Por Roberto Gomides
Caridade, segundo o dicionário, significa: Boa disposição do ânimo para com todas as criaturas, bem como, qualquer manifestação dessa disposição.
Henry Hazlitt escreveu, no excelente Economics in One Lesson, que a teoria econômica é assombrada por mais falácias do que qualquer outra ciência conhecida pelo homem, e com certeza a relação existente entre o capitalismo e a caridade é mais um infeliz exemplo.
A liberdade para ajudar o próximo, em contraposição à coerção, de certa forma, desperta desespero naqueles que, por não enxergarem em si mesmos a capacidade de serem caridosos como indivíduos, seja por medo, receio ou qualquer complexo infantil de serem taxados como trouxas, dominados pelas próprias inseguranças, acabam por fazer coro para que essa virtude individual seja coercitivamente imposta pelo Estado.
Ao se deparar com o fato de que existem seres humanos em estado de necessidade, as pessoas tendem a vislumbrar duas hipóteses. A primeira é deixar que o auxílio ao próximo seja livre, de forma que cada um ajude quem quiser, se quiser, e quando quiser. A segunda consiste em retirar recursos coercitivamente de todos os indivíduos da sociedade e canalizá-los para um poder central que poderia coordenar as atividades de forma que sempre existam recursos disponíveis para auxiliar aqueles, que por qualquer motivo, encontram-se fragilizados.
Apesar de sedutora, a segunda hipótese padece pelo erro primário de tentar ser algo que não é. Ora, se a caridade significa a boa disposição para com os outros, como podemos ter a pretensão de universaliza-la ignorando justamente o que a define? Ou seja, beirando o absurdo, tenta-se impor algo que por definição deveria ser voluntário, seja por desconhecimento, interesse próprio, ou, por como Hayek definiu, “pretense of knowledge”.
O esfarelamento patético de nosso Estado gigantesco, que tomou a riqueza dos indivíduos de forma avassaladora durante mais de uma década, justamente quando quem o sustentou mais precisa, demonstrou que estatizar a caridade é como contratar um plano de saúde que não oferece cobertura quando se está doente.
O argumento amplamente utilizado para justificar a falência do nosso welfare state é que tudo seria perfeito, não fosse a corrupção endêmica que impera no país e, baseado nele, apesar da realidade, testemunhamos todos os dias pessoas defendendo histericamente que sem o estado, na tentativa de prosperar, todos viveríamos na miséria…
O argumento é falho por diversos motivos, no entanto, ao meu ver, dois são gritantes. O primeiro é ignorar o fato de que pessoas tendem a tirar conclusões baseadas em perspectivas de longo prazo que não passam de suposições, ignorando o fato de que quem precisa de ajuda, precisa de ajuda hoje e não no futuro, ou seja, não pode se dar ao luxo de esperar o dia em que terão um governo composto por santos desprovidos de qualquer desvio de conduta. O segundo é mais óbvio e consiste simplesmente em desconsiderar que o indivíduo que abre mão de sua riqueza em favor de outro tem muito mais incentivo para monitorar o efeito dessa ajuda e ajustá-la de forma a retirar o beneficiário do estado de fragilidade, conduzindo-o a uma situação de independência o mais rápido possível, reduzindo o risco moral de alguém se aproveitar da benevolência alheia, como por exemplo usar a Lei Rouanet para realizar um casamento.
É inegável a dificuldade de aceitar que pessoas vivam em estado de miséria, mas não podemos terceirizar a solução dos problemas que existem no ambiente em que estamos inseridos depositando no Estado toda a responsabilidade e recursos disponíveis, na vã tentativa de superá-los.
Portanto, se o seu objetivo é que todos tenham a oportunidade de viver dignamente, ajude quem precisa e lute para que você tenha cada vez mais recursos disponíveis para tal rompendo a sociedade com esse gigante ineficiente chamado Estado, em prol de um ambiente propício para o empreendedorismo e as demais atividades econômicas, que são os verdadeiros motores da prosperidade, lembrando sempre que, como disse Frederic Bastiat: A fraternidade forçada destrói a liberdade.
Leitura sobre o tema:
James M. Buchanan, “The Samaritan’s Dilemma.” in Edmund Prelim, ed., Altruism, Morality and Economic Theory (New York: Russell Sage, 1975), pp. 71-85.
Henry Hazlitt, “Poor Relief in Ancient Rome,” The Freeman, April 1971, p. 219.
Richard E. Wagner, To Promote the General Welfare: Market Processes vs. Political Transfers (San Francisco: Pacific Research Institute for Public Policy. 1989).
Casamento bancado pela Lei Rouanet: http://oglobo.globo.com/brasil/casamento-bancado-pela-lei-rouanet-teve-show-de-sertanejo-19597901
Índice de Caridade: https://www.cafonline.org/about-us/publications/2015-publications/world-giving-index-2015
Tags: #Buchanan#Doaçâocapitalismocaridadeliberdade
Sobre o autor
Roberto Gomides
Presidente do Instituto Liberal
Nenhum comentário:
Postar um comentário