segunda-feira, 30 de maio de 2016

Janaina Paschoal: rotina de isolamento pós-impeachment

Coautora do pedido que acabou por afastar Dilma Rousseff é chamada de golpista na USP, convive com família petista do marido e diz que vê presidente interino fiel à responsabilidade fiscal

Por: João Pedroso de Campos29/05/2016 às 19:15 - Atualizado em 29/05/2016 às 19:17

A jurista Janaína Paschoal, co-autora do pedido de impedimento da presidente Dilma Rousseff, fala para a comissão especial do impeachment no Senado Federal, em Brasília - 28/04/2016A jurista Janaína Paschoal, co-autora do pedido de impedimento da presidente Dilma Rousseff, fala para a comissão especial do impeachment no Senado Federal, em Brasília - 28/04/2016(Jefferson Rudy/Ag. Senado)

Coautora do pedido de impeachment que acabou por resultar no afastamento da presidente Dilma Rousseff, a advogada Janaina Conceição Paschoal se tornou personagem de destaque nos meses que antecederam a aprovação do processo por crime de responsabilidade contra a petista pelo Senado. Suas acaloradas defesas da ação, seja no Congresso ou em eventos públicos, e as críticas ao Partido dos Trabalhadores renderam infindáveis - e impagáveis - memes nas redes sociais. Aclamada por grupos pró-impeachment e duramente atacada pela militância de esquerda, Janaina viu sua rotina se alterar drasticamente. Quinze dias após o afastamento de Dilma, contudo, a advogada submergiu - e tem de conviver com a ira de militantes petistas. Ela está ideologicamente isolada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), de cujo Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia é professora associada. "Reduto petista", segundo classifica Janaina, a escola sediada no Largo São Francisco, assim como a maioria das universidades públicas brasileiras, é ambiente hostil a ideias que não reflitam os ideais de esquerda. Mesmo à jurista autodeclarada "radical de centro", que frequenta a universidade desde os 17 anos.

O convívio com militantes esquerdistas e do PT, contudo, não se restringe ao ambiente acadêmico. A família do marido, com quem tem dois filhos, é petista fervorosa, "de ir para a rua fazer campanha", brinca Janaina. Ela relatou ao site de VEJA, na saída de uma aula na semana passada, que os contraparentes não acreditavam que o impeachment fosse prosperar. Com Dilma afastada, o assunto morreu. "Não conversamos a respeito, eu sempre coloco a família em primeiro plano", garante.

"A vida dela na universidade sempre foi muito sofrida", diz o advogado Roberto Podval, amigo de Janaina e primeiro chefe dela na área jurídica. Defensor do ex-ministro José Dirceu na Operação Lava Jato e contrário ao impeachment baseado nas pedaladas fiscais, Podval observa que em "todos os concursos para titularidade, para avançar na carreira dentro da USP, ela (Janaina) sempre foi preterida". Entre os colegas do corpo docente do Direito da USP, destacam-se petistas notórios, como os juristas Dalmo Dallari, Fábio Comparato e Sérgio Salomão Shecaira, este "desafeto político da professora Janaina", conforme analisa Elival Ramos, professor de Direito Constitucional da universidade e Procurador do Estado de São Paulo.

Desde o afastamento de Dilma Rousseff da Presidência e a consequente - e constitucional - ascensão do vice-presidente Michel Temer (PMDB) ao cargo mais alto do Executivo, Janaina conversa sobre o assunto no ambiente acadêmico apenas com os colegas favoráveis ao impeachment, "que são discretos". Com os contrários, não toca no assunto. A recíproca é verdadeira.

Entre os alunos, por outro lado, a saída da petista do Planalto despertou a ira dos adeptos da fantasiosa teoria do "golpe". No dia seguinte ao afastamento de Dilma pelo Senado, cerca de 15 acadêmicos penduraram ao lado do quadro negro da sala Dino Bueno, onde a professora dá aula às sextas-feiras, um letreiro onde se lia, em letras garrafais vermelhas sobre papel pardo: "golpista". "Golpe ontem e hoje", ataca outro cartaz, este em letras escuras, suspenso sobre a entrada da escadaria que dá acesso às salas de aula.

