo ter editado as novas regras, as medidas ainda não surtiram efeito na região metropolitana de São Paulo e, além disso, geraram críticas de entidades de classe.
Três dos cinco municípios paulistas que, de acordo com o Ministério da Saúde, estão com UPAs impossibilitadas de ser inauguradas – Guarulhos, Francisco Morato e Embu-Guaçu – informaram que a alteração das exigências não tem efeito sobre a abertura das unidades. Itapecerica da Serra informou que não tem UPA em construção e Mogi das Cruzes, que as duas UPAs da cidade estão funcionando normalmente.
“Não temos rede de esgoto, rede de água, não tem nada, não tem ventilação, um monte de lugar sem ventilação”, diz a secretária de Saúde de Embu-Guaçu, Maria Dalva Amim dos Santos. Segundo a secretária, não dá para funcionar assim. Não é porque não tem médico que não funciona agora, é porque não tem condição de funcionar, acrescenta a Maria Dalva. “A medida do ministério não facilita em absolutamente nada. É uma precariedade.”
Apesar de construída, Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Guarulhos permanece fechadaRovena Rosa/Agência Brasil
A unidade foi inaugurada no final da gestão passada, mas não tem condições de funcionar por questões estruturais, reforça a secretária. "Se o ministério vier aqui, não vai me deixar funcionar, porque a obra não está completa, não está finalizada. Não tem nada, não tem equipamento para funcionar."
Para a Secretaria de Saúde de Guarulhos, onde há duas UPAs prontas, mas sem funcionar, a alteração das regras não agilizou, nem facilitou a inauguração das unidades. “A redução da exigência de médicos nas unidades de Pronto Atendimento [UPAs], de quatro para dois profissionais, autorizada pelo Ministério da Saúde, não contempla a realidade do município neste momento”, diz nota da secretaria.
No entanto, a secretaria admite que a mudança nas regras pode ajudar em um planejamento futuro. “Reconhecemos o grande alcance da medida para uma quantidade enorme de municípios no Brasil, bem como para aprimorarmos nosso próprio planejamento futuro.”
Até o fechamento da matéria, a prefeitura de Guarulhos não havia esclarecido a razão pela qual as duas UPAs já construídas na cidade não estão funcionando.
Em Francisco Morato, onde o prédio erguido para abrigar uma UPA está degradado e é usado como abrigo por pessoas em situação de rua, a prefeitura informou, em meados de janeiro, que a maior necessidade é conseguir recursos para reforma da unidade.
“A Unidade de Pronto Atendimento 24h (UPA) de Francisco Morato está fechada há mais de quatro anos. Desde o término da obra ela nunca foi aberta. Neste período, o prédio sofreu depredação e se deteriorou, e são necessárias reformas para que possa ser inaugurado. A prefeitura está neste momento elaborando projeto e captando recursos para executar essas obras”, diz em nota a prefeitura.
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O Ministério da Saúde informou que os 28 municípios de São Paulo receberam recursos para construir as UPAs, mas que as gestões locais não terminaram as obras. A pasta já notificou as cidades. De acordo com o ministério, a alteração das exigências, de dois para um médico por turno, é uma forma de dar mais possibilidades para os gestores locais de inaugurar as UPAs.
Entidades criticam
Apesar de construída, Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Guarulhos permanece fechada Rovena Rosa/Agência Brasil
A Associação Paulista de Medicina (APM) e o Sindicato dos Médicos de São Paulo criticaram a redução das exigências para abertura das UPAs. O presidente da APM, Florisval Meinão, ressalta uma resolução do Conselho Federal de Medicina, que determina que pacientes em estado grave sejam transferidos, com a presença de um médico, das UPAs para unidades mais adequadamente equipadas.
“E se só tem dois médicos, um em cada turno, um deles já sai dali nessas condições. É um número muito restrito de médicos e é por isso que, quando foram criadas as UPAs, definiu-se, na sua formatação, que o mínimo seriam quatro médicos. Seria um número considerado realmente mínimo necessário para funcionar dentro dos padrões que se preconiza considerando as peculiaridades das UPAs”, afirma Meinão.
“Para o médico, é uma vulnerabilidade; para o paciente, um risco, porque ele vai acreditando que foi aberta [a UPA] e que vai oferecer o mínimo necessário, e não está sendo oferecido. Mexe-se na formatação para pôr em funcionamento algo que vai ser precário e que vai colocar em risco a população”, acrescenta.
Segundo o diretor do Sindicato dos Médicos de São Paulo, Gerson Salvador, o número de profissionais que atendem atualmente nas emergências não é suficiente e a permissão de abertura de unidades com menos profissionais deverá fazer com que haja ainda mais filas e conflitos.
Para Salvador, diminuir o número de profissionais terá impacto na piora da qualidade do atendimento e das condições de trabalho dos profissionais médicos.
Usuários
Em uma tarde de janeiro, Beteneide Chagas da Silva, moradora do Jardim Paulista, em Guarulhos, estava em frente ao prédio da UPA que tem o mesmo nome do bairro. Ela questionava uma funcionária da prefeitura, que estava no interior da UPA, sobre a demora na inauguração do equipamento.
