Apesar de assumir o risco de me indispor com os indivíduos que se posicionam à direita do espectro político, creio ser relevante tecer alguns comentários a respeito de aspectos inquietantes de parte da direita, que fique claro. Pego o gancho do que Rodrigo Constantino disse em seu podcast. Constantino apontou o caso da direita “tacanha”, “autoritária” e que faria Edmund Burke e Russell Kirk se “revirarem no túmulo”, pois esses clássicos do pensamento conservador nada têm a ver com o autoritarismo advogado por alguns lunáticos que colam em si o rótulo de “conservador”. Sei que existe muito gente que nota isso, mas acredito que poucos querem falar desse tema para evitar ofender os “seus”.
A meu ver nesse ponto parte da direita se aproxima da esquerda. Alguns sujeitos parecem ter saído diretamente de livros de caricaturas. Seja pela indumentária ou por posições absurdamente anacrônicas e autoritárias, certos indivíduos atuam da mesma forma que a esquerda, a diferença é que fazem isso pela direita. Mas o que quero dizer com isso, afinal?
Assim como a esquerda tem suas utopias, parte da direita tem as suas, seja o saudosismo por um passado idealizado ou por uma sociedade absolutamente livre. Assim como a esquerda tem um tipo de vestimenta que a caracteriza como tal, o mesmo ocorre com parte da direita. Se a primeira quer parecer viver nos anos setenta, parte da segunda quer estar na Inglaterra do século XIX. Se de um lado querem ser hippies, do outro querem ser condes. Se de um lado querem o operário discutindo leninismo, do outro rejeitam tudo o que é contemporâneo e pretendem restaurar a tal da alta cultura. Acredito que isso não vai acontecer.
Nessa esteira vem também o culto ao líder. Não é só a esquerda que tem os seus messias políticos e intelectuais, a direita também os tem. E nisso o cuidado deve ser redobrado, pois o messianismo é um perigo que geralmente faz nascer o culto que, por sua vez, leva à cegueira. Este é um alerta clássico no pensamento conservador.
Existem rapazes na faixa dos vinte anos manifestando um comportamento moralista inconcebível até mesmo para um ancião. Nas redes sociais isso é claro. São pequenos puritanos que por não estarem no PSOL, estão seguindo gurus e cobrando condutas perfeitas da sociedade na qual acabaram de chegar. Calma lá!
O ideal não é o problema. O problema é qual é este ideal e como tentar chegar nele. Alguns torcem por um governo militar e querem ser mais militares que o próprio Jair Bolsonaro, usando fardas que nem o próprio deputado ostenta. Outros querem ser mais monarquistas que o próprio D. Bertrand. Católicos extremamente tradicionalistas querem ser mais católicos que o papa e reagem a tudo que não seja Tridentino, etc. Parecem viver um delírio. Exemplo são os que hoje se convertem ao catolicismo por mero gosto estético e amanhã se tornam vigilantes da liturgia e moralistas insuportáveis. São caricaturas que dificilmente podem ser levadas a sério.
Esta direita está sozinha, isolada em sua ilha de idealizações monomaníacas. Está sozinha tanto quanto o PSTU tentando fazer uma revolução bolchevique.
Constantino também escreveu sobre a reação exagerada no caso do flagrante de um assalto no qual as pessoas filmaram o assaltante agonizando com um tiro na garganta e riam do sujeito. Quem se diverte com a agonia de outro ser humano, ainda que seja um criminoso, está mais próximo do nazismo do que do conservadorismo ou do liberalismo. Compreendo que estamos saturados da impunidade e com a esquerda geralmente vê os bandidos como “vítimas da sociedade”, mas tal reação é de fato exagerada.
Assim acontece com moralistas que, por serem contrários à militância LGBT, reagem desproporcionalmente. Há dias li um dito “direitista” afirmando que caso seu filho fosse homossexual, ele o expulsaria de casa a pedradas. A indignação com os movimentos políticos autoritários e com a ideologia de gênero é uma coisa, esse tipo de manifestação é outra. Desnecessária e preconceituosa. Isso está mais para Estado Islâmico do que para a direita conservadora ou liberal.
Alguém duvida que esses “Stalins de azul”, se fossem alçados ao poder, seriam também facínoras? Aliás, e quando a resposta a esquerdismo vem em forma de culto ao coronel Ustra ou Pinochet? É preciso ter prudência, como disse Russell Kirk. A reação liberal ou conservadora à esquerda deve passar longe dos métodos autoritários da própria esquerda.
Ademais, seria também importante que os sujeitos de direita não se tornassem bonecos de época e aceitassem que o mundo não será completamente católico – como li numa postagem há poucas semanas – que o Estado não será abolido amanhã e que a maioria dos jovens parece não estar nem um pouco preocupada com os debates políticos.
Sabe o que eu faria se pudesse proibir todos esses tipos de comportamentos? Nada, afinal, respeito a excentricidade de cada um, por mais ridícula que ela seja. O problema é quando essa paixão infantiliza as discussões e começa a criar caricaturas que servem mais como objeto de chacota ou temor.
E por que usei a expressão “aspectos inquietantes” no título? Porque de personagens bizarros e potencialmente antidemocráticos já basta a esquerda. Mas temos de aceitar que esta também é uma característica de parte da direita, apesar de muitos não falarem no assunto e aceitar excessos como respostas legítimas.
Apesar de tudo, essa direita caricata também empreende esforços contrários à hegemonia da esquerda, aí adentramos a mesma via. Embora a direita seja ampla, há lugares-comuns em grande parte dela, por isso é salutar que empreendamos esforços a partir desses pontos. O resto é objeto de reflexão que, se não é determinante para o momento, não pode deixar de ser considerado, afinal, a imaginação totalitária atinge tanto a esquerda quanto a direita. Isso a história já cansou comprovar.
Nas redes sociais da direita também existem caricatos, apaixonados políticos e ditadores em potencial. Não seja um deles.
SOBRE O AUTOR
Thiago Kistenmacher
Thiago Kistenmacher é estudante de História na Universidade Regional de Blumenau (FURB). Tem interesse por História das Ideias, Filosofia, Literatura e tradição dos livros clássicos.
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