Houve na universidade até enterro simbólico da Constituição, organizado na quinta-feira passada, com direito a caixão para o "livro sagrado", como carinhosamente a jurista se refere à Carta Magna. "O cheiro de ilegitimidade e de pegar carona no poder é muito grande", protestou a professora de Teoria do Estado da USP Maria Paula Dallari Bucci. "Entendo que a Constituição está mais viva do que em qualquer outro momento, mas o PT é bom de marketing", rebate Janaina.

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Acusada de ligação com o PSDB, sobretudo depois de assumir ter recebido 45.000 reais da sigla pela participação em um parecer encomendado ao jurista Miguel Reale Jr., Janaina Paschoal diz não saber em quem votar nas eleições municipais de outubro deste ano: "Vou ouvir as propostas, ainda não tenho candidato". Em São Paulo, onde ela vive, devem ser candidatos, além do prefeito Fernando Haddad (PT), o empresário João Doria (PSDB), a senadora Marta Suplicy (PMDB), o deputado federal Celso Russomanno (PRB) e o vereador Andrea Matarazzo (PSD).

Governo Temer - Em menos de duas semanas despachando no terceiro andar do Palácio do Planalto, o presidente da República interino coleciona tropeços. No espaço de apenas onze dias úteis desde que Dilma Rousseff foi afastada do posto, o peemedebista reviu decisões que anunciara, foi criticado pela falta de mulheres e negros no primeiro escalão do governo e já experimenta sua primeira crise política, protagonizada pelo ex-ministro e senador Romero Jucá (PMDB-RR), derrubado do Ministério do Planejamento após a divulgação de diálogos em que trama "pacto" que freasse a Operação Lava Jato.

Apesar das topadas de Temer - e fora a proposta aventada por alguns ministros de legalizar os jogos de azar - Janaina enxerga virtudes no governo provisório. Para ela, as exonerações de Jucá e de funcionários "pendurados no governo federal", mostram que "diferentemente de Dilma, ele (Temer) não vai ser leniente com ilicitudes e vai buscar cumprir a lei de responsabilidade fiscal".

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Confiante na gestão das contas públicas sob Temer, Janaina Paschoal entende que os decretos editados pelo peemedebista "isoladamente, sob o ponto de vista formal, constituem crime de responsabilidade". Na Comissão Especial do Impeachment, ela afirmou que "hoje não há elementos para pedir o impeachment do vice. Se surgirem, eu peço. Hoje não há". Ela pondera que são situações "muito diferentes" porque contra Dilma "há um conjunto significativo de crimes, envolvendo decretos, petrolão e pedaladas" e Temer não foi citado no parecer do Tribunal de Contas da União que rejeitou as contas do governo da petista, em 2015.

Em aula acompanhada pelo site de VEJA, a professora tratou de multiculturalismo. Antes de entrar no assunto, abordou a falta de diversidade de gênero e racial na Esplanada montada por Temer: "Um verdadeiro líder tem que estar sensível a isso (pluralidade) porque, se ele estiver, o governo dele vai ser melhor. Não vai ser melhor só porque ele atendeu aos vários pontos, vai ser melhor porque ele vai conseguir se comunicar melhor", explicou aos alunos.

Fora da sala de aula, ela contemporiza. Para Janaina Paschoal, "no afã de montar a equipe, dada a urgência, Temer deixou de cuidar da representatividade, buscando pessoas preparadas, e há muitas, entre mulheres e negros". Caso confirme a ida da senadora Simone Tebet (PMDB-MS) ao Ministério do Planejamento, em substituição a Romero Jucá, como se especula, Temer contará com o apoio da co-autora do impeachment: "Excelente escolha".

 

Veja

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