“Como não tem UPA, temos que ir para uma policlínica da prefeitura, longe daqui. Eu já desisti. Fui lá procurar um pediatra – nunca a gente encontra o médico que quer”, diz Beteneide. “Se abrisse aqui, mesmo que o atendimento demorasse, é perto de casa, e a gente podia se virar para esperar.”
Em Francisco Morato, Elenita Andrade, que estava com dor no braço, teve de recorrer à Santa Casa para ser atendida. O município fez um convênio com a Santa Casa local para atender a população até a inauguração da UPA, ainda sem data definida. “Essa é a única opção. Já estou há duas horas esperando. Vim de manhã e desisti porque estava com muita fila.”
A situação era parecida com a de Laudenir Messias, que acompanhava o marido que havia machucado o dedo do pé. “O único jeito para ser atendido é aqui. Já estamos aqui há mais de duas horas. Se tivesse um outro local de atendimento na cidade, dividiria a fila. Mas não tem”, disse.
Governo
O Ministério da Saúde afirmou que as novas regras “foram previamente pactuadas na Comissão Intergestores Tripartite, com representantes das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde”
Segundo a pasta, “na ocasião, esta foi a melhor saída encontrada por todos, uma vez que o principal motivo para o não funcionamento das unidades é, sim, a falta de médicos”.
“A flexibilização foi a melhor solução encontrada, em conjunto com os estados e municípios, para que as UPAs comecem a funcionar. Nos próximos meses, teremos unidades novas atendendo na urgência e emergência”, disse o ministro da Saúde, Ricardo Barros, à época do anúncio.
UPAs: Defensoria do Rio vê sobrecarga de médicos; pesquisador defende nova regra
Akemi Nitahara – Repórter da Agência Brasil
Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Tijuca, no Rio de Janeiro Fernando Frazão/Agência Brasil
No Rio de Janeiro, a Defensoria Pública demonstrou preocupação com a medida anunciada pelo Ministério da Saúde de flexibilizar o número de médicos necessários para a abertura de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA). De acordo com as novas regras, a unidade poderá ser aberta com um médico por turno; anteriormente, eram necessários dois médicos por período.
Segundo a defensora Samantha Monteiro de Oliveira, do Núcleo de Fazenda Pública da Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPRJ), as reclamações sobre problemas no atendimento nas unidades têm aumentado com a crise financeira do estado. Samantha disse que as principais reclamações são carência de profissionais e falta de material e de insumos, além de dificuldade de transferência.
Para a defensora, operar com apenas um médico por turno vai sobrecarregar o profissional e piorar o atendimento ao público. “A gente viu in loco que é muito complicado quando um médico só fica responsável, ainda que a UPA esteja com restrição de atendimento. A UPA não é uma unidade básica, não faz atendimento simples, faz atendimentos complexos, de maior gravidade", disse.
"Dependendo do número de ocorrências que apareçam, chegam [pacientes] 24 horas por dia, e há ocorrências graves, muitos traumas, acidente vascular, questões que necessitam de transferência para cirurgia. Daí a preocupação com possíveis falhas no atendimento, com o profissional sobrecarregado e sem condições de dar um atendimento digno, de qualidade, ao usuário", completou.
Samantha reconhece que, apesar de estar longe do ideal em atendimento à população, as UPAs deram uma contribuição muito importante para o Sistema Único de Saúde (SUS) e lembra que o estado do Rio de Janeiro foi o indutor da política.
“É não criar a ideia de que o hospital tem que ser a porta de entrada para tudo. Até porque existem questões que não são tão graves e podem ser resolvidas na atenção básica e em outros equipamentos, não só nas UPAs, para que esses pacientes não sejam obrigados a ir para as emergências hospitalares para tratar questões de menor complexidade, evitando sobrecarregar o sistema.”
Vantagens
Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Tijuca, no Rio de Janeiro Fernando Frazão/Agência Brasil
O pesquisador Daniel Soranz, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz), defende a flexibilização proposta pelo governo federal. Segundo Soranz, a regra anterior não levava em consideração as realidades locais.
“Na construção do SUS, o gestor municipal tem a responsabilidade de definir regras locais. Com a municipalização, isso aumenta a flexibilidade, aumenta a autonomia dos municípios para realizar essas definições. De acordo, obviamente com a necessidade de cada local, de acordo com a realidade orçamentária de cada municípios”, disse Soranz, que já foi secretário de Saúde municipal do Rio.
Para o pesquisador, as mudanças devem ter impacto apenas sobre as novas unidades que serão abertas. Soranz destaca que, mesmo com o risco de sobrecarga de trabalho para o profissional, como alerta a defensoria, o gestor municipal terá mais liberdade para definir suas equipes.
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“Não dá para generalizar e dizer que é bom para todos os lugares ou que é ruim para todos os lugares. Há pontos positivos, que aumentam a autonomia dos municípios, mas há pontos negativos também, em que podem ser feitas composições aquém do necessário para aquela população”, acrescentou.
