segunda-feira, 15 de junho de 2015

Cheiro de stalinismo, por Sérgio da Costa Franco*

Não por acaso, os altos poderes da República investem simultaneamente contra a ação investigatória do Ministério Público, da imprensa e das comissões parlamentares de inquérito. Os instrumentos que se têm revelado mais eficazes na descoberta de falcatruas são agora apontados como viciados em “denuncismo”, uma palavra que vem de aparecer no vocabulário predileto do presidente Lula. Ao tempo em que ele era um ativo oposicionista, gostava muito de um termo que nós aqui no Rio Grande do Sul nem conhecíamos e que também não encontramos nos dicionários “maracutaia”. Foi com Lula contestador e denuncista que aprendemos esse vocábulo, provavelmente um sinônimo de trapaça, trampolinagem, velhacaria. Mas as “maracutaias” desapareceram do linguajar do presidente, aparentemente por serem exclusividade de seus adversários... Sob o consulado de Lula da Silva já florescem as trampolinagens. Waldomiro Diniz foi um acidente de percurso, talvez uma vítima do denuncismo... E é importante que o Poder, cada vez mais centralizado e arbitrário, seja protegido contra as críticas, investigações e denúncias.
Não queremos imaginar a abertura de caminhos para um ditadura castrista ou stalinista em Brasília. Mas as evidências preocupam Ao mesmo temo em que o ministro da Justiça quer esvaziar as cadeias pela redução das penas dos crimes hediondos, inventa-se um projeto de lei para criar um Conselho Federal de Jornalismo, destinado a “orientar, disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de jornalista”. Uma autarquia a mais, com sua estrutura burocrática, cobrando dos combalidos plumitivos uma anuidade para poderem exercer a profissão. Mas isso é o de menos. O grave é que esse conselho, de composição escolhida por sindicalistas da cúpula, teria a missão de editar um código disciplinar, cujas infrações podem ser punidas até com suspensão ou cassação do registro profissional.
Os jornalistas não são inimputáveis nem imunes a sanções. Eles estão sujeitos a dispositivos penais, sendo frequentes as condenações por injúria, difamação ou calúnia. Pesadas indenizações por dano moral têm sid impostas pelo Judiciário a diversos órgãos da mídia. Mas agora o que se pretende é algo que ultrapassa de muito os rigores da Lei de Imprensa: ameaça-se o profissional com a privação do trabalho, pena imposta por alguns valetes da burocracia sindical, com o apoio num código disciplinar que não emanaria do Poder Legislativo. É a subversão da ordem democrática.
A Constituição diz que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Porém, o governo Lula quer submeter o jornalismo a um código disciplinar que nem os governo militares dos “anos de chumbo” foram de instituir.
E o pior é que o tal Conselho Federal de Jornalismo nasce embalado pelo sindicalismo oficialista, que aplaudiu a lamentável ideia em um congresso nacional realizado em João Pessoa (PB). Aliás, não se poderia esperar outra coisa desse sindicalismo caudatário dos governos e alimentado pelas verbas do imposto sindical, velha herança do fascismo estado-novista.
O certo é que se sente no ar um forte cheiro de stalinismo: governo centralista e autoritário, partido e sindicato unidos na tarefa de destruir a democracia.


*Historiador


Fonte: Zero Hora, página 15 de 15 de agosto de 2015.

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