Tratamento avança, mas há defasagem
na incorporação de remédios no SUS
Fernanda
Pugliero
A
média de sobrevida de uma mulher diagnosticada com câncer de mama
metastático é de três anos. Apesar deste tempo ter aumentado nas
últimas décadas – em 1970, a sobrevida média era de 18 meses -,
discrepâncias no acesso a tratamentos e medicações inovadoras
podem fazer grande diferença na expectativa de vida das pacientes. O
oncologista Rafael Kaliks, do Hospital Albert Einstein, no entanto,
salienta que não há regra geral: “Depende do tipo de câncer”.
O Instituto Nacional do Câncer
aponta que 58 mil mulheres deverão ser diagnosticadas com tumores
malignos na mama este ano. Não há estimativa, no entanto, quanto ao
número de tumores metastáticos. Pelo menos metade das pacientes
atendidas pelo SUS descobre a doença em estágio avançado, quando a
chance de cura é praticamente nula. “O câncer não mata quando
está localizado. Há ainda formas de controlar o câncer
metastático, o que não existe é acesso universal aos tratamentos”,
explica Maira Caleffi, presidente do Femama e chefe do Serviço de
Mastologia do Hospital Moinhos de Vento.
A defasagem na incorporação de
novos medicamentos no SUS atrapalha o tratamento de alguns tipos de
câncer de mama mais agressivo. A terapia para o HER2+, subtipo da
doença, aparece em uma lista da ONU como uma das que todos os países
deveriam oferecer às populações. No Brasil, o Transtuzumabe –
utilizado no tratamento do HER2+ - está disponível apenas para
pacientes em estágio inicial. A Comissão Nacional de Incorporação
de Tecnologias no SUS, que define que medicamentos serão financiados
pelo governo e colocados à disposição na saúde suplementar, negou
a inclusão do medicamento para tratamento da doença em fase
avançada. “No caso do câncer metastático, a incorporação de
drogas alvo é muito difícil”, salienta Maira. Sem acesso pelo
SUS, pacientes têm como única alternativa a Justiça.
A oncologista Daniela Rosa, do
Moinhos de Vento, aponta que muitas vezes as mulheres que procuram o
SUS desconhecem a existência de melhores opções de tratamento. “O
câncer de mama é frequente no mundo inteiro. Quanto mais o tempo
passa, mais se avança no tratamento.” Ela afirma que os médicos
se angustiam por não poderem oferecer o melhor tratamento a
pacientes sem recursos financeiros, apesar de conhecê-los.
O oncologista Max Mano sofre
diariamente dessa inquietude. Pela manhã, ele atende no Instituto do
Câncer do Estado de São Paulo, hospital público. À tarde, é
oncologista no Hospital Sírio Libanês, uma das principais
referências para o tratamento da doença na América Latina. “ao
meio-dia, parece que eu mudei de país. A disparidade é muito grande
e cada vez maior”, relata. Na opinião dele, a defasagem entre o
atendimento no SUS e em hospitais privados chega a 15 anos.
Frequência
na América Latina
Na
América Latina, o câncer de mama é o mais frequente entre as
mulheres, com 150 mil novos casos/ano. Em países como Peru, Colômbia
e México, mais de 50% dos casos são detectados em estágio
avançado, quando há metástases. Apesar de o câncer ser descrito
como uma doença da terceira idade, 16% da mortalidade decorrente da
enfermidade ocorreu em mulheres com menos de 50 anos.
De 1990 a 2010, 17% foi o aumento de
morte por câncer de mama entre brasileiras de 30 a 69.
Doenças
do coração lideram óbitos
A
maioria dos brasileiros (59%) acredita, erroneamente, segundo
pesquisa do Datafolha, que o câncer é a doença que mais mata no
Brasil. Segundo o Ministério da Saúde, as doenças
cardiovasculares, como infarto ou insuficiência cardíaca, registram
o maior número de óbitos anualmente. Nessa lista, o câncer também
fica atrás da pneumonia, diabetes e hipertensão em número de
mortes.
Maioria
vê sentença de morte
Pesquisa
realizada pelo Instituto Datafolha revelou que a maioria da população
brasileira associa o câncer de mama metastático a um sentença de
morte (72%) e a pouco tempo de vida (70%). De cada dez mulheres,
quatro afirmam nunca terem ouvido falar sobre a doença. O tamanho do
desconhecimento dos homens é ainda maior: de cada dez, seis não
sabem o que é câncer de mama metastático. Além disso, a pesquisa
apontou que quase metade da população (49%) acredita,
equivocadamente, que não existe tratamento para a doença.
Um dos dados que mais chocou os
oncologistas é quanto à prevenção. A pesquisa mostrou que 15% das
mulheres entre 40 e 69 anos nunca fizeram uma mamografia,
independentemente se procuram por atendimento médico no serviço
público ou no privado. Esse percentual representa 5 milhões de
brasileiras. No SUS, 19% das mulheres nessa faixa etária nunca
fizeram o exame, ante 5% das que têm convênio. “Se eu pudesse
escolher uma prioridade, diria que temos de diagnosticar o câncer
mais precocemente, para evitar tantos casos da doença metastática”,
aponta Max Mano.
De acordo com os especialistas, a
metástase está intimamente relacionada ao diagnóstico tardio.
Enquanto na Europa de 5% a 10% dos casos são identificados na fase
metastática, no sistema público brasileiro, o número chega a 50%.
O Datafolha realizou a pesquisa em
174 municípios. A amostra teve 2.907 pessoas, representa os 118
milhões de brasileiros com idade superior a 25 anos.
Campanha
alerta sobre o tratamento
A
campanha nacional “Por Mais Tempo” divulga informações sobre a
possibilidade de tratar o câncer de mama metastático e fazer com
que as mulheres vivam mais e melhor. “A maioria acha que ser
diagnosticado significa reta final, que não existe esperança ou
tratamento”, afirma Luciana Holtz, fundadora da Oncoguia,
associação que defende o direito dos pacientes com câncer.
Entre
as frentes da campanha está também a discussão sobre a dicotomia
de tratamento oferecidos no SUS e em planos privados Uma petição
on-line
(www.pormaistempo.com.br),
criada para a campanha, reivindica ao Ministério da Saúde a
incorporação de tratamentos mais adequados para as pacientes com
câncer de mama metastático.
Fonte: Correio do Povo, página 9 de
27 de setembro de 2015.
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