Quem
poderia imaginar que a Igreja Católica dobrar-se-ia às evidências,
pondo o pragmatismo à frente do dogmatismo?
Os
sinais de que esse processo se instaurou com a chegada do pontifício
de Francisco são variados. São os tempos, como tratou deles o
Eclesiastes. Há o ineditismo de o Papa ser sul-americano e, mais
ainda, argentino, com tudo o que isso significa. O Papa também é
jesuíta, provindo de uma ordem criada pela Contra-Reforma para dar
solidez à Igreja claudicante pela Reforma Protestante.
Dizendo
a que veio, o Papa afrouxou a repelência aos gays, marca
conservadora e dogmática da Igreja, e agora abre os braços aos
divorciados. Venceu o pragmatismo em tempos nos quais o monólito já
se fragmentou e a perda de fiéis preocupa o futuro da Santa
Instituição.
Segundo
o Papa, é preciso abraçar os divorciados, ainda que sem conceder a
forma, sacramental ao segundo matrimônio, mas para garantir a
criação católica aos filhos das segundas núpcias, ou mesmo de
outra união nesses tempos de informalismo.
Aos
que, católicos e casados, não suportarem o aziago do mau casamento
e não virem alternativa senão o divórcio, uma boa notícia:
poderão ser arrebanhados à nação que os desdenhou e agora
reconhece que também pertencem ao povo de Deus, assim também os
filhos que provieram das uniões posteriores, e os filhos destes,
para todo o sempre, que poderão ainda solteiros receber a bênção
clerical para a primeira união. Fraquejando, poderão sobreviver.
Não
se trata de uma capitulação, embora a mudança de discurso seja
drástica considerada a dogmática que lhe antecedeu. É o tempo
atuando nas instituições com sua indelével força modificadora.
Ainda que a palavra de Deus seja única, sua interpretação pode ser
alterada, mesmo que para o contrário da anterior.
Melhor
assim, que a religião se curve às necessidades humanas, pois é de
homens que ela tem de cuidar, não de santos que, por sua santidade,
já pertencem à outra dimensão.
Advogado
de Família
Fonte:
Correio do Povo, editorial da edição de 19 de agosto de 2015,
página 2.
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