(Fábio Pereira, Procurador de Justiça do RS)
Há uma antiga maldição chinesa que vaticina: “Que você viva tempos interessantes”. Por mais paradoxal que possa parecer, a imprecação não busca remeter o amaldiçoado a tempos de bonança e felicidade, concepção de interessante para maioria de nós, e sim a tempos de guerra, fome e convulsão social, estes sim “interessantes”, porquanto fazem emergir em cada ser humano o que ele tem de melhor ou de pior. Nas palavras de Machado de Assis, muito oportunas em “tempos interessantes”, a ocasião não faz o ladrão, apenas o REVELA.
Infelizmente, e não preciso dizer a todos (não incluirei, ao lado de todos, a expressão todas, seja por amor à lógica ou seja por amor à última Flor do Lácio) que o nosso país atravessa nebuloso momento político, econômico e social, dividindo a nação em dois grandes grupos antagônicos: os que defendem o saneamento da coisa pública e aqueles que se apegam a um projeto de poder em agonia.
No confronto entre os dois lados, a primeira vítima fatal foi A verdade. Aqueles que pouco tempo atrás pregavam a probidade na condução da coisa pública, o combate incondicional à criminalidade, a proteção dos direitos das minorias etc., para a surpresa geral da nação, passaram a relativizar e alterar o seu discurso, ao sabor das necessidades de proteção do projeto de poder ao qual estão vinculados e de proteção de seus quadros envolvidos em grandes escândalos de corrupção.
Não faz muitos dias, quando a Operação Lava-Jato lançou os seus olhares em direção a um ex-presidente da república (em minúsculo mesmo por este não ter honrado a confiança que a nação nele depositou), pelos coordenadores da operação entendido como comandante em chefe da Organização Criminosa que dilapidou o patrimônio do país, e, logo na sequência, quando Promotores de São Paulo denunciaram a mesma pessoa e pediram a sua prisão, os outrora intransigentes defensores da moralidade passaram atacar, com desmedida virulência, as autoridades investigantes, como se a caótica situação que o Brasil atravessa fosse culpa de quem investiga, e não de quem cometeu insidiosos crimes contra a nação.
E o pior, ainda, é que um grupo composto por membros do Ministério Público, em ato que deve ser entendido como fogo amigo (como bem lembrado pelo colega Amorim em brilhante texto recentemente publicado na intranet do MPRS), fizeram lançar uma nota de repúdio às operações, dizendo que aquelas desbordavam dos limites e paradigmas legais, sem sequer conhecer todos os fatos e provas contidas nos autos das investigações.
Membros do Ministério Público que juraram proteger a sociedade e o Estado Democrático de Direito, em um agir que pode ser taxado como paralaxe cognitiva, colocaram-se ao lado dos réus e dos investigados, em rota de colisão com os interesses da instituição e dos destinatários da proteção assumida em solene juramento quando empossados como membros do Ministério Público.
O relativismo moral e valorativo que os defensores dos réus, investigados e condenados pela Operação Lava-Jato assumiram em razão das necessidades da ocasião, faz-nos indagar, ao bom estilo Legião Urbana: Que país é esse?
No momento, o Brasil é um país que busca uma diferente sina, de libertar-se dos políticos messiânicos, partidos populistas e corruptos profissionais, por obra e graça de um grupo de abnegados servidores públicos que estão exercendo, com dignidade, o seu ofício e investigando os mais diferentes escaninhos pútridos do poder, tudo para evitar que o patrimônio e a alma do país sejam surrupiados via espúrias negociatas.
Não podemos, no entanto, nos enganar. As forças obscuras que transformaram a coisa pública em "res" privada, a todo o custo tentarão manter-se nas entranhas do poder, conspirando contra a Democracia e o Estado Democrático de Direito, bradando como se vítimas fossem, quando, na verdade, são algozes.
Aos lobos em pele de cordeiro, devemos dizer que os filhos dessa pátria mãe gentil não fugirão à luta, mostrando que o Brasil é soberano e que jamais será entregue nas mãos de tiranos travestidos de democratas.
Lamentavelmente, até a retomada da normalidade democrática e do saneamento da coisa pública, ainda viveremos tempos interessantes!
Fonte: https://www.facebook.com/diegojornalista/posts/1145886412117639
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