A
polêmica da hora é o projeto do Cais Mauá, com a fórmula de
sempre: falta de transparência, raros espaços de participação,
descaso com o planejamento, parcialidade de gestores públicos,
atropelos da lei, banalização do debate sobre este marco da cidade.
Atuamos para evitar o jogo raso de
tudo ou nada. É impossível, diante de tal complexidade, concordar
ou discordar de todas as propostas. Arquitetos sabem que um projeto é
resultado de escolhas e renúncias. O Norte aponta apenas para um
lado e nossa casa terá espaços voltados ou para o lado frio ou com
muito sol. O projeto é o enfrentamento dessas condições e a
escolha das melhores soluções com o usuário. Sempre haverá
aspectos a aperfeiçoar, a meta é o equilíbrio do conjunto.
Analisando os documentos e o
EIA-Rima, vê-se que o consórcio vencedor tem uma proposta clara:
trocar o restauro dos armazéns (orçado em R$ 43 milhões) por
torres de escritórios e shopping center, alegando que sua exploração
financiará as obras de patrimônio. Este modelo, dizem, é
justificado pela falta de recursos públicos para sua realização.
Em nosso entendimento, o que realmente falta é priorizar o Cais,
pois se há recurso público para construir um ineficiente e
antiquado viaduto de dois andares (R$ 79 milhões), ou financiamento
captado para a Orla (R$ 60 milhões), não se trata disso, mas do
interesse privado sobre área pública.
A profissão de xingamentos que
permeia a discussão, respondemos com argumentos técnicos e
chamamento ao diálogo e bom senso. A participação privada é
necessária em empreendimentos dessa envergadura, mas o projeto de
cidade não pode ser privatizado, com a conivência de
administradores públicos.
Finalmente os usuários os moradores,
têm acesso ao projeto, o qual nos parece insuficiente. A troca
proposta é desequilibrada e o projeto mantém uma visão atrasada de
cidade, do protagonismo ao automóvel, ao comércio e à derrubada
massiva da vegetação.
Nem caranguejos nem tubarões,
queremos a reabilitação do Cais, público e aberto, integrado com o
Centro da cidade, com foco na cultura, restauro do patrimônio,
paisagismo qualificado e atividades diversificadas que atendam nos
vários interesses e grupos sociais. Sem shopping, sem
megaestacionamentos e sem torres. A visibilidade do projeto não se
define em uma planilha financeira e sim na garantia de que a paisagem
mais simbólica de Porto Alegre seja de todos os seus cidadãos.
Arquite e urbanista, presidente do
Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB/RS)
Fonte: Correio do Povo, página 2 da
edição de 3 de outubro de 2015.
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