Soranz lembra que, de acordo com a rede disponível em cada localidade, é possível flexibilizar as equipes das UPAs sem prejudicar o atendimento à população.
“Considerando um sistema de atenção primária forte, em cada local pode ser necessário um tipo de atendimento, de formação de equipes diferentes. Em muitos locais já há uma rede de atenção primária forte ao redor das unidades de pronto atendimento, que permitem um outro remodelamento das equipes. Em outros locais, isso ainda não é possível. Então, aumentar a autonomia dos municípios nessa definição das equipes certamente fortalece o Sistema Único de Saúde.”
Estado e municipalização
O governo do estado do Rio de Janeiro administra 29 UPAs, das quais 16 ficam na capital. De acordo com a Secretaria de Estado de Saúde, todas estão em funcionamento com, no mínimo, cinco profissionais médicos por turno. Nenhuma será afetada pela medida anunciada pelo ministério.
A secretaria informa que todas são geridas por organizações sociais e que 70% do valor de custeio vem de recursos estaduais. Entretanto, a atual gestão da secretaria vem sofrendo redução de recursos, operando desde janeiro de 2016 com 40% do orçamento previsto. “Desta forma, todos os recursos disponíveis estão sendo destinados para a manutenção do funcionamento da rede estadual. Apesar das dificuldades geradas pela grave crise financeira, as unidades da rede encontram-se em funcionamento”.
No início de janeiro, o secretário de Saúde, Luiz Antônio Teixeira Jr., anunciou a previsão de municipalizar as 16 UPAs do estado que ficam na capital, com previsão para início da mudança de gestão em 60 dias e a criação de uma comissão para cuidar desse processo.
Sobre o processo de municipalização, a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro informou, no início do mês passado, que o assunto estava sendo estudado. Ontem (3), o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, disse que a prefeitura tem “todo o interesse” em municipalizar as UPAs e reabrir os restaurantes populares.
Na capital também não haverá mudança no sistema de funcionamento nem redução de médicos nas UPAs. Segundo a secretaria, todas as 14 unidades estão em “pleno funcionamento”. Desse total, 11 são geridas por organizações sociais e três pela RioSaúde [empresa pública]. Para a manutenção das unidades, o Ministério da Saúde repassa anualmente um total de R$ 38 milhões, informou.
Pacientes
A reportagem da Agência Brasil esteve, no início de janeiro, na UPA da Tijuca, do governo do estado, e ouviu reclamações dos pacientes. O vigia noturno Marcelo Mota procurou a unidade porque estava com dor de cabeça, na região da testa, com suspeita de sinusite. Ele contou que que esperou uma hora e meia pelo atendimento e que foi apenas medicado, sem nenhum exame complementar. Marcelo disse que já foi atendido mais rápido em outras ocasiões.
“Moro aqui na Tijuca, sempre venho aqui. Meus filhos também, e sempre resolve. Quando está bom o atendimento, é rapidinho, demora 20 minutos, meia hora. Hoje não fizeram exame e só deram o medicamento e a vacina foi na barriga, que eu nunca tinha tomado, sempre foi no braço ou no bumbum. Um mês atrás, meu irmão veio aqui com muita dor no abdômen e teve um excelente atendimento. Fizeram o exame, descobriram que era pancreatite, daí ele ficou internado aqui nas primeiras 24 horas e depois foi transferido para o hospital”, afirmou o vigia.
Rio de Janeiro - O pedreiro Ednelson Miranda, após ser examinado na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Tijuca, recebeu indicação para avaliação ambulatorial em um hospital Fernando Frazão/Agência Brasil
Morador de Manaus, o pedreiro Ednelson Miranda estava no Rio a passeio e teve uma distensão na virilha. “Demorou muito [o atendimento], quase quatro horas, tem pouco médico para muita gente. É minha primeira vez na UPA. O remédio é um só para todos os pacientes que estão com dor: dipirona. E me deram o encaminhamento para ver se é uma hérnia, não fizeram exame nenhum.”
Em dez minutos, pouco antes das 16h, pelo menos dez mães desistiram do atendimento, depois de esperar por mais de quatro horas e serem informadas de que o único pediatra da UPA tinha precisado acompanhar um paciente grave ao hospital.
A dona de casa Carolina Vernes desistiu de esperar por atendimento para o filho Flávio na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Tijuca, no Rio de JaneiroFernando Frazão/Agência Brasil
A dona de casa Carolina Vernes foi uma delas. “Meu filho Flávio vai fazer 2 anos agora, quase nunca fica doente, mas estouraram umas aftas na boca dele, e eu vim para tirar uma dúvida, mas só tem um pediatra atendendo e demora mais de 40 minutos com cada criança.”
Sobre as reclamações a respeito do atendimento, a Secretaria de Saúde explicou que a unidade funciona com equipe formada por três clínicos e um pediatra no plantão diurno. “Cabe esclarecer que todos os pacientes que buscam a unidade são submetidos à classificação de risco, com prioridade para os casos mais graves”, informou em nota.
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